A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, abriu hoje a Semana da Água 2005, em Brasília, tratando de uma decisão que vai penalizar o contribuinte brasileiro. Resolução aprovada pelo Conselho Nacional da Recursos Hídricos (CNRH) – que deverá entrar em vigor em uma semana – define as regras para a cobrança da taxa condominial que será aplicada aos usuários de água doce de todas as bacias hidrográficas do País.
Em 20 anos o volume de recursos arrecadado deverá atingir a cifra de R$ 40 bilhões, mais de 80 vezes o orçamento de R$ 390 milhões do Ministério do Meio Ambiente previsto para 2005. O dinheiro, segundo critério estabelecido na resolução, deverá ser aplicado na recuperação ambiental das bacias hidrográficas – basicamente em saneamento.
A medida terá impacto nos gastos de indústrias, empresas e no bolso do usuário doméstico. Com a nova taxa serão cobrados, em média, cerca de dois centavos de real por metro cúbico de água consumida ou, segundo o cálculo admitido pelo CNRH, 2% a mais na conta de água de cada consumidor brasileiro. As despesas mais significativas recairão, no entanto, sobre a indústria e empresas, especialmente aquelas ligadas à agricultura, que fazem irrigação em grande escala e são consideradas as vilãs do consumo e dos danos ao meio ambiente. Os critérios de taxação serão definidos pelos comitês de cada região.
"Nossa previsão é de que entre 10 a 15 anos a cobrança possa estar funcionando em escala nacional", diz o presidente da Câmara Técnica de Cobrança pelo Uso de Água, Décio Michellis Júnior, que representa o setor elétrico no CNRH. O parâmetro internacional, segundo ele, é a França, que levou 30 anos para consolidar a cobrança nacional sobre o setor e hoje arrecada anualmente algo em torno de US$ 2,5 bilhões pelo uso de água – dinheiro devolvido na recuperação do meio ambiente e recursos hídricos de suas bacias.
No Brasil a única experiência em andamento é o comitê da Bacia do Paraíba do Sul, que funciona há dois anos como piloto, e arrecadou R$ 10 milhões em 2004. Com a resolução aprovada hoje as normas aplicadas atualmente por esse comitê poderão ser alteradas. Nos próximos dois anos a arrecadação deverá, no mínimo, triplicar, dependendo do ritmo adotado pelos comitês nas negociações que serão feitas com os órgãos estaduais, municipais e setores que serão taxados.
Marina
Ao discursar hoje na abertura da reunião do CNRH, a ministra Marina Silva afirmou que já há negociações fechadas com todas as áreas do governo federal para que os recursos não sejam contingenciados e retornem integralmente para a recuperação e prevenção de danos ao meio ambiente. "É uma conquista", garantiu a ministra.
Michellis Júnior acha que o governo não deve tentar abocanhar parte dos recursos para produzir superávit. O único risco, segundo avalia, é a redução dos porcentuais de recursos arrecadados do setor elétrico destinados atualmente às bacias hidrográficas.
Estabelecido pela Constituinte de 1988, mas aplicada nacionalmente a partir dos últimos cinco anos, a taxa compulsória cobrada do setor elétrico pelo uso das águas será responsável pela arrecadação de R$ 1,2 bilhão em 2005, dos quais apenas 12% deverão retornar para a Agência Nacional das Águas aplicar no sistema. Com exceção dos Estados e Municípios – que recebem 6,75% sobre o volume de energia gerada em cada região e podem usar livremente os recursos – o restante do dinheiro permanecerá nos cofres do governo federal.
Todo o volume a ser arrecadado como taxa pelo uso da água terá de passar pelo Tesouro Nacional. "É aí que mora o perigo", diz Michellis Júnior, ao se referir a uma eventual tentativa de desvio dos recursos para outras áreas do governo – como já ocorreu, por exemplo, com a CPMF, o imposto do cheque. "Caso o dinheiro não retorne, a resposta dos comitês das bacias hidrográficas pode ser a suspensão da cobrança", afirma.
A aprovação da resolução foi comemorada no CNRH como o principal instrumento para ampliar a política de recuperação do meio ambiente. Mas o tema é complexo e deverá envolver Estados e Municípios numa discussão que pode se tornar interminável. A assembléia Legislativa de São Paulo discute há dez anos a lei de cobrança e ainda não chegou a conclusão.