O presidente Lula está com mania de exportação. Quer negociar com todos e de tudo. Na China distante e na Argentina vizinha. Na Rússia, em Cuba, no Iraque e arredores. Na Europa toda, África e na Índia. Onde der. Além de produtos, quer também exportar idéias. Algumas sem muito valor agregado. Agora está com uma novinha em folha na cachola: uma CPMF mundial. Vai estreá-la com honras e pompas dia 30, no próximo encontro já marcado com o presidente francês, Jacques Chirac, e com o secretário-geral da ONU, Koffi Annan, em Genebra.
Esta CPMF internacional, ou mundial, tanto faz – como aqui a nossa nacional, que nasceu com o endereço certo de, provisoriamente, salvar a saúde pública -, teria uma finalidade específica: acabar com a fome no planeta. O Fome Zero também mundial. Lula está obcecado por essa idéia de tributar movimentações financeiras internacionais e oferece a melhor já surgida em seu governo recheado de promessas. Tirar um pouco de todos, sem pedir licença nem por favor, para dar a quem tem pouco ou nada tem. Robin Hood fazia assim nos bosques do bairro onde morava e passou para a grande e imortal história.
É – como diria um Bush reticente em campanha – uma idéia. E, como todas as idéias, deve ser estudada. Principalmente pelo fim que nela se encerra, desde que não aconteça o que aqui aconteceu: o desvio de finalidade. Em vez da fome, esse “imposto do cheque” internacional poderia passar a financiar aviões de combate, armas de destruição em massa, bombas e morteiros. Ou simples viagens de turismo à guisa de controlar os numerários. Nada disso, havendo vontade política dirigida para o bem. Lula poderia contra-argumentar a seu colega francês (e aos demais ao redor do planeta), que uma CPMF assim daria a todos os governos um instrumento poderoso de controle sobre a conta de todas (eis a chave principal) as fontes financiadoras do terror. Incluindo traficantes. De drogas, órgãos humanos e de gente escravizada na prostituição. E de quebra, um xeque-mate na corrupção!
Se de todo dinheiro circulante fosse arrancado, por exemplo, o pífio percentual de 0,01% – é o quanto bastaria! – teríamos o mapa global (esse o termo, afinal, estamos na era da globalização dos mercados) dos que investem em paraísos fiscais. Daqui e acolá… besteira gastar latim à toa: Lula saberá, como ninguém, achar os argumentos mais convincentes para entronizar sua mais nova idéia. Genial, aliás. Chirac ficará encantado.
E Lula, agradecido. E severamente consternado. Já imaginaram ser o autor da façanha jamais conseguida por ninguém desde que a civilização existe – a solução definitiva e constante (embora a CPMF seja sempre provisória, este o segredo!) para os males da pobreza, esse muro da vergonha que divide seres iguais em animais de categorias diversas? Avançando mais nos desdobramentos da idéia, já que a maioria das guerras geralmente têm como pano de fundo questões ligadas ao verbo possuir, todos possuindo, acabaríamos também com, se não todas, pelo menos algumas das guerras que infernizam os povos da Terra. Um trunfo de paz. Lula, e sua CPMF mundial ficariam para a eternidade!
Não custa tentar, na verdade – eis o segredo desse enorme ovo de Colombo. Muito melhor do que aquele proposto a Bush, para deixar as fronteiras livres lá e cá (afinal, os controles alhures impostos decorrem do medo espalhado pelo terrorismo, que deixará de existir). Mesmo e a despeito do que pensam pessoas como Marco Aurélio Garcia, assessor de Relações Internacionais da própria Presidência da República. A tarefa não é tão fácil quanto possa parecer, embora simples. Afinal, “se aqui no Brasil a idéia deu o rolo que deu para ser aceita, imagine, então, no cenário internacional”. Mas não queriam um fundo internacional de combate à pobreza? Olhe, o argumento definitivo: ninguém, como ocorre contra o FMI, haverá de gritar, ou pichar: “Fora FICP!”.