A investigação do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que apura a conduta do desembargador Otávio Henrique de Sousa Lima identificou uma série de irregularidades que vão desde fraudes na distribuição de habeas corpus para que ele julgasse os pedidos (sempre de bandidos ligados ao crime organizado) a decisões que soltaram traficantes perigosos sem justificativas razoáveis. Pelo menos seis decisões de habeas corpus de Sousa Lima são considerados suspeitas.

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Procurado pela reportagem, Sousa Lima não respondeu aos pedidos de entrevista. O Órgão Especial do TJ – formado pelos 12 desembargadores mais antigos do tribunal e outros 12 eleitos – vai decidir sobre o afastamento do magistrado depois de ele apresentar defesa prévia.

Em despacho, o presidente do TJ-SP, desembargador Jose Renato Nalini, constatou que há graves suspeitas de que houve fraude para que o desembargador Sousa Lima fosse o responsável por analisar o habeas corpus em favor de Welinton Xavier dos Santos, o Capuava, considerado pela Secretaria de Segurança como o maior traficante de drogas do Estado.

Nalini afirmou que, no trâmite que determina qual será o desembargador que vai decidir sobre um habeas corpus, o número do caso no sistema de distribuição dos de processos foi colocado com um digito a mais. Isso fez com que o pedido fosse encaminhado a Sousa Lima, que, conforme publicou o jornal O Estado de S.Paulo, soltou Capuava por considerar “frágeis” as provas apresentadas pela polícia.

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Capuava e mais quatro homens foram presos, no fim de julho, em uma casa na zona rural de Santa Isabel, na Grande São Paulo. Lá, foram achados 1,6 tonelada de cocaína pura, 900 quilos de produtos para misturar na droga, 4 fuzis (um deles capaz de derrubar um helicóptero), uma pistola e carros com “fundo falso” para transportar a droga, que era distribuída para diversas cidades, segundo o Departamento de Narcóticos (Denarc).

Capuava foi solto no dia 5 de agosto. Os demais suspeitos permanecem presos. O traficante deu um endereço de uma casa do Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo, como local da sua residência.

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Na segunda-feira, a Justiça aceitou a denúncia do Ministério Público contra Capuava e os demais integrantes da quadrilha. A juíza responsável pelo caso aceitou os argumentos dos promotores e também decretou a prisão preventiva de Capuava. “Está muito claro na investigação de que se trata de uma quadrilha perigosa e articulada. A sociedade não pode ficar à mercê de grupos como esse”, disse o promotor Adolfo Sakamoto Lopes. Capuava não foi localizado no endereço que deu à Justiça e está foragido.

Mais casos

O presidente do TJ citou outro caso onde ocorreu “o mesmo procedimento”: por um erro de digitação, Sousa Lima foi escolhido para julgar um habeas corpus de um traficante preso com mais de 600 quilos de maconha. O homem foi solto porque não haveria “provas suficientes” nas considerações do magistrado.

Nalini afirmou que os despachos do colega “são desprovidas de um mínimo de fundamentação”. O funcionário que supostamente errou a digitação foi identificado. Paulo Roberto Fogaça disse a Nalini que devia ter se equivocado na hora de digitar, o que fez com que o caso fosse parar nas mãos do desembargador Sousa Lima. Para Nalini, a “extrema coincidência” dos dois casos “reclama uma investigação aprofundada”.

Em outro caso de abril de 2012, em um plantão do Judiciário, Sousa Lima mandou soltar Francisco Aurílio da Silva Melo. Segundo a polícia, ele é suspeito de ser integrante do Primeiro Comando da Capital (PCC) e havia sido preso com outro comparsa, que guardava uma pistola, na frente do 69.º Distrito Policial (Teotônio Vilela), onde o atual diretor do Denarc, Ruy Ferraz Fontes, trabalhava.

Na casa de Melo, foram localizados um fuzil, três carregadores e outra pistola. Na decisão do mérito do habeas corpus, os outros desembargadores mandaram prender Melo.

Nalini aponta que, nos seis habeas corpus suspeitos de irregularidades, Sousa Lima usou a mesma justificativa, escrita de forma idêntica nas decisões, para soltar os bandidos. “Ademais seria um paradoxo conceder ao agente que respondeu a todo o processo preso o direito à liberdade para que pudesse instrumentalizar o seu recurso.”

Nalini determinou que toda prova seja anexada à investigação. A medida é “para fins de investigar as condutas atribuídas ao excelentíssimo Senhor Desembargador”. Uma cópia da portaria de Nalini foi encaminhada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e à Corregedoria Nacional de Justiça. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.