Carga inaceitável

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, não é nenhum bruxo, daqueles que, ao lado do trono, com inexplicáveis magias, manipula os poderosos. Foram tantos na história, o mais famoso Rasputin, na Rússia. Mas, mesmo sem ser essa figura intrigante, é o homem mais poderoso do governo Lula, pelo menos para efeito externo. Tão poderoso que intocável, como ficou provado nos episódios nebulosos à sua volta, em que não só se manteve indene, como prestigiado e ainda atraindo para si parcelas de poderes tidos e havidos como de políticos mais conseqüentes e de fama mais pudica.

De fato, quem manda neste governo, na prática, é o ministro da Fazenda, Antônio Palocci Filho, pois o poder está sempre nas mãos de quem tem o dinheiro ou a chave do cofre. E continua mandando, mesmo divergindo, vez ou outra, do próprio José Dirceu, chefe da Casa Civil e quejandos, num governo em que as funções se misturam e migram, conforme o momento e o desenrolar das lutas intestinas em Brasília.

Não interessa, portanto, se o título é simplesmente de ministro-chefe da Casa Civil. Dirceu, sem a chave do cofre, dita normas e até enfrenta o homem da chave do cofre. Motivo: parece ser o principal ideólogo do governo Lula, o político mais experiente, que conta com a confiança e, principalmente, com a admiração do presidente da República. Por isso, ele pode dizer, como disse, que a carga tributária brasileira, equivalente a 37% do PIB (Produto Interno Bruto) é “inaceitável”.

Tal tem dito a oposição e os contribuintes, as forças produtivas que a pagam e, desvencilhados do peso desse dinheiro, não têm meios para investir e agüentar ou aumentar a produção. Porque o governo fica com a maior parte do dinheiro do Brasil, retirado do povo e das empresas e o usa para pagar juros da dívida externa, é que há tanto desemprego.

Mas, para Dirceu, o “inaceitável” tem de ser aceito, e aí ele parece um bruxo.

No mesmo discurso em que falou em carga “inaceitável”, disse que o País não tem como reduzir o peso dos impostos. Isso “porque o País tem uma demanda de investimento social e de infra-estrutura. E tem essa demanda do serviço da dívida”. Para tornar aceitável o “inaceitável”, segundo Dirceu, o governo vem adotando medidas para aliviar o peso dos impostos para os empresários, como a redução da carga tributária para incentivar a produção… de impostos, anunciada pelo ministro da Fazenda. Isso significa diminuir certos tributos para que os contribuintes se sintam impelidos a pagar mais. Bruxaria!

“O anúncio do ministro Palocci é uma seqüência das medidas que estamos adotando há mais de trinta dias, como a desoneração dos investimentos”, disse. A idéia é melhorar o perfil dos impostos. “O governo é consciente da qualidade da carga tributária.”

Vamos tentar entender a mágica. É tornar os impostos menos feios, sendo cobrados em quantias mais pagáveis de quem pode pagar e menores para quem não pode. E a carga, como um todo, fica do mesmo tamanho, ou até aumenta. Aí, é porque o Brasil precisa de investimentos e tem despesas sociais. E os banqueiros querem seus juros. Aqui, a racionalização que se faz na carga de arrecadação não tem correspondência na ponta dos pagamentos. Não é, portanto, bruxaria nem milagre. É manter a receita com os mesmos ingredientes, apenas mudando as quantidades de um ou outro ingrediente. E os comensais continuarão sendo os mesmos e com o mesmo apetite…

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