As vontades dos Estados Unidos e de Israel não foram feitas nesta 60ª Comissão de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas na conclusão dos debates sobre racismo, xenofobia e a discriminação racial.
A Comissão aprovou o pedido dos países muçulmanos de realizar uma sessão especial para discutir o assassinato do líder do Hamas, xeque Ahmed Iassin, cometido nesta semana pelas forças israelenses.
Os 53 países que participam da comissão também votam hoje (24) uma resolução que condena duramente o trágico assassinato de Iassin, bem como o liquidamento e as execuções extrajudiciais cometidas por Israel contra o povo palestino.
Por 34 votos a três (EUA, Eritréia e Austrália), com 14 abstenções (todos países da União Européia – UE), a Comissão aceitou realizar o debate que foi solicitado pelo Paquistão em nome da Organização da Conferência Islâmica e do Zimbábue. Os Estados Unidos votaram contra a convocação do debate especial, junto com Eritréia e Austrália.
Israel tentou argumentar que a Comissão nunca havia se manifestado quando o Hamas realizava atentados terroristas contra civis. Já os EUA ? como é habitual nos eventos internacionais ? fizeram a defesa do seu aliado indicando que Israel tem o “legítimo direito de proteger sua segurança e repelir atos terroristas”.
Pela UE, a Irlanda, condenou Israel pelo assassinato do xeque, mas disse que se absteve ao considerar que o assunto palestino ocupará de qualquer forma um espaço muito maior na pauta da Comissão de Genebra.
Em seu momento, a Palestina lembrou que ao colocar o caso nas mãos da Comissão se cumpre ao menos a formalidade de acusar uma clara transgressão dos direitos humanos, “porque, definitivamente, Tel Aviv é omissa a todas as resoluções internacionais e até mesmo ao Conselho de Segurança da ONU, que repreendem seus crimes abomináveis”.
Isolamento
Organizações Não Governamentais (ONG) de diferentes lados do mundo rechaçaram com vigor o que chamaram de hipocrisia de Washington ao impor modelos de democracia quando na realidade tem um dos piores recordes de violações dos direitos humanos. A Associação Internacional contra a Tortura (AICT), com base em Nova York, lembrou que três anos depois da Conferência de Durban ? Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância que ocorreu em Durban, na África do Sul, em 2001 com a participação de 180 países do mundo ? se observam poucos avanços na aplicação de um programa efetivo contra o racismo no mundo.
Para certos interesses do Ocidente, após a libertação de Nelson Mandela e com os dez primeiros anos de uma África do Sul sem apartheid, os esforços na luta contra a discriminação racial não têm mais o mesmo peso que antes. “Não obstante, nada mais deixo da verdade. O racismo nos Estados Unidos contra os negros é alucinante. Somente 50% dos afro-norte-americanos e 53% dos estudantes hispânicos terminam o nível pré-universitário”, argumentou a AICT.
“A mortalidade infantil nas crianças negras é cerca de 2,5 vezes maior que a dos brancos e o desemprego em Nova York referente à comunidade afro é de 50%. Nem vamos entrar na pobreza e no aprisionamento de nossos cidadãos porque as cifras são mais alarmantes”, disse.
O representante do Conselho Mundial da Paz (CMP), Bráulio Boris Castillo, concluiu com o óbvio: em nome do “combate ao terrorismo internacional”, os EUA estão acabando com as garantias contra as violações dos direitos fundamentais no mundo. E para “reforçar a segurança estadunidense”, o presidente George W. Bush firmou um decreto que instaura tribunais militares especiais para estrangeiros, como a prisão de Guantánamo, onde se encontram 650 pessoas oriundas de 42 países.
Segundo o porta-voz do Movimento Internacional da Secretaria 12 de Dezembro, hoje em dia, os negros (os ex-escravos norte-americanos e descendentes de africanos) são vítimas dos maiores crimes cometidos contra a humanidade e a sociedade civil, o mesmo que ocorre com Israel e suas barbáries frente aos palestinos.
O Movimento 12 de Dezembro também denunciou que há uma conspiração da imprensa internacional bem paga, capaz de fabricar mentiras e citou como exemplo, o Zimbábue: “Depois de séculos de colonialismo, o povo está reconstruindo seu país enquanto os ideólogos que choraram de arrependimento com o simbólico “never again” sobre o apartheid, são os mesmos que financiam agora a desestabilização da África e o holocausto palestino”, afirmou.
Na intervenção da Federação Democrática Internacional de Mulheres (FDIM), Sandra Aguila lembrou que são os povos do Terceiro Mundo os principais brancos de exclusão, racismo e xenofobia, “porque foram objetos de comércio de escravos e colonialismo por parte das potências ocidentais enriquecidas”. Ela também disse que a construção ilegal de um muro no território palestino ocupado perpetua o sistema de apartheid e abre caminho para que Israel converta a Palestina em um povo de prisioneiros e nega o direito das crianças às escolas.
Condenações
Nas intervenções prévias a votação, o ministro chinês Shen Guofang ? com fina ironia ? lembrou que dois anos antes havia ocorrido um episódio similar na Comissão com relação às atrocidades cometidas por Israel contra o povo palestino. “A mesma sala de Genebra, a mesma violência israelense e a mesma postura estadunidense. Uma história triste e dramática repetida que renova a necessidade de aumentarmos nosso apoio à causa da Palestina”.
O bloco formado por Paquistão, à frente do grupo islâmico, Egito, Sudão, Qatar, Arábia Saudita, Indonésia, Bahrein e Mauritânia, classificou o assassinato do guia espiritual do movimento Hamas como “violação flagrante e ato abominável cometido por Israel. Não somente pelo ato em si, mas também pela satisfação mostrada por Ariel Sharon e seu comando central quando do êxito da execução de um homem de 80 anos, inválido e cego.
O chefe da delegação cubana, Juan Antonio Fernandez, disse que o episódio o comoveu e indignou o povo cubano e afirmou que se trata “de um crime brutal, covarde e desagradável”. “Os assassinatos seletivos de Tel Aviv não resistem à menor análise e a votação de hoje é reflexo do mundo atual”, afirmou.
O representante da República do Congo assegurou que todas as pessoas honestas no mundo se sentiram estremecidas pela ação carregar tanto ódio.