O Brasil se defronta anualmente com as campanhas educativas do trânsito, geralmente com a duração de uma semana, durante as quais se busca à exaustão incutir uma nova mentalidade de trânsito no povo brasileiro. Aí que reside o erro.
Opinião que justifico: trânsito é problema permanente, que deve se encarado de maneira mais séria, mas constante. Não bastam anúncios institucionais, reportagens esporádicas, quadros na TV, anúncios de rádio… Há que se entender que trânsito deve ser objeto de educação permanente, começando mesmo na pré-escola, passando pelo ensino primário e alcançando os níveis superiores. Evidente que, em cada etapa, uma abordagem específica.
Já tivemos no Paraná boas e gratificantes experiências, ainda que atingindo um universo limitado. Eram as “escolinhas de trânsito” do Batalhão de Trânsito e do DER/Polícia Rodoviária, onde crianças recebiam ensinamentos básicos de como se comportar no trânsito. Afinal, elas são pedestres, são passageiras e são “ciclistas” desde a mais tenra idade. E aquilo que aprendemos cedo, guardamos com maior proveito.
O defeito destas escolinhas residia num ponto: o pequeno universo escolar atingido, pelas suas próprias limitações e das escolas, que dependiam de transporte especial e vaga no calendário para levar suas crianças aos locais de instrução.
Pergunto: qual a razão de trânsito não ser matéria curricular? Afinal, vivemos envolvidos com trânsito. Pode-se, até mesmo, aplicar ao trânsito, por analogia, o célebre poema sobre a árvore que nos dá a madeira do nascimento até a morte. E o trânsito, também não nos acompanha? Há que se pensar no assunto.
E como seria dada essa instrução, sem onerar os quadros policiais? Fácil, muito fácil. Aliás, tudo que se empregue na prevenção de futuros acidentes é investimento produtivo e que vão desonerar os organismos policiais lá na frente. Policias militares especializados na área seriam instrutores de professores, capacitando-os a transmitir aos alunos o que receberam de orientação.
Meios estes que seriam encargos dos órgãos de ensino e que poderiam receber auxílio das montadoras de veículos,que sempre se mostram cooperativas neste assunto. Filmes educativos podem ser facilmente produzidos, afinal existem “enes” órgãos na área.
Se na fase inicial incutir-se-iam comportamentos em relação ao trânsito, na evolução do ensino evoluiriam estes ensinamentos, sempre de acordo com a faixa etária.
E não se diga que isto beneficiará os mais aquinhoados, aquelas de família que tivessem veículos. Afinal, trânsito não se envolve apenas motorista, mas também pedestres e passageiros.
Só um exemplo do despreparo: quantas e quantas vezes não nos defrontamos com pais extremamente carinhosos e zelosos com seus filhos, mas que os mantêm no banco dianteiro dos veículos, quando não os carregam no colo, entre seu corpo e a direção, formando – pena que fatal em caso de choque – excelente amortecedor?
Por experiência pessoal e constatando o desconhecimento do assunto na convivência com alunos de graduação superior, como os das Faculdades da Fundação de Estudos Sociais do Paraná (FESP),incluímos aulas da disciplina Instituições de Direito Público e Privado a abordagem voltada às responsabilidade legais do motorista, em especial nos campos administrativos, cível e criminal. Inclusive prelecionando noções básicas da legislação de trânsito.
Afinal, dirigir inclui graves responsabilidades nos campos citados. Afinal, ensina-se tanta “cultura inútil” que bem poderiam ser dedicadas algumas horas para ensinar um assunto que nos envolve de forma tão direta e tão constante.
Num Curso em Brasília, na Universidade Federal, com professores do Centro de Estudos de Engenharia de Tráfego da Universidade do Rio de Janeiro e contando com professores da Universidade da Carolina do Norte, tivemos oportunidades de verificar o quanto o assunto educação para o trânsito é levado a sério nos Estados Unidos.
Desde desenhos animados até filmes educativos são usados como meios auxiliares nas aulas de trânsito. Sua legislação é rigorosa e largamente difundida, além de ser cumprida.
Portugal, país-irmão que comprazem a muitos de nós com criação de histórias e gozações, oferece-nos uma excelente lição: restrições de velocidade e de área para motoristas iniciantes, obrigatoriedade de decalques nos veículos dirigidos por motoristas novatos e outras mais.
Será que não daria para nossas autoridades pensarem no assunto e deixarem as campanhas sazonais, tão caras e de tão poucos efeitos, adotando a educação para o trânsito um assunto dos currículos normais? Sabemos que a Prefeitura Municipal de Curitiba já procede desta maneira em suas escolas, o que é um exemplo altamente louvável.
Sérgio Manoel Masteck Ramos é professor de Direito e presidente da Fesp e ex-comandante da Polícia Militar do Paraná. masteck@fesppr.br