Breviário forense

breviarioforense170208.jpgO caderno jurídico Direito e justiça, do jornal O Estado do Paraná, editado sob a competente batuta de José Guilherme Assis, oferece dominicalmente uma dádiva aos seus leitores: uma crônica do jurista René Ariel Dotti publicada na coluna ?Breviário forense?.

Pode-se dizer, em breve referência, tratar-se de escritos reveladores da experiência do advogado René Ariel Dotti.

Mas vão além.

Dos textos escritos, todos com o estilo conciso e elegante de um jornalista cuidadoso para ser compreendido por todos que o lêem, percebem-se mensagens e comentários advindos da experiência do advogado e do homem sensível e humanista que é o autor do ?Breviário forense?. Ele interpreta o cotidiano da área jurídica globalmente considerada, com a indissociável marca do estímulo, do aplauso, da esperança e do entusiasmo que repassa em todas as suas intervenções profissionais e sociais.

E quando analisa um tema relevante do presente, a crônica (ou artigo) se desdobra em capítulos claros, como se nota em O desafio da investigação criminal, ao qual dedicou quinze tópicos semanais, uma histórica contribuição, em exposição clara e atrativa, à discussão em curso, publicada neste volume.

Preocupa-se em transmitir aos acadêmicos e recém-formados os caminhos para sua formação universitária e profissional, priorizando a felicidade como o tom maior da vida. Em mensagem de sabedoria, o leitor igualmente se sensibilizará com o destaque outorgado pela crônica a um discurso de paraninfo proferido pelo publicitário Nizan Guanaes, em que este enfatiza o trabalho como instrumento de realização e felicidade (?… só o trabalho leva-o a conhecer pessoas e mundos que os acomodados não conhecerão?), concluindo René Dotti: ?É preciso dizer mais??. E nessa linha, na crônica ?De que é feita a felicidade??, o professor relata ser a ?felicidade? a palavra-chave a encerrar a primeira parte do encontro inicial com suas turmas no curso de Direito, alertando-os a não ter pressa quanto à retribuição financeira, pois ?muitas vezes vale mais a lágrima ou o sorriso de gratidão que o dinheiro?.

Sempre permeadas de apropriadíssimas citações de pensadores e de autores clássicos, que lhe habitam a memória em virtude das leituras que o tornaram um homem das letras e de reconhecida cultura geral, René Dotti mostra, em suas crônicas, ter esperança e ilusão, apanágio que quem é feliz e realiza o que gosta, para além do otimismo que faz questão de exteriorizar primacialmente aos mais jovens, a quem aconselha ficar longe dos pessimistas da profissão, após narrar a reação de desestímulo sentida ao depois de ler a obra Formei-me em Direito… e agora?, de Roberto Lyra, na crônica homônima que compõe esta obra.

Em Quando começar o estágio?, orienta aos acadêmicos sobre quando devem ter início os estágios: no quarto ano do curso. E sustenta que uma edificação não pode ter início sem as fundações, com a precisa indagação: ?Afinal, qual a contribuição que poderá prestar o aluno do 1.º até o 3.º ano do curso num escritório de advocacia ou num gabinete de magistrado ou membro do Ministério Público se ele ainda não tem afinidade de leitura com os textos legais, a doutrina e a jurisprudência frente ao caso concreto??. Note-se a contribuição que essa crônica, como todas as aqui publicadas, oferece ao leitor-acadêmico, que, muita vez, é pressionado, por leigos e por parentes, a fazer estágio já nos primeiros dias do curso.

Como toda a produção científica, jornalística e literária do professor René Ariel Dotti, são valorosas as crônicas de Breviário forense, constituindo esta obra não somente numa transferência de experiências perpetrada com a autoridade moral e intelectual do autor, mas de exemplos de conduta e de humildade de quem, no topo de sua carreira, se preocupa com os valores éticos que devem estar presentes nas atividades forenses.

Nem mesmo quando critica, o professor Dotti consegue ser deselegante. Em três artigos, realça a sobrecarga de trabalho das Varas de Família do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana (?SOS Varas de Família?), rememorando que, antes da Constituição de 1988, um membro da comissão de regimento interno do TJPR rispidamente refutou sua sugestão de, em algumas matérias, ser a Ordem dos Advogados ouvida. Escreveu o autor a respeito: ?Nunca esqueci a indelicadeza. Há, em nossa vida, gestos de amor, afeição, amizade, prepotência, censura ou de outro sentimento, positivo ou negativo, que jamais esqueceremos. Aquele foi um deles?.

