Às vésperas de completar um ano do estado de emergência em saúde pública no Brasil declarado por causa da microcefalia, o diretor do Instituto Evandro Chagas, Pedro Vasconcelos, não hesita em afirmar: o zika, vírus associado ao aumento de casos da má-formação, trouxe várias lições para cientistas. “Não se pode desprezar nenhum agente infeccioso, mesmo aqueles que à primeira vista são considerados inofensivos.” Esse, completa Vasconcelos, foi o erro cometido com zika no Brasil e no mundo.
Descoberto na década de 40, o zika nunca despertou interesse de pesquisadores. “Até o início de 2015, ele era considerado um vírus de segunda categoria. Ele era pouco estudado, porque se imaginava que seria de pouco interesse para saúde pública.”
O baque, no entanto, não se resumiu ao fato de ele ser muito mais nocivo do que se pensava no início. “O zika rompeu um padrão. Ele representa uma revolução em termos de arbovírus. Até então, acreditávamos que esses agentes eram transmitidos pela picada de artrópodes infectados.” O zika veio mostrar que essa ideia era limitada e incorreta. Comprovou-se que ele pode ser transmitido por via sexual, transfusão de sangue. “E ele pode causar doença grave. Tanto na sua forma congênita quanto para pacientes infectados que já apresentam, por exemplo, falhas no sistema imunológico”, explica Vasconcelos.
Em virtude do alcance do vírus, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou, em fevereiro, estado de emergência internacional em saúde pública. Vasconcelos defende que esse status seja mantido.
Estratégias
A equipe de Vasconcelos trabalha em várias frentes. Um dos braços considerados mais promissores é o que se dedica ao desenvolvimento de uma vacina, em parceria com a Universidade do Texas. Os resultados obtidos até agora são animadores. Nos próximos dias, a vacina será testada em primatas, em áreas controladas.
A vacina é desenvolvida com base em um vírus vivo enfraquecido. Por meio do uso de engenharia genética, pesquisadores procuram manter a capacidade do vírus de infectar células, sem, no entanto, que ele possa desenvolver a doença.
O diretor do Instituto Evandro Chagas avalia que há muito ainda que se descobrir sobre o zika. “Ele era praticamente desconhecido. Hoje temos algumas pistas. Mas é preciso muito mais”, disse. Uma das hipóteses que necessitam ser avaliadas ainda é o fato de a microcefalia não atingir todos os bebês cujas mães são infectadas pelo zika. “Há uma corrente que arrisca haver um papel protetor da vacina de febre amarela. Isso poderia explicar, por exemplo, o fato de que as regiões onde a microcefalia ocorreu de forma mais intensa no ano passado coincidir com áreas onde a vacina não é aplicada de forma rotineira. Mas são apenas suposições.”
Vasconcelos reconhece que, a partir da agora, os brasileiros começam a perder o protagonismo nas descobertas. Ele atribui essa mudança ao investimento realizado em outros países. “Nossa contribuição foi significativa. Mas há uma tendência de que outros centros passem a apresentar estudos.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.