A CPI do Mensalão acaba como começou e existiu: melancólica e envolvida numa disputa sem importância. A oposição acusou o governo de não ter se programado para prorrogar o prazo de funcionamento da CPI que terminou nesta quarta-feira. O governo, patrocinador da CPI, acusou a oposição de ter sabotado a prorrogação. "Não dá para encerrar a CPI. Ela não concluiu nada", apelava o presidente da comissão, senador Amir Lando (PMDB-RO), ao relator Ibrahim Abi-Ackel, ainda de manhã. Mas Lando ficou praticamente sozinho na ofensiva política para buscar as 171 assinaturas de deputados, exigidas para manter aberto o inquérito por pelo menos mais quatro meses.
Criada com o apoio do Palácio do Planalto e uma maioria governista para investigar a compra de votos para a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso, servindo de contraponto à CPI dos Correios que investigava corrupção no governo petista, a CPI do Mensalão mal saiu do lugar. Nem sequer a relação de todos os funcionários dos gabinetes dos deputados, considerada imprescindível para se investigar as denúncias de pagamento de mesada a deputados da base aliada, o relator obteve nos 120 dias de funcionamento da comissão.
Abi-Ackel já estreou mal na relatoria, questionado pelo presidente e sob ataque da oposição, por conta de um depósito da SMP&B de Marcos Valério de Souza em favor de seu filho Paulo. Ele alegou que se tratava de uma contribuição de campanha feita pelo candidato majoritário Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e manteve-se no cargo. Mas como ele próprio definiu, fez um trabalho "modesto, que não traz novidades", nem faz novas denúncias a deputados e tampouco tipifica crimes, "porque isto cabe ao Ministério Público".
Nos bastidores da CPI, a conclusão foi uma só. Assessores, técnicos e parlamentares estavam convencidos de que ninguém queria dar seqüência às investigações, porque praticamente todos os partidos estavam envolvidos e ainda havia o temor de que novos nomes aparecessem. "A CPI foi partidarizada. Cada legenda manteve uma certa fidelidade partidária para afastar qualquer possibilidade suicida na CPI, onde o princípio da não incriminação esteve presente o tempo todo", lamentou Amir Lando.
"Está todo mundo com medo, apavorado. Ninguém quer que a CPI continue", resumiu a deputada Zulaiê Cobra Ribeiro (PSDB-SP) espantada com a dificuldade de encontrar apoio até para prorrogar a CPI por apenas 30 dias. "Só queríamos prazo para terminar a CPI com decência e dignidade, mas ninguém quer assinar o requerimento de prorrogação", completou a tucana, decepcionada com o PT. "Eles falaram que por 30 dias o governo aceitaria, mas sumiram".
Àquela altura, o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), já havia se reunido com os líderes da base aliada para tratar de Mensalão. "A orientação do governo foi para não assinar o requerimento", resumiu o líder do PL, Sandro Mabel (GO). Inconformado com o fim dos trabalhos sem que a CPI apresentasse resultados, Lando fez de tudo para prorrogá-la.
Além de muita conversa e muita súplica, o senador apelou até para "o terrorismo", como ele próprio confessou depois da conversa com o líder de seu partido na Câmara, Wilson Santiago (PB). "Vim aqui para ajudar, mas nem o PMDB quer assinar", disse Lando a Santiago. "Ou assinamos, ou ficamos todos sob suspeita", completou, insistindo na tese de que a sociedade interpretaria a recusa como medo da investigação incriminar peemedebistas.
O líder argumentou que o próprio relator dera o mote para a recusa dos deputados. "O problema foi que Abi-Ackel falou para todo mundo que já estava com o relatório pronto para ser votado, e eles estão alegando isto para não assinar", justificou Santiago. De fato, Abi-Ackel passou o dia inteiro com seu relatório debaixo do braço, insistindo que seu trabalho estava pronto e era conclusivo.
"Só pode haver prorrogação se houver novos objetos de investigação. Não posso aceitar que a CPI continue para eu apresentar café requentado", disse Ackel a Amir Lando, referindo-se ao relatório que ele manteve secreto durante todo o dia. Mas ele mesmo confirmou que não implicaria mais nenhum deputado em suas conclusões. "Não vamos tratar de cassação porque já esgotamos isto", afirmou, lembrando o relatório parcial conjunto com a CPI dos Correios, que incriminou 19 deputados. Nem o termo "mensalão" é usado no relatório. "Mas é claro que eu reconheço que houve repasses indevidos, decorrentes de recursos ilícitos, e que foram feitos periodicamente e em parcelas sucessivas. Mas não foram mensais".
