No seu último discurso de campanha, Lula fez um ?confiteor?: ?Humildemente, eu reconheço que nós erramos. Humildemente eu reconheço que nós fizemos coisa errada. Mas, humildemente, eu reconheço que, com tudo errado que nós fizemos, este país melhorou de forma extraordinária em comparação com os oito anos do governo deles?.
É bom que os homens públicos sejam capazes de admitir seus erros e muito mais se os identificarem. Dispensáveis as comparações das gestões atuais com as anteriores num país em construção, onde ainda mais falta por fazer do que já foi feito. O cotejo, sobre ser sempre duvidoso porque baseado em dados de difícil conferência, é inútil e o anúncio de que se fizeram progressos pode ser afirmar o óbvio, a menos que a retrocessos tenham se dedicado os gestores da coisa pública.
Por diversas vezes, nesta campanha, um e outro candidatos prometeram fugir desse debate estéril de qual foi o melhor e basear seus argumentos em programas e projetos. Pouco disso se viu. Houve sempre a preocupação de denegrir o adversário ou menoscabar seus feitos. E exaltar seus defeitos. Desses males padeceram tanto a campanha de Alckmin quanto a de Lula. E padece a nação sem saber muito bem o que a espera para os próximos quatro anos, seja quem for o eleito.
Não obstante esta campanha eleitoral tenha navegado por águas turvas em que o fundo nunca esteve muito visível, é evidente que a discussão da qualificação ética dos candidatos e seus grupos e partidos foi inevitável. Isto porque entre nós a preocupação com a moralidade no exercício da coisa pública nunca esteve no primeiro plano. Na nossa política, a moralidade nunca figurou, até aqui, entre os seus usos e costumes. Também natural que surgissem alguns embates de natureza programática e até ideológica, mas é de se lamentar que não tenham desembocado em projetos de governo. Mais se falou no passado que no futuro e se olhássemos um pouco mais atrás descobriríamos que Lula e FHC, Serra e até o próprio Alckmin de alguma forma foram farinha do mesmo saco.
Os dois grupos são forças que estiveram unidas na luta contra a ditadura militar e ambas tinham vezos de social-democracia. O grupo de Lula estava mais à esquerda e se dizia socialista, bandeira que foi abandonada durante o mandato exercido e agora ameaça retomar. Será que podemos crer num país politicamente gerido de acordo com ideologias? Já não estavam mortas? Pelo menos como instrumento de caça de votos, as ideologias ressurgiram. Reapareceram na discussão de privatizações e estatização dos meios de produção. Reapareceram até nas invocações de luta de classes, o que cheira a algo um tanto velho e empoeirado num Brasil em que não mais é lícito, nem mesmo à burguesia, sonhar com governos dominados por oligarquias e pelo poder econômico. As questões sociais se avolumaram a tal ponto e ganharam proporções tão gigantescas que hoje exibem o fantasma da criminalidade e da insegurança como argumentos para que reformas sociais sejam indescartáveis. E terão de ser feitas com Lula ou Alckmin.
Como essas reformas sociais no mundo hodierno não mais se pautam por herméticas ideologias nem mesmo nos países ainda marxistas, seria de todo aconselhável que na campanha que agora se finda não tivessem os candidatos perdido tanto tempo comparando governos, o que se finda e o que já acabou há quase quatro anos. Abertas as urnas e conhecidos seus resultados, esperamos que os vencedores se debrucem sobre os nossos problemas, em busca de soluções. O debate eleitoral só desviou as atenções dos verdadeiros problemas da nação e de como solucioná-los.