A pouca vontade de uns se impôs sobre a pouca coragem de outros. E, assim, a humanidade seguirá queimando petróleo em vez de incrementar o aproveitamento da energia do sol, do vento, das águas e outras consideradas mais limpas e menos críticas para a sobrevivência da vida na Terra. A Conferência de Johannesburgo – ou Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável – derrotou a proposta brasileira, apoiada pelos principais países da América Latina e do Caribe, além da Comunidade Européia, que preconiza a meta global de dez por cento de fontes renováveis na matriz energética do mundo até o ano 2010.

Na liderança dos que foram contra estão países que imaginam transformar a Amazônia num território sem bandeira: Estados Unidos, Japão, Austrália e países produtores de petróleo. Quando o interesse econômico fala mais alto, o discurso ecológico vira artigo de vitrine. É bonito fazer discurso, mas entre o discurso e a prática há uma distância que varia de acordo com os interesses imediatos de governos ou poderosos grupos econômicos.

Foi bonito o discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso, ao defender a tese brasileira. O Brasil – disse ele ? vem a Johannesburgo com os olhos postos no futuro, mas com as mãos prontas para o trabalho. Foi uma lição de cidadania, prontamente apoiada pelo governo da Inglaterra e da direção da própria Comunidade Européia. Referiu-se à imoralidade de se assistir passivamente à destruição dos complexos ecossistemas de que depende a vida na Terra; à necessidade de se encontrar o equilíbrio entre prosperidade econômica e proteção do meio ambiente e justiça social; defendeu um novo paradigma de desenvolvimento que não venha a limitar o direito das gerações futuras de fazerem suas próprias escolhas e que respeite a biodiversidade.

Em seu discurso, FHC lançou a semente da formação de um Fundo para Diversidade Biológica, a começar com modestos e quase simbólicos recursos de países detentores de maior biodiversidade, aberto à contribuição de outros países, organizações e empresas. É preciso deter o processo de aquecimento global, advertiu, pedindo apoio da comunidade internacional a uma das últimas iniciativas do governo brasileiro – a criação da maior área de proteção da floresta tropical do planeta, o Parque Nacional do Tumucumaque, com 30 milhões de hectares, na Amazônia setentrional.

Entre os imperativos fundamentais na luta pela erradicação da pobreza, além do desenvolvimento sustentável, o presidente brasileiro voltou a bater na tecla da necessidade de uma maior “previsibilidade e estabilidade dos fluxos de capitais”, assim como na luta contra o protecionismo do mundo desenvolvido e no combate aos subsídios agrícolas e barreiras tarifárias ou não-tarifárias impostas pelos países ricos sobre os pobres e emergentes. O presidente citou também os avanços conseguidos no campo dos direitos sobre a propriedade intelectual e saúde pública, que permitem ao Brasil, África e outros países melhor enfrentamento ao flagelo da aids e outras doenças.

Ainda em seu discurso, o presidente brasileiro cunhou o termo “cidadania planetária” para definir um conceito que implica numa maior responsabilidade do homem sobre seus destinos. “Cabe-nos – disse – ir além da perspectiva meramente nacional, por mais legítima que seja.” Em outras palavras, a globalização das responsabilidades.

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