Capoeira muda vida de crianças da Vila Lindóia e Ferrovila

A capoeira está mudando a vida de cerca de 500 crianças das comunidades da Ferrovila e Vila Lindóia, no Pinheirinho. As aulas, do projeto Educando com Arte, são ministradas gratuitamente pela Academia Kauande, como contrapartida social da Lei Municipal de Incentivo ao Esporte.

O educador comunitário Luiz Carlos Déa, fundador da Kauande, organização não governamental, conta que a melhoria no desempenho escolar e na convivência familiar é visível. O método, explica, é o da capoeira voltada ao desenvolvimento sócio-educacional das crianças.

"Nossos educadores costumam visitar a casa dos alunos e, conversando com os pais, acabam tomando conhecimento da evolução dessas crianças tanto na escola, quanto em casa", afirma Déa que trabalha com mais 20 educadores, todos ex-alunos da academia. Ele conta que os pais, quando podem, principalmente aos sábados, fazem questão de acompanhar os filhos e sempre comentam com os professores a respeito da melhora na disciplina da criançada.

Progresso

Rafaela Rodrigues, mãe de Kevyn, de sete anos, que começou a freqüentar as aulas de capoeira há pouco mais de um mês, já percebe no filho uma melhora significativa. "Ele está mais responsável, faz as tarefas da escola, sabe o horário que pode ver televisão, do almoço.

Kevyn, que está no primeiro ano, estuda na escola Municipal Madre Maria dos Anjos, numa turma de 40 alunos. O que ele mais gosta na capoeira é de participar da roda com a dança Maculelê acompanhada pelos berimbaus, pandeiros e atabaque. "Eu gosto que me vejam durante a apresentação, gosto do show, é bem legal", diz, com jeito de artista.

Os irmãos Jackson, 14; Jackeline, 16 e Michael Garcia de 12 anos, estudam na academia Kauande, gratuitamente, desde os 3 anos de idade. Eles são alunos de Déa, na Creche Municipal Pimpão, espaço em que ele iniciou o projeto. O pai, José Garcia é pedreiro autônomo e a mãe trabalha no comércio no Pinheirinho. Todos eles além de fazer todos os movimentos da capoeira, também sabem manusear os instrumentos que dão ritmo à coreografia. "Nossos alunos aqui aprendem tudo sobre a capoeira – desde a filosofia, os movimentos, a disciplina, e os movimentos", conta Déa.

Contrapartida

Para que o aluno se mantenha no programa é preciso que ele seja "bom de nota". Todo final de bimestre é preciso apresentar na academia uma cópia do boletim escolar. "Mas não me recordo de ter que dispensar um aluno por causa de seu mau desempenho escolar. Pelo contrário, a gente só verifica evolução", diz Déa.

"É uma tranqüilidade deixar nossos filhos com pessoas que a gente conhece, num ambiente sadio e seguro", diz Simone Silva, mãe da pequena Raíssa, de 4 anos, que faz capoeira desde os dois anos de idade.

Além da oferta gratuita das aulas de capoeira, três vezes por semana, a Kauande desenvolve atividades em diversas datas comemorativas como Páscoa, Dia das Crianças e Natal. Os próprios alunos fazem shows de capoeira em escolas, salões de festas e academias particulares para os quais recebem donativos em brinquedos e alimentos que são distribuídos para as famílias da comunidade.

As crianças contam ainda com palestras de especialistas em programas de prevenção às drogas e outros assuntos relacionados à cidadania, participam de passeios ecológicos, visitas a exposições de arte no MuMA (Portão) e programas de recreação com equipamentos cedidos pela Secretaria Municipal do Esporte e Lazer.

O grupo ainda atua na Escola de Desenvolvimento Humano, onde crianças portadoras de deficiências dançam, cantam e jogam capoeira. E o projeto já está em outras cidades da Região Metropolitana de Curitiba e em Toledo, trabalhando também com crianças da comunidade.

"Nossa equipe está sempre em contato muito próximo com as crianças. O resultado é sentido na vida cotidiana delas, no melhor rendimento escolar e comportamento dentro de casa", diz o mestre Déa.

Junto com um amigo, Déa desenvolveu um método para ensinar a arte marcial para crianças de dois a seis anos, trabalhando a psicomotricidade. Hoje, o método é praticado na Escola Municipal Ursinho Pimpão. A partir dos seis anos, as crianças são encaminhadas para a sede do grupo, onde todos os sábados treinam capoeira gratuitamente.

História da Capoeira

O Brasil a partir do século XVI foi palco de uma das maiores violências contra um povo. Mais de dois milhões de negros foram trazidos da África pelos colonizadores portugueses e transformados em escravos nas lavouras da cana-de-açúcar.

Tribos inteiras foram subjugadas e obrigadas a cruzar o oceano como animais em grandes embarcações chamadas de navios negreiros. Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro foram os portos finais da maior parte desse tráfico.

Os negros não aceitaram pacificamente o cativeiro e a história brasileira está cheia de episódios nos quais os escravos se rebelaram contra a humilhante situação em que se encontravam.

Uma das formas dessa resistência foi o quilombo – comunidades organizadas pelos negros fugitivos, em locais de difícil acesso, geralmente em pontos altos das matas. O maior desses quilombos estabeleceu-se em Pernambuco no século XVII, numa região conhecida como Palmares, que se transformara uma espécie de Estado africano, distribuído em pequenas povoações, os mocambos, e com uma hierarquia que pertencia ao rei Ganga-Zumbi. Palmares pode ter sido o berço das primeiras manifestações da Capoeira.

Desenvolvida para ser uma defesa, a Capoeira começou a ser os negros ainda cativos, por aqueles que eram capturados e voltavam aos engenhos. Para não levantar suspeita, os movimentos da luta foram adaptados às cantorias e músicas africanas como se fosse uma dança. Assim, como no Candomblé, cercada de segredos, a Capoeira pôde se desenvolver como forma de resistência.

Do campo para a cidade, a Capoeira ganhou a malícia dos escravos e dos freqüentadores da zona portuária. Na cidade de Salvador, capoeiristas organizados em bandos provocavam arruaças nas festas populares e reforçavam o caráter marginal da luta.

Durante décadas a Capoeira foi proibida no Brasil. A liberação de sua prática aconteceu somente a partir da década de 30, quando uma variação da Capoeira, mais voltada para o esporte, foi apresentada ao então presidente Getúlio Vargas. De lá para cá a Capoeira Angola foi se aperfeiçoando na Bahia e ganhando mais território e mais adeptos das mais variadas etnias, sempre fiel às suas tradições culturais.

Serviço
Kauande Capoeira – Associação de Arte e Cultura Brasileira
Av. Brasília, 4974 – Novo Mundo
Site: www.kauande.cjb.net
Contato: Luiz Carlos Déa
Telefone: (41) 3248-4347

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