"Roupas provocativas??"

Uma em cada 3 pessoas no País ainda acha que vítima é culpada por estupro

Arquivo/Tribuna

Mais de um terço da população brasileira atribui à vítima a culpa por ter sofrido estupro. Pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que será divulgada nesta terça-feira, 20, mostra que 37% concordam com a frase “mulheres que se dão ao respeito não são estupradas”, porcentual que chega a 42% entre os homens, e 30% acreditam que a “mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada”.

A pesquisa, feita pelo Instituto Datafolha com 3.625 pessoas em 217 cidades de todo o País entre 1 e 5 de agosto, traz ainda outros dados considerados preocupantes por especialistas: 65% da população diz sentir medo de ser vítima de violência sexual, número que é de 90% entre as mulheres do Nordeste. O receio é maior entre os mais jovens, onde o porcentual médio é de 75%, decrescendo conforme aumenta a faixa etária.

A opinião surge em um ano em que se discutiu a chamada “cultura do estupro”, a partir do caso de um ataque coletivo contra uma adolescente no fim de maio no Rio. O resultado também contrasta com a celebração de dez anos de vigência da Lei Maria da Penha, considerada a mais relevante na luta contra a violência doméstica.

Para os pesquisadores que coordenaram o trabalho, “é bastante comum que o comportamento de quem foi vítima seja questionado com base no que se entende serem as formas corretas de ‘ser mulher’ e ‘ser homem’ no mundo”. “Este pensamento vem de um discurso socialmente construído, que considera que se a mulher é vítima de alguma agressão sexual é porque de alguma forma provocou esta situação, seja por usar roupas curtas ou andar sozinha na rua em certos locais considerados inapropriados. Com isso, há ainda a ideia do homem que não consegue controlar seus ‘instintos naturais'”, aponta a análise dos pesquisadores.

Os resultados mostram que pessoas mais novas, com menos de 60 anos, tendem a não culpar as vítimas. A pesquisa aponta que 44% dos brasileiros com 60 anos ou mais acreditam que uma mulher que use roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada. Por outro lado, a afirmação é considerada verdade por 23% dos ouvidos com idade entre 16 e 34 anos.

O nível de escolaridade é visto como um diferencial. Enquanto 47% das pessoas que cursaram o ensino fundamental acreditam que são estupradas mulheres que não se dão ao respeito, 19% daqueles que cursaram o ensino superior têm a mesma visão. Questionados se é necessário ensinar na escola meninos a não estuprar, 91% dos entrevistados responderam que sim. Os responsáveis pela pesquisa encararam a resposta como importante para notar que a educação sobre igualdade tem potencial para “alterar a cultura machista que perpetua a violência”. A concordância sobre esse ensino foi confirmada em todas as faixas etárias, níveis de escolaridade e tamanho dos municípios.

Atendimento. Segundo os estudiosos do Fórum, que reúne 172 associados entre pesquisadores da iniciativa pública e privada, além de servidores da segurança pública, o registro e a investigação de crimes como estupro envolvem dificuldades como tratamento e assistência inicial à vítima, além da necessidade de um trabalho consistente em busca de provas e testemunhas.

“Nem sempre as vítimas apresentam marcas físicas da violência ou perturbação emocional, ou têm um relato absolutamente coerente, mas isso não quer dizer que o crime não aconteceu. Levar a sério uma denúncia de estupro não significa condenar sumariamente o suspeito, mas acolher a vítima, escutá-la, dar credibilidade a seu relato e buscar, por meio de investigação, a devida elucidação do caso”, escrevem.

As dificuldades no atendimento são notadas na avaliação das polícias: 50% discordam da afirmação de que policiais militares são bem preparados para atender vítimas de violência sexual, e 42% dizem não encontrar acolhimento nas delegacias. Quanto maior a escolaridade, mais crítica é a visão. Entre a população com ensino superior, 56% disseram não acreditar que as delegacias ofereçam o acolhimento adequado.

A reportagem não conseguiu contato com o Conselho Nacional dos Comandantes-gerais das PMs e não obteve resposta dos telefonemas feitos à Associação Nacional dos Delegados.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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