São Paulo – A agricultura é uma das grandes vítimas do dólar baixo. Segundo estudo do economista Fábio Silveira, diretor da RC Consultores, a margem de lucro do plantador de soja, que era de 25% em 2004, caiu para -5% neste ano (prejuízo de 5%). Isso porque o faturamento do produtor agrícola, atrelado ao dólar, caiu bem mais que as despesas.
A receita do produtor de soja caiu de R$ 37,6 bilhões em 2004 para R$ 27,1 bilhões em 2005 e R$ 22 bilhões em 2006. A queda foi resultado do recuo do preço internacional – que era de US$ 280 a tonelada em 2004, US$ 225 em 2005 e deve ficar em US$ 210 este ano -, aliado a uma queda de 25% do dólar no período. "As receitas do produtor caíram 47%, enquanto os custos como fertilizantes e insumos (também ligados ao dólar) tiveram queda de apenas 10%", diz Silveira.
Os produtores de soja do Brasil vão fechar o ano com prejuízo de R$ 1,1 bilhão (receita de R$ 22,4 bilhões e custos de R$ 23,5 bilhões). Os produtores de arroz terão prejuízo de R$ 300 milhões e os de milho, R$ 100 milhões. Quem planta trigo terminará o ano zerado. Entre os grãos, apenas algodão (lucro de R$ 400 milhões) e feijão (lucro de R$ 1,4 bilhão) terão bom desempenho. Será um ano positivo para o café (lucro de R$ 2,4 bilhões), cana (lucro de R$ 4,8 bilhões) e laranja (lucro de R$ 2,4 bilhões).
Mato Grosso – maior produtor de soja, algodão e bovinos do Brasil, segundo em arroz e grande celeiro de milho, milheto e sorgo – foi atingido em cheio. O Estado deve reduzir sua produção de grãos e algodão em 30% a 40% neste ano. A arrecadação de ICMS caiu 15% em relação a 2005. No ano passado, pela primeira vez desde 1999, Mato Grosso teve perda de empregos (criou 27.768 empregos em 2004 e perdeu 5.776 em 2005). Além da queda de receita, o estoque de endividamento dos produtores é muito alto – estima-se que chegue a R$ 15 bilhões no País.
Reclamações
Gente como o gaúcho Aimoré Xavier, de 68 anos, um dos pioneiros da soja em Mato Grosso, pensa em abandonar a lavoura. Xavier planta há 31 anos em Itiquira, perto de Rondonópolis, cerca de 1.400 hectares. Como plantou a soja com um dólar muito acima da cotação que recebeu na colheita, teve prejuízo e suas dívidas estão na casa dos "milhões". "Não adianta só pagar a dívida, se a lavoura não dá mais dinheiro. Não vamos conseguir ganhar dinheiro para plantar a próxima safra e pagar as dívidas", diz. "O dólar é uma situação que o governo criou e precisa resolver."
A crise levou os agricultores a uma onda de protestos, batizados de "Grito de Ipiranga". Desde o dia 18 de abril, produtores estão bloqueando estradas para impedir o escoamento da safra de grãos. Eles protestam contra a política cambial, alto preço do diesel e pedem refinanciamento das dívidas. As manifestações já atingem oito Estados.
Em 2004, as exportações do complexo soja, carro-chefe da balança comercial brasileira, chegaram a US$ 10,3 bilhões. Em 2005, caíram para US$ 9,1 bilhões e, em 2006, devem ficar em US$ 8,5 bilhões.
"O principal motivo da crise na agricultura é o câmbio", diz Silveira. "Os problemas climáticos, as pragas e o recuo dos preços internacionais são fatores coadjuvantes." Os preços internacionais estão dentro dos níveis históricos e não houve nenhuma grande quebra de safra. "Mesmo com a queda dos preços, o produtor deveria ter lucros, ainda que menores", diz. "Mas, com o câmbio baixo, houve uma sangria."
Segundo Silveira, a safra de soja deste ano ainda não irá refletir a crise do setor. Em 2005, a safra foi de 51,5 milhões de toneladas e deve encerrar este ano em 55 milhões de toneladas. Mas em 2007 haverá grande redução da área plantada.
