O governo quer anunciar ainda este ano um conjunto de medidas para facilitar a compra da casa própria. Mas, ao contrário do que ficou parecendo diante da onda de especulações surgida na semana passada, não deverá ser nada retumbante, nem com efeitos imediatos.
A principal mudança em análise é permitir que a casa própria seja adquirida pelo sistema de empréstimo consignado (cujas prestações são descontadas diretamente da folha de pagamentos). A novidade, porém, deverá ficar restrita aos funcionários públicos num primeiro momento. Nesse caso, o que parecia ser uma medida para beneficiar toda a classe média terá um alcance muito menor do que o inicialmente esperado.
Outra parte do pacote, o corte de tributos inclusive sobre a construção, acabou gerando uma crise que abalou o prestígio do principal formulador das medidas, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Gomes de Almeida. Ele levou um "pito" público do chefe, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, por haver afirmado à imprensa que não haveria condições de cortar tributos este ano "nem se o governo arriasse as calças". Mantega classificou as declarações de "inadequadas, inoportunas, infelizes e atravessadas".
O saldo da confusão é que as medidas de desoneração tributária, que haviam sido confirmadas por vários integrantes do governo, inclusive do Ministério da Fazenda, ficaram em suspenso. "Nesse tiroteio total, não tem desoneração", afirmou Almeida na entrevista do desastre. Em outras áreas do governo, no entanto, o entendimento é que as discussões continuam, talvez com menos pressa e mais em silêncio.
De qualquer forma, jogou-se um balde de água fria nas expectativas do setor. "Fica até difícil a gente comentar, porque eles não se entendem", disse o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Paulo Safady Simão. "Acho que as coisas começarão a clarear semana que vem.
Ele esperava ver atendida uma proposta apresentada por sua entidade, que é a possibilidade de descontar do preço final do imóvel vendido às famílias de baixa renda uma parte dos impostos. Na mesma linha, a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) propõe isentar as operações de crédito imobiliário comerciais do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e eliminar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) no pagamento das prestações da casa própria. Agora, não se sabe se idéias do tipo prosperarão.
Em termos de desoneração, o que estava pronto na semana passada era algo bem mais modesto: o corte do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre alguns poucos materiais de construção.
Também está em andamento, a passos mais lentos, uma proposta para retirar os impostos incidentes sobre a construção de prédios que alojarão fábricas, como uma medida de incentivo ao investimento produtivo. O governo já tirou uma parte da tributação sobre a compra de máquinas e agora quer fazer o mesmo para os imóveis onde elas serão instaladas.
O empréstimo consignado para a habitação é uma antiga reivindicação do setor de construção civil, disse Paulo Safady Simão. Mas, de uma conversa recente com o secretário Júlio Sérgio, ele saiu com a impressão que essa modalidade de empréstimos será bem restrita. "A princípio, entendi que se fará um piloto com funcionários públicos", informou Simão. A idéia de repetir com a venda de casas o sucesso que o consignado fez com eletrodomésticos foi perdendo força por causa de uma série de entraves. Os empréstimos com desconto em folha têm o juro baixo porque nessas operações o risco de "calote" é muito pequeno.
Porém, no caso da habitação, os financiamentos são de prazo mais longo e o valor dos empréstimos, bem maior. Há risco de o mutuário perder o emprego no meio do contrato, deixando uma dívida. "A discussão de garantias é importante", diz Simão. Sem garantia adequada, o resultado mais provável é que o juro do consignado da habitação não seja muito diferente dos outros financiamentos da praça.
Além disso, o empréstimo habitacional com desconto em folha não é exatamente uma novidade. A Caixa Econômica Federal já oferece essa modalidade, segundo informou sua superintendente nacional de Habitação, Vera Lúcia Martins Vianna.
