Na porta da sala de embarque do Aeroporto de Guarulhos, Erika Kanamaru, de 31 anos, e Antonio Albejunior, de 33, se despedem da família. Querem reconstruir a vida a 17 mil quilômetros do Brasil. O casal faz parte de uma nova onda de brasileiros descendentes de japoneses que cruzam o mundo atrás de oportunidades no país asiático. Em comum, eles fogem da crise no Brasil e também flertam com a qualidade de vida e a segurança japonesas.

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Dados do Ministério das Relações Exteriores do Japão, compilados pelo Consulado Geral do Japão em São Paulo, mostram que, de 2014 a 2016, o número de vistos emitidos para descendentes e seus cônjuges cresceu 145%. Em 2016, último dado disponível, foram 11,5 mil emissões. “Em termos gerais, descendentes de japoneses que pretendem permanecer no Japão a trabalho foram influenciados pela conjuntura econômica”, informou o consulado.

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Até agora, o visto que permite trabalho no Japão só é dado aos filhos e netos de japoneses e seus companheiros e dependentes. A partir de julho deste ano, porém, o país deverá permitir a entrada de descendentes da quarta geração, os bisnetos ou yonseis, desde que sejam atendidos alguns critérios, entre eles o domínio básico do idioma. A nova permissão mobiliza jovens a estudarem japonês e pode aumentar ainda mais o fluxo (leia mais nesta página).

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Albejunior sabe pouco mais do que o “sayonara” e o “arigato”, mas decidiu se aventurar com a mulher, neta de japoneses, depois que ambos foram demitidos. Formado em Ciências Contábeis, já viajou com trabalho garantido: será operário em uma fábrica de componentes eletrônicos na cidade de Komatsu. Para ele, apesar de desgastante, o regime de trabalho de oito horas diárias mais três horas extras obrigatórias compensa. “Para quem quiser e tiver vontade de trabalhar, não falta emprego no Japão”, diz ele, que receberá US$ 13 (R$ 48,60) por hora.

Agências que fazem a ponte entre descendentes de japoneses e oportunidades no Japão confirmam aumento do interesse de brasileiros pelo país nos últimos anos. O crescimento ocorre após retorno em massa ao Brasil por causa da crise econômica mundial, em 2008. “O mercado japonês deu uma aquecida. A Olimpíada será no Japão, e isso também pode ter causado um aumento da procura”, diz Eduardo Toyama, diretor comercial da agência TGK RH.

Segundo Toyama, fábricas de eletrônicos, autopeças e alimentos são as que mais empregam os brasileiros. Mas, se no início do movimento dos decasséguis, na década de 1990, o motivo da viagem era apenas trabalho, nessa nova onda de migração outros fatores têm pesado. “Muitas pessoas estão correndo daqui também por causa da segurança”, diz Vanessa Matsui, gerente da Ikou Japan, outra agência que presta consultoria para esse tipo de viagem.

Liberdade

Sossego é o que procura Kátia Sakai, de 37 anos. Brasileira e neta de japoneses, Kátia morou no Japão durante a adolescência e o início da vida adulta, teve dois filhos no país e voltou para o Brasil em 2004. Aqui, conheceu o atual marido e montou uma pequena empresa. Agora, quer fechar o negócio para começar de novo no país asiático com o marido e os filhos, hoje com 15 e 17 anos.

“Com o que fazemos aqui, se insistíssemos, conseguiríamos ganhar mais do que no Japão”, diz. Mas a corrupção e a violência desagradam. “No Japão, você anda a hora que quiser na rua, com o celular na mão. Lá, meus filhos vão ter liberdade.” A família, que pretende viajar no fim deste ano, pesquisa vagas em fábricas, organiza a documentação e quer levar até a cachorrinha. “Queremos levantar um dinheiro para montar nosso próprio negócio lá.”

Sheila Sato, de 38 anos, e o marido fizeram o mesmo movimento há dois anos, em prol das filhas. Ela largou a carreira como médica veterinária para que as meninas, de 14 anos, estudassem no Japão. “Para trabalhar aqui você não precisa ser muito inteligente – precisa ser observador. Montamos bancos de carros para uma fábrica da Toyota. Bancos bonitos, por sinal, mas bancos de carros.”

Para Angelo Ishi, professor da Faculdade de Sociologia da Universidade Musashi, em Tóquio, há mudanças na forma como o governo japonês encara a presença de brasileiros no país. Embora precise de mão de obra – a população economicamente ativa do Japão está diminuindo -,”os brasileiros não são mais ‘a bola da vez’, como no início da onda migratória”, diz.

“O custo-benefício de contratar o nikkei (descendente) brasileiro vem decaindo em comparação com o de contratar gente de outros países. A mão de obra asiática está custando menos e compensando mais”, diz Ishi.

Bisnetos

Em março, o Japão anunciou a liberação de vistos para descendentes da quarta geração – os bisnetos – que desejam trabalhar no país. A medida entrará em vigor a partir de julho, mas impõe condições: os pretendentes devem ter entre 18 e 30 anos, domínio básico do idioma (a compreensão de cerca de 1,5 mil palavras) e não poderão ir acompanhados de parentes.

O tempo de permanência será de até um ano, com possibilidade de renovação para cinco. E o número total de certificados, que atestam os critérios necessários para o visto, emitidos no mundo todo será de 4 mil por ano. “A quantidade poderá mudar dependendo de demanda e dos resultados”, informou Takuo Sato, cônsul do Japão em São Paulo.

De olho na possibilidade do visto, o paulista Jezreel Omido, de 27 anos, estuda uma hora por dia e faz curso para tentar decifrar o idioma. “Muitos estão lá e não sabem falar nada. (A exigência) é uma tentativa de consertar esse ‘gap'”, diz o jovem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.