Motoristas de Curitiba estão fraudando o aplicativo de transporte individual 99. O esquema se aproveita do fato de a plataforma atribuir um pedido de corrida ao motorista mais próximo do cliente para direcionar as chamadas. Os fraudadores agem, normalmente, em dupla e criam perfis de usuários falsos para solicitar o serviço, lucrando em cima dos descontos, créditos promocionais para clientes e com o uso de cartões de crédito clonados, além dos bônus de desempenho para motoristas.
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Com este golpe, faturam pelo menos quatro vezes mais do que um motorista regular. A fraude teria chegado ao Paraná junto com a modalidade “POP” do 99 (similar ao Uber, com carros convencionais), em setembro do ano passado, importada de outros estados onde ela já funcionava.
A fraude começa com os motoristas envolvidos criando perfis de usuários falsos a fim de solicitar o serviço para eles mesmos. Normalmente eles agem em dupla: enquanto um dirige, o outro faz os pedidos. “Como o sistema da 99 é por proximidade, o aplicativo sempre destina a corrida para o carro que estiver mais perto do cliente”, aponta uma fonte que pediu para permanecer anônima. Por esse motivo, é possível direcionar todas as corridas para um determinado motorista.
Motoristas mais próximo
A reportagem fez o teste e confirmou que é possível direcionar os pedidos. Em todos os casos, conseguimos escolher o motorista que estava em nossa frente. Os golpistas descartam a Uber porque o sistema da plataforma leva em conta o tempo que o motorista está com o aplicativo em funcionamento, esperando uma corrida, e em seguida faz uma média da proximidade com o cliente, dificultando o direcionamento das chamadas.
Para não serem identificados, as contas falsas de usuários são vinculadas à plataforma de pagamentos virtual Paypal — aceita nos apps como forma de pagamento —, que por sua vez são atreladas a cartões de crédito de terceiros, pré-pagos ou clonados.
Os do segundo tipo (cartões clonados) são obtidos com a ajuda de hackers, que usam programas de computadores vendidos abertamente em perfis falsos no Facebook e em grupos do WhatsApp. “Eles não precisam mais do cartão físico para cloná-lo, basta usar programas que geram milhares de combinações de números por minuto para achar uma que seja válida”, destaca Felipe Held, porta-voz da Konduto, empresa de segurança digital. Dessa forma, os golpistas contam com cartões que já vêm com saldo. Até o dono se dar conta, o cartão já foi usado para compras em sites e no pagamento de viagens pelo aplicativo da 99.
Em posse de diversas contas de clientes vinculadas cada uma a um chip de celular, os golpistas fazem as corridas.
Promoções
Para maximizar o retorno, os golpistas se aproveitam das promoções realizadas pela empresa para atrair novos usuários, como a que concede R$ 15 em crédito na primeira corrida e descontos que variam de 30% a 50% do valor da viagem. “Se for a promoção dos primeiros R$ 15 grátis, por exemplo, quando a corrida chega perto do limite, ele a encerra. Assim, o usuário falso não é cobrado, mas o motorista recebe”, revela uma fonte a par do esquema. “Imagine isso multiplicado por 10, porque eles andam com diversos chips no bolso e vão trocando de usuário”, completa. Quando a promoção confere descontos, o cliente não paga o preço total pelo serviço, mas o motorista recebe o valor cheio.
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A 99 também realiza ações para estimular seus parceiros motoristas, como a oferta de bônus para quem atinge determinado número de corridas durante um período. No feriado de Páscoa, por exemplo, o motorista poderia faturar até R$ 600 a mais caso finalizasse 99 viagens entre os dias 29 de março e 2 de abril. Utilizando o esquema das viagens falsas, fica mais fácil atingir as metas que liberam esses bônus.
De acordo com as fontes ouvidas pela reportagem, um motorista de transporte individual ganha de R$ 180 a R$ 250 por dia, trabalhando das 6h às 18h. Existem relatos de que motoristas que participam desse esquema faturam até R$ 7 mil em um único final de semana, período em que a 99 intensifica as promoções e os incentivos. Para aumentar os ganhos, alguns dos envolvidos criaram grupos. “No final do dia eles se encontram e dividem tudo.”
Sofisticação
A fraude tem uma vertente mais sofisticada, em que os golpistas não precisam sequer sair de casa para agirem.
Por meio de um programa instalado no computador ou aplicativo de celular, é possível enganar o sistema de GPS do celular. Sabendo dessa brecha, o “motorista” simplesmente traça o caminho que deseja, a velocidade média e faz com que o sistema de localização do dispositivo móvel dele e o do passageiro façam a mesma rota. Assim, os aplicativos da 99 entendem que ambos estão se movimentando e registram a viagem como se ela fosse real.
“Tecnologicamente, é possível realizar este tipo de manobra”, garante Held. A reportagem testou o “GPS Fake”, como o app é conhecido, e comprovou que é viável simular trajetos com o celular.
Também nesses locais online, contas de usuários da 99 são comercializadas por preços que variam em função da quantidade. Existe até promoção: um por R$ 30, dois por R$ 50 e cinco por R$ 110. Carteiras de habilitação com EAR (Exerce Atividade Remunerada, permissão para exercer atividade de motorista remunerado) também são oferecidas, bem como o aluguel e venda de perfis de motoristas.
Como a 99 faz uma triagem de motoristas, que também devem realizar um processo junto ao Detran para obter a EAR, motoristas que não fazem parte do esquema são assediados para “alugar” seus perfis por R$ 200 por semana. O esquema ganhou tamanha proporção que até um “kit fraude” é vendido: por R$ 350, o interessado adquire 10 chips de celular, números de CPF falsos e de CNH com EAR, além de instruções para aplicar o golpe.
Posicionamento da 99
Em resposta à reportagem, a 99 informou que possui um time dedicado para analisar casos de segurança e fraude. “Temos processo continuo de inteligência que identifica comportamentos atípicos e, quando constatado abuso pelo usuário da plataforma, realiza o bloqueio da conta de passageiro ou motorista. Além disso, encorajamos que usuários e parceiros motoristas que denunciem casos de abuso através do telefone 0300 3132 421.”
Fonte e Infografia: Gazeta do Povo
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