Breviário forense reúne escritos que nos demonstram a existência de entusiasmo que nutre boas causas, da grande alma da bondade e do justo elogio, como se vê em João de Castro: o escrivão. Um enaltecimento merecido a um serventuário corajoso da Justiça militar numa época em que muitos se acomodavam.

Várias crônicas, direta ou indiretamente, ressaltam a dignidade profissional e a independência dos advogados, dos membros dos Ministério Público e da magistratura, tendo sido René Ariel Dotti uma das raras vozes que conseguiram esclarecer a opinião pública, em A polícia prende; a Justiça solta, sobre o papel do Judiciário diante de algumas prisões de discutida legalidade efetuadas em recentes operações policiais de grande repercussão. E assim concluiu o professor essa lição democrática: ?E a frase do título desta crônica deve ser complementada: ?A polícia prende e o juiz solta, cumprindo a Constituição e a sua consciência funcional??.

Desde Figueiredo Dias a Zaffaroni, todos que bem conhecem René Ariel Dotti proclamam sua sensibilidade, seu sentimento humanitário, sua solidariedade e sua firmeza na defesa dos seus ideais e das causas que abraça.

Adriano Sérgio Nunes Bretas, advogado e professor paranaense, em recente publicação, salientou que a capacidade intelectual de René Dotti ?transcende as barreiras que o aprisionam a seu tempo. Dotti é atemporal. Reconhecido dentro e fora do País como paradigma humanitário, o professor René Ariel Dotti hoje é vice-presidente da Associação Internacional de Direito Penal, com sede em Paris, membro de seu comitê científico (representado por dez países entre os 84 representados na AIDP) e presidente do Grupo Brasileiro? (Biografia do homenageado. O escudeiro da liberdade. In: Notáveis do Direito Penal livro em homenagem ao emérito professor doutor René Ariel Dotti. Brasília: Consulex, 2006. P. 32-33).

Essa modéstia e simplicidade que acompanha René Ariel Dotti é característica dos verdadeiros homens sábios, cultos e inteligentes, que não precisam mostrar o que são, exatamente porque são; eles sabem ser e estar. E essa postura está cravada em todas as crônicas deste livro, em que se nota que a constante atualização do autor sobre tudo que se passa à sua volta, principalmente em nosso Estado, é transmitida em palavras nobres e simples, com sonoridade poética.

Um exemplo de prestador de serviços consciente de seus deveres, compromissado com o social, um idealista que vem, a seu modo, mudando comportamentos, um dos escopos do verdadeiro educador (no caso, em amplo sentido).

Eugenio Raúl Zaffaroni bem resume, numa frase, a grande alma de René Dotti: ?René es el mismo, desde que defendia presos en la dictadura basta que abora lo cruzo en las recargadas salas e corredores del Palácio de Justicia de Paris? (Prólogo, ob. Cit., p. 10).

Agradeço ao professor René Ariel Dotti o convite para prefaciar esta obra, uma autêntica coletânea de lições de ética, manifestando-lhe meu contentamento com essa lembrança, fruto da elegância do autor para com a magistratura e com aqueles que o admiram e que por ele foram prestigiados com palavras de estímulo desde a fase acadêmica. Não tive a honra de ter sido aluno de René Ariel Dotti, mas seus exemplos me chegaram cedo, desde as palestras a que assistia quando estudante, bem assim suas sustentações orais no tribunal e suas atuações inesquecíveis no tribunal do júri, dentre os inúmeros trabalhos a que tive acesso. E o seu proceder no trato das questões judiciais e o seu contato com os juízes, membros do Ministério Público, desembargadores, autoridades policiais e com os auxiliares da justiça conferem-lhe a estatura de um dos juristas mais respeitados em nosso País, que por ele é projetado na comunidade jurídica internacional, para nosso orgulho paranista e brasileira.

Breviário forense – Crônicas da experiência de um advogado.

2.ª edição revista e atualizada

José Maurício Pinto de Almeida é desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná.
Prefácio da 2.ª edição,

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