O projeto de emenda constitucional encaminhado pelo governo federal sobre a reforma sindical já está numerado (PEC n.º 369/2005) e será submetido a parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados. Em seguida, será formalizada Comissão Especial para examinar o mérito da proposta, juntamente com outras cinco proposições sobre a alteração dos artigos 8.º, 11 e 37 da Constituição Federal.
Eis os pontos essenciais da PEC n.º 369/05: (1) garante a liberdade sindical restringida pelas normas do texto proposto e exclui a liberdade de organizar associações profissionais (2) mantém a proibição de interferência e intervenção do Estado nas entidades sindicais, ressalvado o registro no órgão competente que, novamente não é especificado, como na CF/88 (3) é o Estado que atribui personalidade sindical às entidades, mas não especifica através de qual organismo estatal e qual o sistema de aferição, dependendo de lei complementar (4) as entidades sindicais devem atender aos re-quisitos abstratamente considerados, dependendo também de lei complementar para sua efetividade, a saber os requisitos de (a) representatividade (b) participação democrática dos representados (c) agregação (d) compatibilidade de representação em todos os níveis e âmbitos da negociação coletiva (4) em conseqüência, a proposta elimina a unicidade sindical, a representação por categoria econômica e profissional do atual sistema da CF/88, e, portanto, inaugura a possibilidade do sistema do pluralismo sindical e do sindicato por empresa (5) mantém o direito de representação da entidade sindical face aos seus representados judicial e administrativamente (6) elimina a atual contribuição sindical obrigatória face aos trabalhadores e as empresas e estabelece a possibilidade da assembléia sindical fixar contribuição derivada da negociação coletiva, conforme o que a lei regulamentar (7) mantém a obrigação do desconto da mensalidade sindical na folha de pagamento (8) mantém o princípio da liberdade de filiação (9) mantém a obrigatoriedade da entidade sindical participar da negociação coletiva (10) mantém o direito do trabalhador aposentado votar e ser votado nas organizações sindicais (11) mantém a estabilidade no emprego do dirigente sindical (12) assegura a representação dos trabalhadores nos locais de trabalho, na forma de lei complementar (13) a negociação coletiva e o direito de greve do servidor público serão exercidos na forma da lei complementar (14) mantém a competência da Justiça do Trabalho para as ações de representação sindical (15) mantém a possibilidade do dissídio coletivo do trabalho em caso de comum acordo entre as partes em litígio (16) mantém a intervenção do Ministério Público do Trabalho em caso de greve em atividade essencial, quando poderá ser ajuizada ação coletiva.
O que é essencial na proposição oficial é a quebra do sistema da unicidade sindical e da representação unitária profissional e econômica. O sistema proposto é de reconhecimento da representação por decisão do Estado, sem definir qual o organismo competente, assim como através de requisitos que dependerão de um processo de discussão e aprovação de lei complementar. Caso a PEC venha a ser aprovada nos termos colocados, sem a necessária aprovação de lei complementar, continuarão com existência legal as atuais entidades sindicais de representação de toda a categoria profissional e econômica e a possibilidade de existência de novas entidades dependerá de decisão judicial, pois ocorrerá um vazio legal relativo à fundação da entidade na medida em que os requisitos previstos na emenda são subjetivos.
Sem lei complementar, o novo sistema sindical proposto pela PEC n.º 369/05, ensejará a confusão plena, a desfiguração do movimento sindical dos trabalhadores e seu conseqüente enfraquecimento. Ao contrário do sistema atual que é objetivo – uma só entidade sindical, em uma base territorial determinada mínima de um município, organização sindicato-federação-confederação, representação por categoria econômica e profissional – a proposta apresenta critérios abstratos de organização da entidade sindical, não delimita sua base mínima, não estabelece o sistema de organização vertical e sequer legaliza e normatiza as Centrais Sindicais, que continuam à deriva da estrutura.
Como as leis complementares devem ser analisadas e aprovadas após a aprovação da emenda constitucional, o projeto de lei do governo federal sobre a organização sindical, somente poderá ser votado depois de promulgada a alteração constitucional. Até lá ele é inconstitucional.
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Eis a íntegra da proposta do governo federal em debate na Câmara dos Deputados:
PROJETO DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N.º 369/2005
Dá nova redação aos artigos 8.º, 11, 37 e 114 da Constituição.
Art. 1.º Os arts. 8.º, 11, 37 e 114 da Constituição passam a vigorar com a seguinte redação:
?Art. 8.º É assegurada a liberdade sindical, observado o seguinte:
I – o Estado não poderá exigir autorização para fundação de entidade sindical, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção nas entidades sindicais;
II – o Estado atribuirá personalidade sindical às entidades que, na forma da lei, atenderem a requisitos de representatividade, de participação democrática dos representados e de agregação que assegurem a compatibilidade de representação em todos os níveis e âmbitos da negociação coletiva;
III – às entidades sindicais cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais do âmbito da representação, inclusive em questões judiciais e administrativas;
IV – a lei estabelecerá o limite da contribuição em favor das entidades sindicais que será custeada por todos os abrangidos pela negociação coletiva, cabendo à assembléia geral fixar seu percentual, cujo desconto, em se tratando de entidade sindical de trabalhadores, será efetivado em folha de pagamento;
V – a contribuição associativa dos filiados à entidade sindical será descontada em folha de pagamento;
VI – ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;
VII – é obrigatória a participação das entidades sindicais na negociação coletiva;
VIII – o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais; e
IX – é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.
Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de entidades sindicais rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.? (NR)
?Art. 11. É assegurada a representação dos trabalhadores nos locais de trabalho, na forma da lei.? (NR)
?Art. 37 – VII – a negociação coletiva e o direito de greve serão exercidos nos termos e nos limites definidos em lei específica;
?Art. 114 – III – as ações sobre representação sindical, entre entidades sindicais, entre entidades sindicais e trabalhadores, e entre entidades sindicais e empregadores;
§ 2.º Recusando-se qualquer das partes à arbitragem voluntária, faculta-se a elas, de comum acordo, na forma da lei, ajuizar ação normativa, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.
§ 3.º Em caso de greve em atividade essencial, o Ministério Público do Trabalho tem legitimidade para ajuizamento de ação coletiva quando não forem assegurados os serviços mínimos à comunidade ou assim exigir o interesse público ou a defesa da ordem jurídica.? (NR)
Art. 2.º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.
Edésio Passos é advogado e ex-deputado federal (PT/PR).