1. Vigência. Entrando em vigor a Lei n.º 11.232, de 22 de dezembro de 2005 (publicada no DOU de 23/12/2005), o que ocorrerá, considerando a regra do art. 8.º, § 1.º, da Lei Complementar n.º 95/1998, no dia 24 de junho de 2006 (um sábado!), todos nós, especialmente juízes, teremos a tarefa de aplicá-la imediatamente, seja boa ou má, criticável ou não.

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Por isso é urgente a reflexão pragmática sobre os novos dispositivos, visando a auxiliar a sua aplicação, com os olhos voltados à consecução de um processo civil mais rápido e efetivo. Esse é o propósito deste pequeno ensaio.

2. O fim da autonomia processual da execução de sentença. As sentenças civis que impõem ao réu uma prestação – um fazer, um não fazer, entregar coisa diversa de dinheiro ou pagar quantia certa – podem ser classificadas, todas, no gênero sentenças civis condenatórias.

A isso parece conduzir, primeiramente, o novo artigo 475-N, I, CPC, qualificando como título executivo judicial a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia.

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Em segundo lugar, o fim do processo autônomo de execução para as sentenças civis condenatórias que impõe o pagamento de quantia certa eliminou a fundamental diferença em relação às sentenças que ordenam um fazer, um não fazer ou entrega de coisa.

Mas o que as une realmente é a sua característica comum de impor a sanção jurídica de direito material ao réu, em forma de uma prestação que lhe corresponda. E é precisamente nisso que reside a sua diferença em relação às sentenças declaratórias e constitutivas puras, as quais dispensam qualquer prestação do réu para satisfazerem a pretensão do autor (são satisfativas por si só).

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Caso a sentença civil condenatória imponha ao réu uma prestação consistente em fazer, não fazer ou entregar coisa diversa de dinheiro, o seu cumprimento se obtém através dos mecanismos previstos nos arts. 461 e 461-A do CPC (multa coercitiva e medidas executivas), conforme sistema já em vigor.

Tratando-se de sentença civil condenatória impondo ao réu uma prestação consistente em pagar dinheiro, o seu cumprimento se força mediante execução, nos termos do art. 475-I e seguintes do CPC.

Em qualquer dos casos, o cumprimento da sentença se constitui como desdobramento final da relação processual de conhecimento (apesar de não se tratar, ontologicamente, de atividade cognitiva), mesmo quando há a imposição de pagar quantia certa. Não há, em regra, processo de execução autônomo. Essa nova concepção processual é a tônica da reforma empreendida pela nova lei, como consta, aliás, da respectiva exposição de motivos (item 5, b): ?a ?efetivação? forçada da sentença condenatória será feita como etapa final do processo de conhecimento, após um tempus iudicati, sem necessidade de um ?processo autônomo? de execução (afastam-se princípios teóricos em homenagem à eficiência e à brevidade); processo ?sincrético? no dizer de autorizado processualista?. E como conseqüências, a sentença de mérito não mais extingue o processo de conhecimento, mas apenas resolve o mérito (art. 269, caput, CPC, alterado) e o juiz, ao publicar a sentença de mérito, não mais acaba o ofício jurisdicional (art. 463, caput, com a nova redação).

3. Competência. A competência para o cumprimento da sentença passou a ser regida pelo art. 475-P, CPC, não mais pelo art. 575, CPC (apesar de não expressamente revogado pela Lei n.º 11.232/2005). O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante (1) os tribunais, nas causas de sua competência originária; (2) o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira homologada pelo STJ; (3) o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição, com a diferença que o credor, agora, poderá optar pelo juízo do local onde se encontrem bens sujeitos à expropriação ou pelo do atual domicílio do executado, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem (art. 475-P, parágrafo único, CPC).

Essa última hipótese inovadora deve observar alguns detalhes. Primeiro, trata-se de uma opção do credor; com isso, não pode ser recusado pelo executado, nem mesmo pelo juiz da causa ou pelo novo juízo da execução (do local dos bens ou do domicílio do executado). Segundo, não podem ser alterados os critérios de competência absoluta: se o juízo da causa é federal, o juízo do local ou do domicílio do executado será o federal, não sendo hipótese de delegação de competência federal à justiça estadual. Terceiro, a execução será requerida no novo juízo da execução eleito pelo exeqüente, o qual fará a solicitação de remessa dos autos, via ofício, ao juízo de origem, com baixa na distribuição.

4. Execução definitiva. Início do prazo para pagar. Liquidação. Quando se trate de sentença que condene o réu ao pagamento de quantia certa, e havendo o trânsito em julgado, estar-se-á diante de uma sentença condenatória sujeita à execução definitiva; será provisória, quando a sentença ainda estiver sendo impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo (art. 475-I, § 1.º, CPC).

Mas na execução definitiva, é preciso perquirir se se está diante de uma sentença líquida ou ilíquida, ou seja, se determina, ou não, o valor devido (art. 475-A, CPC).

Caso seja líquida, da simples ciência do trânsito em julgado, inclusive pelo próprio advogado do devedor (art. 475-J, § 1.º, CPC), comprovada por qualquer meio, passará a correr o prazo de quinze dias para que o devedor cumpra ?espontaneamente? o julgado, sem sofrer a incidência da multa prevista no art. 475-J, caput, CPC, nem a conseqüente execução forçada.

Nesse caso singular, estando os autos no tribunal, não é necessário aguardar a baixa para a primeira instância. O devedor, até mesmo extrajudicialmente, deverá realizar o pagamento ao credor, dentro do prazo de quinze dias, se quiser se livrar da multa de dez por cento (art. 475-J, CPC). Feito o pagamento no prazo, a comprovação do ato, nos autos, poderá ser feita posteriormente, visando à extinção do processo.

Note-se que o objetivo central da nova sistemática é obter o pagamento sem execução forçada, utilizando-se, para isso, a coação psicológica gerada pela multa prevista no art. 475-J, CPC.

Sendo ilíquida a sentença, deve-se perguntar qual modalidade de liquidação será necessária. Se por arbitramento ou por artigos, a execução não pode desde logo se iniciar. Antes, a parte deve requerer a liquidação de sentença, nos termos do art. 475-A, CPC.

Interessante inovação é a regra do art. 475-A, § 2.º, CPC, permitindo que a liquidação seja requerida na pendência de recurso, tenha efeito suspensivo ou não, processando-se em autos apartados, no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com as cópias das peças processuais pertinentes, as quais, em princípio, são as arroladas no art. 475-O, § 3.º, CPC, no que couber. Assim, é possível adiantar a liquidação para preparar a execução, mesmo a provisória.

5. Liquidação por arbitramento e por artigos. A liquidação por arbitramento ou por artigos se constitui, também, num desdobramento da relação processual de conhecimento, como uma fase intermediária entre a sentença condenatória e o início de sua execução. Não há nova relação processual, nem nova petição inicial. Essa nova concepção também consta da exposição de motivos da Lei n.º 11.232/2005 (item 5, b): ?a liquidação de sentença é posta em seu devido lugar, como Título do Livro I, e se caracteriza como ?procedimento? incidental, deixando de ser uma ?ação? incidental?.

Em ambos os casos, requerida a liquidação, a outra parte é simplesmente intimada, na pessoa de seu advogado (art. 475-A, § 1.º, CPC), para simples ciência, sem a necessidade de citação.

A liquidação se faz por arbitramento quando assim for determinado pela sentença ou por convenção das partes ou, ainda, quando o exigir a natureza do objeto da liquidação (art. 475-C, CPC). Requerida, o juiz nomeia o perito para elaborar o laudo e fixa o prazo para a sua entrega. Apresentado o laudo, as partes são intimadas para se manifestarem no prazo de dez dias. Se necessário, poderá haver audiência de instrução e julgamento.

Procede-se ao requerimento de liquidação por artigos, quando, para determinar o valor da condenação, houver necessidade de alegar e provar fato novo (art. 475-E, CPC). Em função da sua especificidade, esse tipo de liquidação se desenvolve como se fosse um novo processo de conhecimento, adotando o rito comum, ordinário ou sumário (art. 475-F, CPC).

Nas duas hipóteses especiais de liquidação, o recurso cabível contra a respectiva decisão será o agravo, interposto por instrumento, como excepciona o art. 475-H, CPC. Como o agravo não ostenta efeito suspensivo automático (art. 497, CPC), intimado o devedor sobre a decisão de liquidação, começa a correr o prazo de quinze dias para que o devedor cumpra o julgado, sem sofrer a incidência da multa prevista no art. 475-J, caput, CPC, nem a conseqüente execução forçada. Caso haja a interposição de recurso especial e/ou extraordinário contra o acórdão que julga o agravo, não é possível submetê-lo ao regime de retenção do art. 542, § 3.º, CPC, pois, em princípio, não haverá decisão final no caso.

Transitada em julgado a decisão de liquidação, que complementa a sentença de mérito, fixando o quantum debeatur, há coisa julgada material, pelo que não pode ser atacada na impugnação ou mesmo através da ação anulatória do art. 486, CPC. A única forma de modificar posteriormente essa decisão, com trânsito em julgado, será a ação rescisória (art. 485, CPC). (continua) Vicente de Paula Ataide Junior é juiz federal substituto da 5.ª Vara Federal da SJ/PR.