O Direito penal tributário tem por finalidade assegurar que os cidadãos cumpram com suas obrigações tributárias, ou seja, objetiva evitar que o Estado seja lesado por meio da sonegação fiscal. Assim, levando-se em consideração este objetivo primordial, o legislador brasileiro tem tornado cada vez mais ampla a extinção da punibilidade dos contribuintes quando há o pagamento integral dos tributos devidos.

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O Artigo 34 da Lei 9249/95 estabelecia que seria extinta a punibilidade pela prática dos crimes tributários quando o agente pagasse o tributo, inclusive os acessórios (multas, juros, etc.), antes do recebimento da denúncia.

Em 2003 sobreveio a Lei 10684, que estabeleceu em seu artigo 9.º que ficará suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes tributários, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. O § 2.º do mencionado artigo, prevê, ainda, que será extinta a punibilidade quando for efetuado o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.

Considerando que a Lei 10684/03 não estabeleceu limite temporal para que o agente parcele ou efetue o pagamento do débito, os tribunais superiores vêm entendendo que o pagamentoopode se dar a qualquer tempo, desde que antes do trânsito em julgado da decisão condenatória.

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Não obstante o artigo 9.º se refira apenas às pessoas jurídicas, é entendimento pacífico que este dispositivo também se aplica às pessoas físicas, vez que expressamente mencionadas no dispositivo que disciplina as regras do parcelamento (artigo 1.º, § 3.º, inciso III, Lei 10684/03).

Portanto, hoje, o pagamento do débito tributário realizado a qualquer tempo, desde que antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, possui força para extinguir a punibilidade do agente (entendimento doe STJ). Já o simples pedido de parcelamento acarreta a suspensão do processo e do prazo prescricional até o pagamento integral, momento este em que se poderá postular a extinção da punibilidade.

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Considerando que a Lei 10684/03 é mais favorável ao acusado, a mesma possui força retroativa, ou seja, pode ser aplicada inclusive aos crimes tributários praticados anteriormente à sua vigência.

Outra questão que merece destaque é a necessidade da constituição definitiva do crédito tributário para a instauração de inquérito policial e, por conseqüência, para a propositura de ação penal.

Em um primeiro momento, assim que provocado a se manifestar sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça sufragou entendimento segundo o qual não haveria necessidade da conclusão do procedimento administrativo-fiscal para o início da persecução criminal.

Este entendimento fundava-se na independência da instância penal e administrativa, haja vista a possibilidade de um mesmo fato jurídico poder produzir efeitos e conseqüências em diversos ramos do direito, sem que se possa falar em bis in idem (dois julgamentos sobre o mesmo fato).

Fulcrava-se, também, no entendimento de que a persecução dos crimes tributários se dá por meio da ação penal pública incondicionada, cuja titularidade privativa é do Ministério Público (artigo 129, I, CF). Assim, não se poderia vincular a propositura da ação penal à decisão definitiva sobre o crédito tributário, sob pena de se transgredir a norma constitucional que concede ao Ministério Público a titularidade da ação penal pública incondicionada.

Entretanto, quando da análise da matéria pelo Supremo Tribunal Federal, esse entendimento restou suplantado, tendo-se fixado que a ausência de constituição definitiva do crédito tributário obsta a persecução penal, por constituir condição objetiva de punibilidade dos crimes tipificados no artigo 1.º da Lei 8137/90.

O primeiro julgado do Supremo Tribunal Federal que sustentou esta tese foi o habeas corpus n.º 81611-DF, da relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence. Nesse julgamento, os Ministros, por maioria dos votos, decidiram que falta justa causa para a ação penal quando o processo administrativo-fiscal estiver pendente de decisão definitiva.

Esse entendimento corrobora a política que vem sendo adotada pelo legislativo no que se refere aos crimes tributários. Seria um contra-senso a lei possibilitar a extinção da punibilidade pelo pagamento e não se conceder ao contribuinte o direito de, antes de se ver processado criminalmente, discutir a exatidão do lançamento tributário.

Questão efervescente e bastante discutida na doutrina e jurisprudência é a possibilidade de exclusão da culpabilidade do acusado com base na tese de inexigibilidade de conduta diversa, nos casos em que o não recolhimento dos tributos era a única saída para a sobrevivência da empresa ou para propiciar o pagamento de salários aos funcionários.

Para melhor aclarar o instituto, é importante destacar que a culpabilidade é um dos fundamentos da pena. Em outras palavras, o réu somente será penalizado se agir com culpabilidade, a qual consiste em um juízo de reprovação que recai sobre aquele que poderia agir conforme o direito, mas não o fez. Assim, atuará com culpabilidade o agente que, mesmo podendo agir da forma correta, pratica o ato criminoso, transgredindo a norma penal.

Feita essa conceituação, fica fácil definir a causa de exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, que nada mais é do que uma causa que exclui um dos fundamentos da pena, tendo em vista que não se podia exigir do réu, na situação em que se encontrava, atuação de acordo com o direito.

A alegação da tese de inexigibilidade de outra conduta tem sido recorrente nos processos por crimes de sonegação fiscal que envolvem empresários que se encontram em situação de quase ou total insolvência.

Entretanto, reiteradamente tem-se entendido que apenas se reconhece a inexigibilidade de conduta diversa caso exista prova documental robusta a respeito da excepcionalidade da situação deficitária da empresa, bem como prova da repercussão negativa no patrimônio pessoal dos sócios administradores.

A comprovação da excepcionalidade da crise se faz importante haja vista que o princípio da função social da empresa, não se coaduna com acobertamento e manutenção de sociedade empresária que reiteradamente descumpre suas obrigações fiscais.
Já a prova da repercussão negativa no patrimônio do sócio é relevante para que se demonstre a boa-fé do empresário, no sentido de ter feito o possível para evitar a sonegação fiscal, inclusive, sofrendo privações no tocante aos seus bens pessoais.

Assim, havendo a comprovação cabal desses requisitos, a tese de inexigibilidade de conduta diversa deve ser acolhida, pois restará demonstrado que o empresário foi compelido à prática da sonegação fiscal por uma causa externa, consubstanciada em sérios e excepcionais problemas financeiros de sua empresa, inclusive com reflexos em seus bens particulares.

Everton Jonir Fagundes Menengola é advogado, especialista em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR)/Instituto de Criminologia e Política Criminal (ICPC).