Testemunha da morte de médico estava ‘indecisa’ ao reconhecer 1º menor

Um dia depois de ter apontado em um álbum de fotos com vários possíveis suspeitos quem teria sido o autor do crime que matou o médico Jaime Gold, de 56 anos, a única testemunha ocular do esfaqueamento, um frentista de 28 anos, admitiu, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que “estava meio indeciso em dizer quem era quem” ao reconhecer, para investigadores da Delegacia de Homicídios (DH), o adolescente de 16 anos, o primeiro a ser apreendido pela delegada Patrícia Aguiar neste caso.

Foi a partir desse reconhecimento que a Polícia Civil foi até Manguinhos, comunidade da zona norte do Rio de Janeiro, para prender o primeiro adolescente. O frentista teria confirmado de que se tratava mesmo deste suspeito depois de ter visto uma foto do jovem depois de apreendido. De acordo com a delegada responsável pelo caso, ele foi “categórico”. Na última quarta-feira, 27, ela deu o caso como “encerrado”.

Na madrugada desta terça-feira, 2, um jovem de 15 anos compareceu, à pedido da família, à 25ª Delegacia de Polícia (Engenho Novo) e confessou participação no crime. Ele também inocentou o primeiro suspeito apreendido. No mesmo dia, ele foi ouvido no Fórum de Olaria, na zona norte, pelo promotor Renato Lisboa.

Para a reportagem, o frentista que reconheceu o menino contou que havia comparecido à DH e lhe haviam sido apresentadas fotos de vários garotos parecidos. “Me mostraram várias fotos e eu reconheci um”, disse, no dia 21 de maio. No entanto, admitiu que a ação foi “muito rápida”.

“Eles me mostraram inúmeras (fotos), mas como são vários e são muito parecidos, eu fiquei até assim, meio indeciso em dizer quem era quem. O fato aconteceu muito rápido, muito rápido mesmo. Eles agiram muito rápido”, afirmou.

Nesta ocasião, ele disse que os adolescentes que cometeram o crime eram dois: um pardo e um negro, “muito franzinos” e com corte de cabelo igual. Os dois suspeitos apreendidos inicialmente pela DH, entretanto, são negros. Já em seu primeiro depoimento à DH, a testemunha disse que um dos jovens era negro e outro, branco.

De acordo com o delegado adjunto da Divisão de Homicídios, Giniton Lages, a DH vai pedir à Justiça que os três jovens passem por uma acareação. Segundo o delegado, o Ministério Público já representou à Justiça pela internação desse terceiro adolescente.

O outro adolescente de 15 anos que confessou participação no caso e foi apreendido no último dia 27 disse que o de 16 anos não só participou do assalto como teria dado as facadas que mataram o médico.

Enquanto isso, o primeiro apreendido, de 16 anos, continua em uma unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). “A gente acreditava na inocência dele desde o início. Seria provado de qualquer maneira, uma vez que ha inúmeras testemunhas”, afirmou o advogado de defesa dele, Alberto Oliveira Júnior, que pretende tentar um habeas corpus em favor do jovem nesta quarta-feira.

Caso seja inocentado, a defesa quer cobrar uma indenização do Estado pela apreensão indevida do jovem.

Reconhecimento precário

Na ocasião da apreensão do primeiro adolescente, especialistas em direito criminal ouvidos pela reportagem afirmaram que o reconhecimento por foto, e não pessoalmente, é mais fraca e pode ser mais facilmente influenciável por “emoções”.

“Decididamente não é o ideal, infelizmente é como funciona nessa fase de inquérito policial. Mas é muito falho, porque as fotografias muitas vezes não são de boa qualidade, não são coloridas, muitas vezes o sujeito pode estar com o cabelo maior ou menos”, afirmou o professor de direito da Fundação Getúlio Vargas no Rio (FGV-Rio) Thiago Bottino.

De acordo com o presidente da Comissão de Segurança da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio (OAB-RJ), Breno Melaragno, o fato de uma só testemunha ser ouvida também faz com que a conclusão da Polícia Civil possa ser questionada facilmente pela defesa.

“A lei processual penal não exige um número mínimo de testemunhas, mas o juiz vai avaliar essa prova. Não é o ideal apenas uma única testemunha. Você tem muitos estudos forenses que demonstram o alto índice de engano que as pessoas cometem em relação a reconhecimento, e os juízes sabem disso.”

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