Combustível social

O ingresso do Brasil na produção de biodiesel, o chamado combustível verde, é uma realidade que parece ter chegado ao ponto do não-retorno. O sinal eloqüente do acerto da iniciativa é confirmado pelo grau de entusiasmo com que o agronegócio e, em particular, os produtores de soja, se aprestam a desembarcar na atividade.

Destarte, logo estarão soando vozes discordantes, tendo em vista a proposta original do projeto de fazer da agricultura familiar nas regiões deprimidas a principal produtora da matéria-prima a ser empregada na fabricação do combustível. Sob esse enfoque, os incentivos estariam voltados à organização de cooperativas de pequenos produtores familiares e usinas para produzir o biodiesel, basicamente, a partir da mamona.

Há poucos dias foi inaugurada em Barra do Bugres, a 150 km de Cuiabá, capital de Mato Grosso, a primeira usina de biodiesel com base na soja. A decisão do governo é tornar obrigatória, em 2008, a mistura de 2% do combustível vegetal ao diesel derivado do petróleo, mas já se admite que o agronegócio exerça pressão no sentido de antecipar a segunda parte do projeto (mistura de 5%), de 2013 para 2010.

Para garantir a adição de 2% de biodiesel ao óleo convencional, a produção necessária é de um bilhão de litros por ano, passando para 2,7 bilhões quando a mistura evoluir para 5%. O negócio é excelente e já atrai a atenção de grupos estrangeiros em projetos de produção de soja na região norte do país, incluindo a implantação de unidades industriais.

Apesar do prognóstico otimista da iniciativa privada que hoje aposta no uso da soja, de encampar até 90% do fornecimento da matéria-prima para a produção de biodiesel, o governo se compromete a salvaguardar o escopo inicial do projeto e ?reservar? pelo menos 30% desse potencial para a agricultura familiar.

O grande trunfo está na atuação da Petrobras na produção de biodiesel, cuja meta é estimular a agricultura familiar a produzir matéria-prima para industrializar 855 milhões de litros/ano até 2011. Dessa forma, o governo conseguiria assegurar, pelo menos em parte, a obrigatoriedade do uso da produção da agricultura familiar, conferindo ao biodiesel o selo de ?combustível social?.

Cabe ao governo, principal indutor do projeto, viabilizar a agricultura familiar mediante regras claras de equilíbrio com o poder impositivo do agronegócio. 

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