A atual legislação brasileira que prevê punições às mulheres em relação ao aborto será avaliada por uma comissão formada pelos poderes Executivo e Legislativo e pela sociedade civil. A comissão começa a se reunir no início de março. Ao final do trabalho, uma proposta de Lei deverá ser encaminhada ao Congresso. A idéia é unificar os vários e diferentes projetos em tramitação.
A formação do grupo foi um dos aspectos abordados na I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, realizada em julho do ano passado. Na ocasião, "quase duas mil mulheres aprovaram que deveria haver interferências do governo para uma avaliação e mudança da legislação punitiva nos casos de interrupção da gravidez", conta a assessora especial da secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Teresa Sousa.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, a interrupção feita em condições precárias é uma das grandes causas da mortalidade materna e um dos maiores custos para a saúde pública. A partir dessas constatações, o Brasil já havia se comprometido a criar políticas públicas para a área em acordos mundiais, como a Declaração de Beijing, assinada em 1995 durante a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, na China.
De acordo com os artigos 124 e 126 do Código Penal Brasileiro, a mulher que fizer aborto pode ter como pena detenção, de um a três anos. Já quem provocar o aborto com o consentimento da gestante pode ter penas de reclusão de um a quatro anos. "É importante a sociedade garantir o direito às mulheres de decidir sobre a sua maternidade e esta é a primeira vez que, com uma iniciativa do governo, estamos tentando avançar na discussão do aborto", diz Nalu Faria, representante do movimento Marcha Mundial das Mulheres.
De acordo com o ministério da Saúde, todos os anos 250 mil mulheres são internadas no Sistema Único de Saúde por complicações em abortos espontâneos ou feitos de forma ilegal. "Além de fazê-lo com muito medo e muita culpa, fazem com riscos à saúde o que ocasiona um alto índice de mortalidade e seqüelas", ressalta Nalu Faria.
Os ministérios do Planejamento, Justiça, Saúde e Casa Civil e as secretarias geral da Presidência da República e especial das Mulheres vão compor o poder Executivo na Comissão. O Legislativo será representado pela bancada feminina da Câmara. E, pela sociedade civil, estarão a Rede Feminista de Saúde, Central Única dos Trabalhadores (CUT), Associação de Mulheres Brasileiras, Fórum de Mulheres do Mercosul e a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Para a representante da CUT na comissão, Ednalva Bezerra, "achamos que o governo deve garantir o direito às mulheres de fazer um aborto digno, que não seja na clandestinidade e em condições que garantam sua saúde. Ele não pode ser visto apenas como uma questão de saúde, mas deve ser um direito das mulheres ter autonomia para suas escolhas", afirma.