Paralelamente ao esquema da compra superfaturada de ambulâncias e equipamentos hospitalares, a CPI dos Sanguessugas descobriu outro esquema de parlamentares atuando em causa própria. Dessa vez, a comissão constatou que deputados apresentavam emendas individuais, beneficiando entidades próprias ou de parentes. O processo repete em parte o que ocorreu na CPI dos Anões, concluída há 12 anos, quando havia repasses de subvenções sociais para entidades ligadas aos próprios parlamentares. Apesar de questionável, o esquema não é considerado fraudulento dentro do Congresso.

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A CPI descobriu que as emendas da área da saúde da deputada Sandra Rosado (PSB) e dos ex-deputados Laire Rosado (PSB) e Múcio Sá (PMDB), todos do Rio Grande do Norte, exemplificam como ocorre o autofavorecimento com dinheiro público. Os dados, de 2001 a 2005, estão no disquete divulgado pelo Ministério da Saúde.

Sandra Rosado assumiu o mandato em 2003, no lugar do marido, Laire. Ele e Múcio são hoje secretários da governadora Wilma de Farias (PSB).

No seu primeiro orçamento, de 2004, a deputada apresentou uma emenda no valor de R$ 1,8 milhão para organizações não-governamentais, sem definir os nomes. No ministério, Sandra Rosado optou por repassar o dinheiro para entidade da sua família, a Fundação Vingt Rosado, favorecida com R$ 680 mil para aquisição de equipamentos e materiais permanentes e com R$ 360 mil para manutenção da unidade de saúde.

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No orçamento deste ano, a deputada foi igualmente generosa com a entidade da família, na emenda, já liberada, de R$ 2 milhões. A Fundação Vingt Rosado recebeu R$1,27 milhão, cabendo o restante a outras cinco entidades.

Para o ano que vem, Sandra Rosado tampouco definiu, quando da votação da proposta, o destino dos R$ 2,96 milhões de suas emendas. Limitou a selecionar a modalidade "ONGs", sem novamente especificar os nomes.

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Sandra Rosado não retornou a ligação do jornal O Estado de S. Paulo. Segundo seu advogado, Armando Holanda, ela afirmou que não apresentou emendas na área da saúde. De acordo com ele, um jornal local que publicou a informação no sentido contrário teve de se retratar.

Os ex-deputados agiam cruzando emendas em favor de três entidades: Fundação Vingt Rosado, ligada a Laire Rosado; Fundação Aproniano Sá, da família de Múcio Sá, e a Associação de Proteção à Criança e à Infância de Mossoró (Apamim).

Com as emendas de Sandra, as três ONGs movimentaram mais de R$ 11 milhões, de 1998 a 2005. No orçamento de 2002, por exemplo, Laire mandou R$ 1 milhão para fundação de Múcio e este "devolveu" o mesmo valor para a fundação do colega.

Múcio é secretário extraordinário para Assuntos Institucionais do governo do Rio Grande do Norte. Os três estão indiciados no inquérito da máfia dos sanguessugas. De acordo com o empresário Luiz Antônio Vedoin – dono da Planam, a principal empresa do esquema de compra superfaturada de ambulâncias com orçamento da União, a partir de emendas parlamentares -, eles teriam participado de licitações dirigidas e do esquema de recebimento de propina.

Eles negam a denúncia. Múcio disse que, "no momento certo", apresentará documentos que comprovariam sua inocência. Armando Holanda, também advogado de Laire, disse que só se manifestará após conhecer o teor da acusação.

As emendas individuais hoje dão direito a cada parlamentar de escolher onde gastar R$ 5 milhões do Orçamento da União por ano. Até 1993, quando o Congresso cassou seis deputados pelo escândalo dos anões, essas emendas não tinham limite. Hoje, o valor é definido a cada ano pelo relator-geral do orçamento. No início do governo Lula, a cota anual era de R$ 2 milhões, mas nos últimos três anos foi reajustada para cima.