Uma inspeção do Ministério Público Federal (MPF) e outras oito instituições nacionais e internacionais descobriu que a Usina de Belo Monte está funcionando sem um plano de emergência e sem que os monitoramentos semestrais exigidos pelo licenciamento ambiental sejam apresentados. O órgão deu um prazo de 24 horas para que a Norte Energia, dona da hidrelétrica, apresente o plano e os relatórios de monitoramento.
Em nota, a Norte Energia disse que avalia as questões apontadas pelo MPF e afirmou ser uma “empresa comprometida com o desenvolvimento sustentável”, que atua pautada na “responsabilidade com as pessoas, o meio ambiente e a região onde está instalada”. No entanto, não informou por que está funcionando sem um plano de emergência e sem respeitar o prazo de entrega dos relatórios de monitoramento.
Leonardo Pinho, presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão que também acompanhou a missão, diz que a usina não poderia funcionar sem o plano estar instalado e devidamente comunicado às comunidades do entorno.
“A lei determina que a barragem só poderia operar depois da apresentação do plano e deveriam ser feitas simulações anuais com a população, rotas de fuga, plano de evacuação, sirenes. Nada disso foi feito. Belo Monte está funcionando sem nenhuma previsão de contingência. Em Brumadinho, em que se perderam tantas vidas, havia tudo isso. Em Altamira, não há nada”, afirmou.
A inspeção também descobriu que a empresa vem descumprindo o envio de relatórios de monitoramento dos programas ambientais de Belo Monte. De acordo com o licenciamento, os dados deveriam ser enviados para a Funai e Ibama a cada seis meses – os últimos três nunca foram enviados. Os monitoramentos devem mostrar o impacto da barragem sobre os peixes na Volta Grande do Xingu, por exemplo.
A inspeção foi feita nesta semana e visitou 25 comunidades e percorreu um trecho de 100 km do Rio Xingu, no Pará, que teve 80% de suas águas desviadas para a produção de energia elétrica. O MPF também denuncia que estão ocorrendo violações sistemáticas de direitos humanos no local.
Segundo as entidades, a barragem da hidrelétrica estrangulou o rio, provocando a morte de peixes e prejudicando a navegabilidade dos moradores, que ficaram sem rotas para escoar produtos agrícolas. “A insegurança alimentar se tornou um fato cotidiano para todas as comunidades da Volta Grande.”
Os moradores relatam ainda falta de merenda escolar, remédios e médicos. O barramento do rio também dificulta o acesso à água potável porque seca os lençóis freáticos superficiais, o que em algumas comunidades, como a Ilha da Fazenda, beira uma situação de emergência. A Norte Energia já perfurou três poços para fornecimento de água na comunidade, uma das mais antigas da região do médio Xingu e, mesmo assim, até hoje não foi capaz de garantir o abastecimento nas casas.
“Eu passo a olhar o processo de instalação de Belo Monte como um processo genocida, um processo de expulsão das comunidades. Afirmo minha perplexidade e minha indignação com o que verificamos”, disse a procuradora da República Thais Santi, que coordenou a vistoria interinstitucional.