“Com-pe-tên-cia”

Se o Zé quis machucar o Antônio, quem se feriu foi o Luiz. O Luiz Inácio Lula da Silva. A frase foi cunhada pelo jornalista João Mellão Neto, em artigo escrito no jornal O Estado de S. Paulo. Resume em poucas palavras o momento mais esquisito que estamos vivendo nessa interminável crise palaciana: a oposição defende o governo nas questões de política econômica, enquanto o PT e a base aliada derramam gasolina e ateiam fogo no resto do paiol. O estrago está feito, segundo o mesmo articulista, para quem o presidente Lula, com sua autoridade posta à prova todos os dias, está enfrentando evidente processo de deterioração da imagem de seu governo. E o que é pior, nada consegue fazer de consistente para recuperá-la, mergulhado no que os psicólogos chamariam de escapismo – um comportamento muito conhecido pelos avestruzes, que preferem ignorar os problemas ao redor.

Esse clima de suspeição geral criado com as revelações do episódio Waldogate que paira sobre o Planalto é a causa de tudo. Lula preferiu pagar para ver e está vendo no que deu atribuir pouca importância a fatos tão graves, que colocaram gente sua na área de ambígua sociedade com o submundo da jogatina, da arrecadação de fundos ilícitos para campanha política e, quem sabe, otras cositas más. Além da credibilidade em frangalhos, a corte, atônita, descobriu que o rei está nu: por iniciativa do próprio PT, a política econômica, única coisa que servia de sustentação ao discurso oficial até aqui, desceu pelo ralo da intemperança. E já pediram a cabeça do ministro da Fazenda. A próxima, com certeza, será a do próprio Lula.

O presidente não devia deixar que seu ministro predileto, José Dirceu, viesse a público para contar bravatas, como fez no dia de seu aniversário. Nem prolongar esse suspense que já tira o sono de muita gente. Se perdeu a oportunidade de afastar o colaborador para dar a volta por cima no nascedouro da crise, agora, pelo menos, deveria impor-lhe o castigo do prudente silêncio. Ao declarar-se inconformado com sua “in-com-pe-tên-cia” por não ter percebido o que fazia o ex-assessor parlamentar e “amigo” Waldomiro Diniz, Dirceu inscreveu no diário do governo do companheiro Lula a terrível palavra “in-com-pe-tên-cia”. É mais do que a inconcebível insistência na falta de vontade de investigar.

Mas não impondo o silêncio ao assessor direto, Lula fica também sem autoridade para exigir ordem no quintal alheio, isto é, de seus aliados. Por isso, nenhuma surpresa pode ser alegada quando o presidente do PL pede, em nome de uma incompetência que julga manifesta, a queda do ministro Palocci. Ele apenas estaria colocando em prática o que as próprias bases do PT querem: “Energizar o partido (sic) e pressionar de baixo para cima por mudanças porque, com esse ajuste, o crescimento é impossível” (in Ivan Valente, deputado do PT paulista no seminário “Queremos outro Brasil!”). Enquanto isso, em Londres, o ministro Palocci advertia que a política econômica não pode ser alterada por pressão política…

Balelas ao vento para dissipar os maus odores do Waldogate. O próprio presidente Lula tem se esgoelado para dizer que o crescimento vai acontecer. Só que o prazo foi esticado para 2006. “Na hora que a gente atingir a credibilidade que nós entendemos que um país tem que ter – disse ele em Belo Horizonte, na quinta-feira que passou -, os nossos juros serão mais baratos, nós iremos controlar a inflação e a economia brasileira vai voltar a crescer muito mais rapidamente.” Eis o problema básico: na hora que atingirmos a credibilidade…

Como conseguir credibilidade com tanta “in-com-pe-tên-cia” no Planalto, já não restrita ao ministro Dirceu? Enquanto desemprega por decreto para fugir do fantasma da corrupção no caso dos bingos, o governo Lula, integrado por ilustres sindicalistas, condiciona o pagamento de direitos dos aposentados ao aumento das contribuições sociais que oneram exatamente a folha de pagamento das empresas. Em vez de dez milhões de novos empregos, poderemos caminhar rapidamente para dez milhões de novos desempregados neste Brasil onde, no dizer do cardeal Geraldo Majella, da Conferência dos Bispos do Brasil, “a condição para uma família sobreviver já está no extremo da necessidade”.

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