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Um passeio por unidades de conservação pouco visitadas

Tem garibaldi, marreca, joão-grande, caraúna, tachã, maria-velha. E colhereiro, pica-pau do campo, noivinha, cardeal. Também tem batuíra de coleira, trinta-réis, narceja, jaçanã – mas pode chamar de cafezinho. Fora os muitos pirus-pirus e talhamares. Um sem-número de tipos de maçaricos. Além dos imponentes cisnes de pescoço preto e flamingos.

No intervalo de algumas horas de uma manhã ensolarada de primavera, a natureza abunda e os olhos ficam zonzos com tanto passarinho – ornitólogos que me perdoem o modo carinhoso de generalizar as tantas diferentes famílias de aves que se espalham por ali. E esse é só um breve extrato da riqueza do local.

No Parque Nacional da Lagoa do Peixe, entre Tavares e Mostardas, no sul do Rio Grande do Sul, já foram catalogadas 275 espécies de aves, sendo 35 migratórias, em uma estreita faixa de terra e água de 367 km2 – pouco maior que Guarulhos – entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico.

Para ver boa parte delas não é preciso ser um experiente observador de aves. A biodiversidade corre solta e muitas vezes em bandos que se destacam em meio à vegetação rasteira e a laguna rasa. Outras espécies só podem ser vistas por olhos mais treinados. Mas com um pouco de paciência e algum tipo de orientação, mesmo quem nunca se dedicou à observação de aves, como é o meu caso, se torna capaz de distinguir um maçarico branco de um sobre-branco ou de um perna-amarela.

Mas é preciso ter um 4×4. E um guia é bem-vindo, não somente para conduzir pelas quatro trilhas do parque, que alcançam também dunas e praia, quanto para explicar o que está sendo visto.

Não há cobrança de entrada nem tampouco infraestrutura. A gestão é dificultada pelo fato de o parque ainda não ter passado por regularização fundiária. À beira da laguna ainda é comum ver cavalos de proprietários de terra que permaneceram no local.

O que pouco se vê ali é gente. Assim como já tinha ocorrido alguns dias antes, no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, no norte de Minas, e poderia se observar alguns dias depois, já na Bahia, no Parque Nacional do Pau-Brasil.

Amostra

Fiz uma breve expedição pelas três unidades de conservação em novembro. Uma viagem por cenários, atrativos e biomas diferentes, com modelos de turismo e de gestão também distintos. A ideia era extrair uma pequena amostra dos 74 parques nacionais e registrar locais ainda tão pouco conhecidos pelos brasileiros, mas que ajudam a dar uma ideia do desafio de se ampliar a visitação.

Os parques estão na mira do futuro presidente, Jair Bolsonaro, que defende que eles têm de ser abertos como fórmula para preservar e promover desenvolvimento. Dos 74, somente 38 fazem registro de visitantes, que somaram 7 milhões em 2016.

O livro Quanto Vale o Verde, organizado pelo pesquisador Carlos Eduardo Young, da UFRJ, aponta que esses visitantes gastaram R$ 1,1 bilhão, mas geram quase R$ 7 bilhões em renda, valor agregado e vendas. E estima que um crescimento de 20% na visitação poderia trazer um impacto econômico entre R$ 500 milhões e R$ 1,2 bilhões de reais e geração de até 42 mil postos de trabalho.

Iniciativas diferentes vêm sendo testadas pelo Brasil. No Peruaçu, cujo maior atrativo são a geologia e a arqueologia, com suas cavernas e pinturas rupestres, trilhas bem estruturadas conduzem a cenários de tirar o fôlego, como o Janelão, e a registros dos vários povos humanos que ocuparam o local a partir de 9 mil anos atrás.

Ali, a gestão do ICMBio é apoiada pelo Instituto Ekos Brasil, uma ONG que colaborou com o plano de manejo do parque e gerenciou a construção da sede e das trilhas. Há banheiros e uma lojinha de souvenirs, mas não há lanchonetes nem restaurantes. Guias bem treinados sobre a história local podem ser contratados para conduzir os turistas pelo parque – só assim é possível visitá-lo. Mas apesar da boa estrutura, o local também ainda é pouco visitado. Neste ano, até outubro, tinha recebido cerca de 6 mil pessoas.

Concessão e supertrilhas

A última etapa da viagem foi o Pau-Brasil, em Porto Seguro (BA), onde resiste a maior população da árvore-símbolo deste País – explorada quase à exaustão no período colonial.

Criado em 1999, o parque está para ser aberto oficialmente para o grande público. Até hoje, o rico remanescente de Mata Atlântica vem sendo apreciado somente por mountain bikers. Tive a chance de caminhar, ao lado do gestor, por um parque sem mais nenhum visitante.

Lá se seguiu uma lógica de primeiro criar toda a estrutura de visitação para depois abrir as portas. O parque foi o primeiro a ser concedido para a iniciativa privada, em outubro, após o decreto de uma lei, em maio, que possibilitou a concessão de serviços para a exploração de turismo em unidades de conservação.

De lá para cá, outros também passaram por esse processo, como a Chapada dos Veadeiros. E estão previstas também as concessões dos Lençóis Maranhenses (MA), de Itatiaia (RJ), de Caparaó (MG) e da Serra da Bodoquena (MS). Até então, somente quatro parques eram concedidos – não à toa, alguns dos que mais recebem visitantes no País: Iguaçu, Tijuca, Fernando de Noronha e Serra dos Órgãos.

A ampliação das concessões se insere em um projeto iniciado há cerca de dois anos no governo federal de criar as bases para uma nova política de turismo como ferramenta de conservação, explica Pedro Menezes, coordenador de uso público do ICMBio. Outro pilar é a oferta de possibilidades de recreação, como uma rede de trilhas interligando várias unidades de conservação.

Em dois anos foram demarcadas 1.900 km de trilhas, com propostas de vários tamanhos: de 2, 7, 15 ou 28 dias para serem percorridas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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