Testemunha identifica assassino da missionária

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Missa celebrada em frente ao
STF em homenagem a Stang.

Anapu – A testemunha ocular do assassinato da missionária Dorothy Stang, cuja identidade está sob sigilo, identificou, ontem, Rayfran das Neves Sales como o executor do crime no último sábado. O reconhecimento do assassino se deu por meio de fotografias. O promotor de Justiça Sávio Brabo de Araújo, do Grupo Especial de Prevenção e Repressão às Organizações Criminosas do estado, deu detalhes do reconhecimento que aconteceu em Anapu (PA). Segundo ele, a testemunha fez a identificação desde a primeira vez em que viu a foto e não titubeou. ?A testemunha estava tranqüila, serena e muito segura da identificação?, afirmou.

Para o delegado Valdir Freire, um dos comandantes das investigações do assassinato, os próximos passos da operação estão ligados à captura dos suspeitos. Na quinta-feira, a Polícia Federal reconheceu que trabalha com a hipótese de que os quatro suspeitos de envolvimento no assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang ainda estejam na região de Anapu, interior do Pará, escondidos na selva.

Quanto à morte dos outros dois agricultores, não existem elementos e nem suspeitos para nenhuma conclusão sobre a solução do caso. ?Nada vai ser elucidado enquanto não for concluído o inquérito?, disse o delegado, ao fazer um balanço das investigações. ?Com sete dias para pegar três crimes já está até muito adiantado.? O delegado comemora a chegada do Exército no município. ?Isto deve colaborar com o inquérito, porque muitas testemunhas dos conflitos fugiram de Anapu com medo das mortes e devem voltar com a sensação proporcionada pelas tropas militares.?

Cerca de 300 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e de sindicatos de trabalhadores rurais, invadiram ontem a Fazenda Reunidas, a 35 km de Mãe do Rio, perto da estrada Belém-Brasília, no leste do Pará. Com foices, enxadas e gritando palavras de ordem contra os governos federal e estadual, a quem acusam de promover o caos fundiário no estado, os lavradores afirmam que a fazenda de 4 mil hectares foi ?grilada? do patrimônio paraense. Os sem terra rebatizaram a fazenda com o nome de Irmã Dorothy, em homenagem à missionária assassinada no sábado passado por pistoleiros em Anapu. Após a invasão, eles rezaram e beijaram o solo, gritando o nome de Dorothy. No momento da invasão, apenas quatro empregados estavam no local. A sede da fazenda não foi ocupada, ?por enquanto?, informaram os sem terra Paulo Edson Ferreira e Antonio Arlindo. Eles disseram que as famílias já começaram a montar barracas de lona e devem começar o plantio de feijão, arroz e milho nos próximos dias. ?Essas fazendas aqui da Belém-Brasília são todas griladas e um dos principais grileiros é o Jader Barbalho, que usou seu poder de governador para transferir os títulos da terra para o seu nome?, acusou Ferreira.

Fazendas com registros falsos

Mãe do Rio – Nos municípios de Mãe do Rio, Ipixuna, São Miguel do Guamá e Paragominas, garantiu o agricultor Paulo Edson Ferreira, há muitas terras com documentação falsa registrada no Instituto de Terras do Pará (Iterpa), órgão fundiário estadual. As fraudes nesses registros teriam sido feitas por interferência de políticos que nos últimos 20 anos também se tornaram proprietários de terras na região. O Iterpa nega que existam em seus arquivos documentação irregular sobre registros de imóveis na região da Belém-Brasília. Os sem terra que ocupam a fazenda contaram que a área está abandonada. Há muito capim alto na propriedade, o que demonstraria falta de uso do solo. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) informou que há muitos registros falsos de terras no leste paraense. O cartório de São Miguel do Guamá, onde as escrituras dos imóveis eram lavradas, foi criminosamente incendiado há dez anos. Os grileiros se aproveitaram da situação para forjar mapas e documentos que acabaram sendo registrados em cartórios de outras comarcas, aumentando em até dez vezes o tamanho das fazendas.

MP e Incra podem atuar juntos em Anapu

Altamira – Uma ação conjunta do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do Ministério Público Federal é o que propõe o procurador da República Felício Pontes Jr para solucionar o problema fundiário em Anapu (PA), onde foi morta a freira Dorothy Stang, no último sábado. ?O principal é tirar os grileiros da área. Depois, o MPF entrará com uma petição na Justiça para que o Incra não faça o pagamento aos supostos proprietários, alegando que eles apresentam documentação falsa?, afirmou o procurador. Pontes Jr explica que os supostos proprietários de terra na região de Anapu utilizam-se de documentos relacionados aos chamados Contratos de Licitação de Terras Públicas, que foram estabelecidos no início dos anos 70, durante a ditadura militar. Segundo a Comissão Pastoral da Terra em Anapu, as terras desapropriadas às margens da Transamazônica foram loteadas de duas maneiras. Áreas de 100 hectares foram doadas a colonos vindos do Nordeste, e outras, de 3 mil hectares, foram licitadas pelo governo. Os empresários que adquiriram esses títulos recebiam financiamento público e tinham cinco anos para colonizar a área, ou perdiam o direito de explorá-la. ?Lamentavelmente, há cartórios que ainda reconhecem esses documentos para emitir um título de propriedade, e juízes que aceitam isso?.

Ação do governo no Pará foi antecipada pelos fatos

São Paulo – As medidas anunciadas na quinta-feira pelo governo federal, de bloqueio de 8,2 milhões de hectares no Pará, integravam um plano de preservação ambiental da região, que seria anunciado dia 21, disse ontem a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu antecipar a divulgação após o assassinato da missionária Dorothy Stang e outros líderes rurais nos últimos seis dias. ?Ninguém consegue criar um programa como esse em uma semana?, acrescentou, ao recusar a análise de que o bloqueio das terras havia sido feito a toque de caixa. ?O governo tem ações fortes em fase de implementação e que estão sendo reforçadas em memória da irmã Dorothy?, disse a ministra, após assinar convênio de parceria técnica entre seu ministério e a Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), em São Paulo.

Segundo Marina, a missionária tinha consciência de que os programas adotados pelo governo federal de preservação da área estavam em fase de implementação, a ponto de a própria irmã Dorothy estar orientando a população local buscar créditos federais do Programa de Desenvolvimento Sustentável (PDS) do local, quando foi assassinada. ?Só se reage àquilo que está sendo feito?, disse a ministra. Ela defendeu os projetos tocados pelo governo na região. Marina Silva admitiu que as áreas de preservação, bloqueadas pelo governo para análise nos próximos seis meses, estão distantes do local do assassinato, mas insistiu que o projeto do governo tem condições de conter a violência na região e que tais programas não sofreram ?nenhum retrocesso?. As medidas, argumentou, garantirão a preservação ambiental do entorno da rodovia BR-163 e da floresta amazônica, via criação de reservas extrativistas e de parques nacionais na região, além da Estação Ecológica da Terra do Meio e da demarcação de áreas indígenas.

A ministra garantiu que o governo federal tem condições de fiscalizar a região, pois o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) abrirá concurso público para a contratação de 900 fiscais, que vão se somar aos 800 contratados no governo Fernando Henrique Cardoso.

Também assegurou ser possível combater as ações de madeireiros e grileiros no estado. ?Há três meses, dentro das reservas, cancelamos nove planos de manejo e estamos confiscando equipamentos das madeireiras. Antes, só aplicavam multas e as madeireiras voltavam, numa lógica de que o crime valia a pena. Agora, além de aplicar a multa, confiscamos os equipamentos, que são muito caros?, explicou.

Exército auxilia nas buscas por pistoleiros

Anapu – Além dos conflitos de terras, há também quadrilhas organizadas atuando na região da Terra do Meio (PA), disse o general Jairo Cesar Nass, comandante da Operação Pacajá, que procura os assassinos da irmã Dorothy Stang e faz o desarmamento na área central do Pará. Essas quadrilhas, disse, têm o hábito de resolver seus problemas mediante intimidação e assassinatos, criando dificuldades para a segurança pública na região. As quadrilhas estariam envolvidas com corte ilegal de madeira, garimpo, queimadas e outras agressões ao meio ambiente. Nass disse que se trata de uma região de potencial explosivo e que o Exército dará todo suporte necessário às ações da polícias Federal, Civil e Militar para desmantelar essas quadrilhas. O general informou que cerca de 700 homens do Exército já estão em operações na região e, nos próximos dias, com a chegada de novos contingentes, se completará o total de aproximadamente 3.000 homens da Força, que atuarão em oito municípios. Ele admitiu que o ambiente de trabalho é adverso, envolvendo grandes dificuldades de deslocamento, mas argumentou: ?Nossa missão é minimizar essa dificuldade. Nosso esforço será direcionado para que os órgãos policiais, o Ibama e o Incra tenham plenas condições de realizar seu trabalho?.

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