Começou o diálogo

Ao que tudo indica, a primeira entrevista coletiva do presidente Lula à imprensa, depois de mais de dois anos de governo, marca o fim do monólogo do Executivo com a nação. A eleição de Lula foi tão abundante em votos e significou uma mudança tão radical no poder que quase ninguém percebeu que, ao longo de mais de meio mandato, o presidente falava e a maioria do povo concordava, quando não aplaudia. E sem discutir. Isso porque percebia que havia uma mudança na cúpula do poder e ela já significava o atendimento a uma reivindicação quase que unânime. Para receber aplausos efusivos e concordância quase unânime, bastava ao novo governo apenas discordar do que até aqui fizeram seus antecessores. O que quer que fizesse de diferente estaria inovando e tentando caminhos antes nunca trilhados. Os já trilhados por repetidos governos sempre nos levaram a crises e mais crises. E o povo, a um permanente descontentamento.

Se era para receber aprovação e aplausos, não havia necessidade de diálogo, pois faltavam as vozes discordantes. Mais da metade do mandato, entretanto, demonstrou ao governo Lula que já existem em número e eloqüência vozes discordantes. E elas não partem só da apequenada oposição, mas também dos aliados da primeira hora. Daqueles que subiram ao poder com Lula e nele não se sentiram confortáveis.

A coletiva concedida não foi um monólogo. O monólogo de dois anos e dois meses. Foi, sim, a soma de quatorze monólogos, o número de interlocutores admitidos pelo governo a quem cabia fazer perguntas sem réplicas. Em boa hora o presidente Lula, cuja loquacidade é bastante conhecida, desistiu de fazer discursos prévios, limitando-se àqueles que utilizou como respostas às perguntas que lhe foram dirigidas. O que disse de importante? Poderíamos destacar, porque é o cerne dessa sua primeira fala pública, o apoio irrestrito à política econômica dirigida pelo ministro Antônio Palocci e Henrique Meirelles, do Banco Central. Lula disse que sua união com o ministro da Fazenda é de unha e carne. E antiga, de mais de trinta anos. Não seria demais imaginar uma unha encravada.

Afirmando que este é um país capitalista, Lula reclamou da sociedade um comportamento adequado a esse regime econômico. E adequado seria o combate aos juros altos, a adequação do preço do dinheiro à competitividade que o capitalismo reclama. Aí, sem deixar de defender a política de juros elevados ditada pelo governo, o presidente dosou mais adequadamente a pílula. Admitiu que nem só de Selic morrem os sonhos de desenvolvimento, mas também da inação do mercado. Da falta da iniciativa de tirar o traseiro da cadeira para brigar por dinheiro mais barato.

No mais, o presidente reconheceu a impotência, sem admitir incompetência do governo. E reafirmou suas melhores intenções, pois nem tudo o que deseja fazer ele consegue. E nem tudo que consegue, desejava para a nação.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo