Belém ? O juiz Ronaldo Valle ameaçou decretar a prisão preventiva da suposta vidente Valentina de Andrade, de 73 anos, líder da seita Lineamento Universal Superior (LUS) e uma das principais acusadas de tortura, castração e morte de cinco meninos de Altamira, no Sudoeste do Pará, entre 1989 e 1993. Morando em Londrina, ela não compareceu ontem pela manhã na segunda sessão do Tribunal do Júri, em Belém (PA). Ontem começou o julgamento do médico Anísio Ferreira de Souza.
A defesa conseguiu desmembrar o julgamento, fazendo com que o outro médico acusado, Césio Brandão, seja julgado no próximo dia 8 e Valentina no dia 22. Valentina, porém, deveria comparecido ontem para tomar ciência da data de seu julgamento. O médico Anísio Ferreira de Souza, um dos acusados de co-autoria nos crimes, negou participação nos crimes, afirmando que seu nome foi envolvido por “armação de adversários políticos”. Ele se disse praticamente do espiritismo e que nada tem a ver com supostos rituais de magia negra ou sacrifícios humanos. “Meu juramento ao receber o diploma de médico foi o de salvar vidas e não de tirá-las”, argumentou.
Anísio Souza negou também qualquer relacionamento profissional com Césio Brandão. “Só tive contato com ele uma vez, em 1992, numa carreata em Altamira para angariar votos na minha campanha de vereador”, relatou ao juiz Ronaldo Valle.
Perguntado sobre a relação com a suposta vidente, apontada no processo por testemunhas como a mulher a quem recebia em sua chácara para rituais satânicos, o médico respondeu que jamais esteve com ela em qualquer local.
Contradições
Para a promotora de Justiça Rosana Cordovil e seu assistente de acusação, Clodomir Araújo, o depoimento foi cheio de contradições, principalmente diante das provas colhidas nos autos e de outros depoimentos do acusado à Polícia e à Justiça de Altamira. “A situação dele ficou ainda mais complicada e vamos explorar essas contradições na fase final do julgamento”, adiantou Araújo.
O advogado Jânio Siqueira disse que o depoimento de seu cliente nada teve de contraditório. “Ele respondeu com firmeza às perguntas do juiz e teve bom desempenho”, avaliou, dizendo não ter dúvida de que o médico.
O julgamento deve prosseguir hoje pela manhã com os depoimentos das testemunhas de defesa e acusação. É provável que a sentença saia somente na noite de amanhã.
Até o começo da noite de ontem, Valentina não havia aparecido no Tribunal do Júri. Ela estaria “doente”, segundo o advogado Américo Leal. A Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão pediram à Polícia Federal para vigiar os passos de Valentina, impedindo uma eventual fuga do Brasil.
No PR, polícias aguardam notificação
A Polícia Civil do Paraná e a Superintendência da Polícia Federal (PF) no Estado ainda não foram notificadas oficialmente pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República para investigar o desaparecimento de crianças no Estado. O Sicride (Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas), órgão responsável pela investigação no Paraná, não prestou maiores esclarecimentos de como andam as investigações sobre os casos em que havia suspeita de envolvimento da seita Lineamento Universal Superior.
No Estado, de acordo com dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos, há quatro crianças desaparecidas, mas o Sicride mantém o acompanhamento de apenas dois casos em que Valentina é tida como suspeita de envolvimento: o desaparecimento de Leandro Bossi, que sumiu em Guaratuba há 11 anos, e Leonardo de Mello Silva, há dois anos em Umuarama.
Na Superintendência da Polícia Federal do Paraná, o delegado Ademir Gonçalves, informou que até o momento não recebeu determinação para que a PF investigasse o desaparecimento de crianças no Estado. Segundo ele, a solicitação para que a Superintendência do Paraná passe a investigar deve ser comunicada pelo diretor geral da entidade.
Investigações
As investigações sobre o desaparecimento das duas crianças (Leandro e Leonardo) nunca foram encerradas, mas também não foram encontradas provas concretas que incriminassem Valentina. Ela é apontada como a líder de uma seita de magia negra que cometia atrocidades contra crianças. Na época do sumiço de Leandro, Valentina viajou a Guaratuba onde se hospedou juntamente com seguidores da seita num hotel.
Outro caso de repercussão no Estado, o desaparecimento do menino Evandro Caetano, também em Guaratuba, não foi vinculado à ação da seita, apesar de o desaparecimento das duas crianças terem acontecido praticamente na mesma época. (CB)