A mesma decisão que impediu que membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocupassem parques e praças de Curitiba durante o depoimento do ex-presidente Lula (PT), em maio, pode pôr um fim ao “acampamento da Lava Jato” em frente à Justiça Federal. A prefeitura de Curitiba utiliza o mesmo processo para pedir a remoção imediata da estrutura montada pelo movimento Curitiba Contra a Corrupção na Praça Pedro Alexandre Broto, no bairro Ahú. A ação teve início em maio e, depois de alguns meses em tramitação, a administração municipal volta a pedir a retirada.

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Na última terça-feira (1°), dia em que o movimento organizou uma festa de aniversário para Moro com direito a balões, coxinhas e bolos, oficiais de Justiça interpelaram duas representantes do acampamento para colher dados e atualizar a permanência do impasse.

A decisão foi motivada por um despacho da juíza Patrícia de Almeida Gomes Bergonse, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba. No dia 14 de junho, ela emitiu um mandado de verificação para que oficiais colhessem informações sobre a ocupação. “A fim de verificar a situação atualizada, determino que a Sra. Oficial de Justiça se dirija ao local apontado na inicial, para verificar se há acampamento no local e quem são as pessoas que o estão organizando”, diz o despacho.

Ela se baseia na limitar de maio contra o MST e movimentos sociais determinada pela juíza Diele Denardin Zydek que, além do bloqueio na região durante o dia do depoimento, definia como proibida “a montagem de estruturas e acampamentos nas ruas e praças da cidade, sob pena de multa diária de R$ 50 mil”. A decisão chegou a ser contestada pela Defensoria Pública, mas foi mantida pelo Tribunal de Justiça.

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Essa decisão chegou a ser cumprida. Dois dias antes do depoimento de Lula, os organizadores do Curitiba Contra Corrupção desmontaram o acampamento que mantêm desde 2015, mas retornaram com a ocupação dois dias após a vigência do interdito proibitório.

No mesmo mês, a Procuradoria-Geral do Município (PGM) informou a Justiça da decisão do movimento. “Quando do fim da audiência, a uma porque o MST teve lugar próprio para acampamento (atrás da Rodoferroviária) e, a duas, porque o MBL desmontou o seu acampamento que mantinha em frente à Justiça Federal. Ocorre que neste final de semana [ainda em maio], o acampamento em frente à Justiça Federal retornou, razão pela qual o pedido de item 3.a.3 [da desocupação] não teve perda de objeto, devendo a ação prosseguir apenas em relação a este pedido”, justifica o parecer encaminhado à Fazenda Pública.

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O último ato do processo é do dia 20 de julho, quando, diante da renúncia do prazo estabelecido pela Justiça, a prefeitura optou por aguardar um parecer.

De acordo com Narli Rezende, uma das organizadoras do acampamento, a visita dos oficiais de Justiça foi protocolar e ordeira. “Eles vieram, conversaram conosco. Nós acionamos o nosso advogado e estamos esperando calmamente o que fazer. Como somos legalistas, cumprimos o que a Justiça determina”, afirma.

Impasse

Segundo fontes ouvidas pela reportagem, a decisão da prefeitura é motivada por um impasse com os organizadores do acampamento. O Executivo Municipal teria solicitado a remoção da estrutura física no começo da gestão de Rafael Greca (PMN) e reforçou o pedido após o depoimento de Lula (PT).

Em fevereiro, uma equipe da Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) removeu parte do acampamento. Na ocasião, houve um impasse e objetos recolhidos foram devolvidos.

Para Narli, as versões são contraditórias. “Já entramos em contato com a prefeitura, com a Secretaria de Urbanismo, para tentar reabrir um canal de diálogo. Queremos que a prefeitura nos diga o que fazer para que possamos cumprir o que for estabelecido”, aponta. “O que a gente não entende é que, com o prefeito Gustavo Fruet (PDT), nunca tivemos problemas. Com o Greca, do nada, começaram esses questionamentos”.

O grupo de apoio à investigação Lava Jato se instalou na Praça Pedro Alexandre Brotto em junho de 2014, quando Narli Rezende e amigas colocaram uma faixa verde-amarela em um poste. Já a estrutura física que acolhe o grupo e interessados existe há menos tempo, desde 2015. No local, há placas e faixas com referência à operação, Sergio Moro e Justiça.

De acordo com o grupo, a vizinhança abraçou o movimento, que tornou a praça “mais cuidada e menos perigosa”. “Recebemos apoio não apenas de Curitiba, mas de todo o país. Já gravaram vídeos conosco sobre essa resistência. É um movimento espontâneo. É um ponto turístico da cidade”, conta.

Narli Rezende também refuta o termo acampamento. “Era um nome simbólico que marcou o movimento quando o MST ameaçou invadir a praça para tumultuar a Justiça Federal. Conforme o tempo foi passando, nos estruturamos mais. Mas ninguém mora ali, não pernoita. Recebemos visitantes, explicamos os objetivos e consolidamos nosso apoio à Justiça Federal”.

Hoje em dia, segundo a organizadora, o local é alvo frequente de depredações. As ameaças teriam aumentado depois do depoimento do ex-presidente Lula. “Destruíram banners, roubaram as bandeiras do Brasil há uma semana. Arrancaram coisas nossas. Agora não deixamos mais nada exposto à noite”, conta.

Novo depoimento do Lula

O ex-presidente Lula vai voltar a Curitiba no dia 13 de setembro, o que deve motivar perímetro de segurança similar. No primeiro depoimento, diversas quadras no entorno da Justiça Federal foram bloqueadas para impedir tumultos e protestos favoráveis ou contrários ao petista. Atiradores de elite, três mil policiais (militares, rodoviários e federais) e agentes de trânsito de Curitiba e São José dos Pinhais participaram do esquema.

O juiz Sergio Moro marcou no final de julho o depoimento para o próximo mês. Será o segundo do ex-presidente na 13ª Vara Federal de Curitiba na condição de investigado. Lula falará em ação movida pela força-tarefa da Lava Jato no Paraná na qual é acusado de ter recebido vantagens indevidas da construtora OAS na forma de um prédio para abrigar o Instituto Lula, no valor de R$ 12 milhões, e uma cobertura vizinha ao apartamento onde mora em São Bernardo do Campo, no grande ABC.

Depois do primeiro depoimento, o petista foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão pelo tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo. A defesa de Lula já entrou com recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região.