Brasileiros têm dificuldades para deixar o Oriente Médio

Vera El Harati, brasileira de 64 anos, moradora do bairro São Miguel Paulista na zona leste de São Paulo há mais de três décadas, custa a acreditar na reviravolta que sua vida deu nos últimos quatro dias. Como faz quase todos os anos, Vera veio passar as férias de julho no Líbano, terra natal do marido já morto. Chegou em 17 de junho a Kab-Elias, no Vale do Bekaa, a uma hora de Beirute. Trouxe com ela a nora e quatro netos (10 anos, 6 anos, 2 anos e o mais novo de apenas 7 meses). Foram para o apartamento da família, comprado em 1995, depois do final da guerra civil

Por quase um mês, tudo correu como sempre: passeios pela costa, visitas a parentes, descanso e a chegada da filha e do genro, ambos médicos, em 11 de julho, terça-feira da semana passada. Agora, Vera e seus sete parentes são parte dos cerca de cem brasileiros que escaparam do Líbano para Damasco, a capital síria. Nervosa, ela não poupa o governo brasileiro

"Até o Sri Lanka já tirou seus cidadãos daqui e a gente ainda não sabe se e quando vão enviar um avião para nos salvar.

Voltar para o Líbano não está nos planos. Primeiro porque as pontes estão todas destruídas e as bombas ainda não pararam de cair. Segundo porque, desde que o aeroporto de Beirute foi bombardeado, nenhum avião sai, nenhum avião pousa

Em Damasco, a embaixada brasileira faz o que pode. Cadastra os nomes dos que chegam e acha vagas em hotéis, o que não é pouca coisa (a cidade está cheia de turistas que deixaram o Líbano e libaneses). Vera não tem esperança de sair num avião de linha daqui de Damasco. Os vôos estão todos lotados, e as empresas não se mostram dispostas a honrar as passagens com volta marcada por Beirute

Esperar tampouco parece uma alternativa. À medida que os dias passam, o dinheiro vai diminuindo e o desespero, aumentando. "Será que o governo brasileiro sabe o que a gente está passando e o que nos espera?", perguntou, acreditando que o próximo alvo israelense será justamente a Síria

A família decidiu sair de Kab-Elias no domingo depois de uma série de bombardeios israelenses que durou das 10 da noite até as 4 da madrugada de segunda. "Minha neta acordou dizendo: ‘Vovó estão atirando bombas lá fora’. E eu tive que mentir. Disse que era uma festa de São João. Ninguém está vendo que estão matando de forma indiscriminada?", questionou, indignada

Ahmad El-Kadri, de 55 anos, morador do bairro de Vila Mariana, em São Paulo, nasceu no Líbano e foi para o Brasil quando não fazia muito tinha saído das fraldas. Cresceu, estudou, batalhou, acabou a faculdade, seguiu carreira e montou a vida toda em São Paulo. Este ano, pela primeira vez, Kadri decidiu visitar a terra natal. Chegou em 12 de julho a Beirute e seguiu para El-Biri, a duas horas da capital libanesa. "É pé-frio. No dia seguinte, começou o conflito", disse

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