Rio – A proposta de intervenção no mercado de álcool e de imposição de um teto para o preço do combustível recebeu críticas de especialistas ouvidos hoje (5) pela Agência Estado. A avaliação é de que o setor deve ser acompanhado pelos órgãos de defesa da concorrência, mas é um mercado livre e, como tal, está exposto à lei da oferta e da procura e a questões sazonais. "O mercado é livre e quando falta produto o preço vai subir mesmo. Intervir nisso pode trazer problemas no futuro", comenta o professor do Ibmec Cláudio Considera.
Considera, que já comandou a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, acredita que o governo terá de garantir preços mínimos para os produtores no período de safra, caso decida impor um teto agora. Caso contrário, a rentabilidade das usinas será prejudicada, comprometendo investimentos. "Uma intervenção deste tipo cria artificialidades que depois são difíceis de serem revertidas", concorda o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE).
"Nos Estados Unidos, o preço da gasolina dispara durante o verão, mas o governo nunca fala em intervir ou negociar um teto", compara o economista, lembrando que oscilações de preços sazonais são comuns em mercados de commodities. "Quem deve regular isso é o consumidor, que, com carros bicombustíveis, deixará de comprar álcool quando os preços estiverem altos", afirma. Com a queda nas vendas, explica, a tendência é que os preços caiam naturalmente.
Para Considera, mexer no porcentual de anidro na gasolina é a medida mais eficaz para evitar picos de preços como o que ocorre atualmente. "É uma maneira de regular o mercado sem intervenção ou subsídio", avalia. Ele sugere que o porcentual seja estabelecido segundo o período do ano, se aproximando dos 25% no período de safra e dos 20% na entressafra. Dessa forma, o governo regularia os preços por meio do controle da demanda, sem intervenção direta nos negócios dos usineiros.
A redução do porcentual de anidro na gasolina, porém, tem um revés: segundo cálculos da União da Agroindústria Canavieira (Unica), uma redução para 20% provocará um aumento de 1% no preço da gasolina, produto com maior peso na nova composição do índice oficial de inflação, o IPCA. O cálculo é simples: o custo da gasolina A na refinaria é de R$ 2,40 e o custo do álcool anidro é de R$ 1,10 na média atual. Com o atual porcentual de 25% de anidro, a gasolina C custa (sem impostos) R$ 2,075. Se o porcentual passar para 20%, a gasolina C passa a custar R$ 2,14.
A intervenção só é defendida pelos especialistas em caso de cartelização no setor. Por isso, ambos defendem uma forte atuação dos órgãos de defesa da concorrência. "Tem de ver se estão combinando preços ou segurando estoques para forçar uma alta antes de decretar intervenção", diz o ex-secretário de Acompanhamento Econômico, que frisa, no entanto, não acreditar que isso esteja ocorrendo neste momento.
Em 2003, depois de reunir-se com os usineiros, o governo obteve êxito na tentativa de forçar uma redução nos preços. Em fevereiro, quando começaram as reclamações, o álcool anidro saía das usinas, em média, a R$ 1,0248 por litro, sem contar impostos. O governo então reduziu de 25% para 20% o porcentual usado na mistura com a gasolina e arrancou dos usineiros a garantia de que o produto ficaria abaixo dos R$ 1. Segundo dados do Cepea/USP, já em março o preço caiu para R$ 1 0051 e, em abril, já no início da safra, atingiu R$ 0,9967.