José Cruz / ABr |
Com a decisão do STF, que considerou |
Brasília (AE) – O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou ontem inconstitucional a regra da cláusula de barreira ou desempenho. A partir de 2007, a cláusula de barreira limitaria o funcionamento parlamentar dos partidos pequenos, que não obtiveram um percentual mínimo de votos na eleição passada. Com a decisão do STF, todas as legendas (pequenas, médias e grandes) terão os mesmos direitos das últimas eleições.
O STF concluiu que era inconstitucional dar tratamento diferente para siglas diminutas e grandes. Com a cláusula de desempenho, as agremiações pequenas não teriam direito a pleno funcionamento parlamentar. Mas, como a norma caiu, os partidos, pequenos, médios e grandes, continuam a ter os mesmos direitos.
Todos os ministros do Supremo Tribunal seguiram o voto do relator, ministro Marco Aurélio Mello, que reconheceu o direito das minorias. No voto, Mello observou que as legendas do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B), e do vice-presidente reeleito da República, José Alencar (PRB), não conseguiram atingir a cláusula na eleição de outubro.
?Estamos tentando construir uma sociedade inclusiva. Essa cláusula já peca pelo nome. Não gosto da expressão. O nome já não é bom?, afirmou a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha.
O ministro Carlos Ayres Britto observou que a Constituição Federal assegura a igualdade entre as siglas. ?O funcionamento parlamentar é um direito?, afirmou. ?A nossa (cláusula de barreira) condena a morte por inanição?, afirmou o decano do STF, ministro Sepúlveda Pertence. ?Mais do que uma cláusula de barreira, a nossa é uma cláusula de caveira?, respondeu Britto. ?É como retirar do enfermo os tubos que o mantêm vivo?, acrescentou Mello.
O ministro Cezar Peluso observou que a cláusula poderia levar agremiações a se fundirem em alguns casos a outros partidos com os quais não têm nenhuma identificação. O ministro Celso de Mello disse que a barreira obstruía o acesso das minorias.
Dispositivo
Esse dispositivo que criou a cláusula de barreira ou desempenho estava previsto na Lei 9.096, de 1995. Ela previa que teriam direito a funcionamento parlamentar as siglas que elegeram um percentual mínimo de deputados. Na eleição para a Câmara, as agremiações deveriam obter pelo menos 5% dos votos para deputado federal em todo o País e 2% dos votos para deputado em pelo menos nove unidades da Federação.
Pela cláusula de barreira, os partidos que não atingiram esse desempenho na última eleição teriam uma pequena fatia do Fundo Partidário e direito a pouco tempo na publicidade partidária gratuita de rádio e televisão. Mas o Supremo entendeu que deve prevalecer a regra que vigorou nas últimas eleições – no caso do fundo, 29% devem ficar com as legendas grandes e o restante deve ser rateado entre todos. No caso da publicidade partidária gratuita, as siglas pequenas devem ter dez minutos e as grandes, 20.
?Não é aceitável, sob o ângulo da razoabilidade, tal equação, dividindo sete partidos o grande bolo de 99% do que vier a ser arrecadado para o fundo partidário e os 29 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), inclusive esses sete, 1%?, afirmou Aurélio Mello, ao comentar a regra de distribuição do fundo partidário que vigorava com a cláusula de barreira e que foi derrubada pelo tribunal.
?O mesmo enfoque é dado verificar em termos de horário reservado à propaganda partidária. Os sete partidos que conseguiram atender aos requisitos legais terão, por semestre, cada qual, 20 minutos em rede nacional e 20 minutos em rede estadual bem como inserções nas duas cadeias, a totalizarem, em relação a cada uma, por semestre, 40 minutos. Já os 22 partidos de representação menor, aquém das rigorosas exigências legais, terão, cada qual, 2 minutos por semestre e unicamente em rede nacional, não contando com o tempo para inserções?, ressaltou.
Aurélio Mello disse que o enxugamento dos partidos políticos é automático e decorrente da vontade dos eleitores. O ministro também baseou o voto no direito das minorias e na igualdade entre os partidos.
Após a conclusão do julgamento, alguns presentes no plenário do tribunal bateram palmas. Além de advogados, estudantes e jornalistas, estavam no órgão parlamentares de partidos pequenos, como o PSOL e o PCdoB. Um deles era a presidente nacional do PSOL e líder da legenda no Senado, Heloisa Helena (AL), que quebrou o protocolo ao entrar no STF vestida com calça jeans e camisa branca. As mulheres que freqüentam o Supremo somente podem entrar no plenário de vestido, saia e blusa ou terninho.
Partidos pequenos comemoram decisão
Brasília (AE) – Os partidos que não conseguiram 5% dos votos e pelo menos 2% em nove estados na eleição parlamentar de outubro e que, por isso mesmo, foram pegos pela cláusula de barreira, comemoraram a derrubada da exigência pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Para essas legendas, a democracia saiu fortalecida e as siglas, também.
O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), cujo partido encabeçou a ação de declaração de inconstitucionalidade (Adin) que derrubou a cláusula no STF, afirmou que liberdade política é igual a religiosa e de imprensa. ?Por convicção, creio que liberdade política é como liberdade de religião e de imprensa. Quanto mais ampla, mais profunda, duradoura e equilibrada, melhor para a democracia.? Rebelo disse que a Câmara funcionará melhor sem cláusula porque todos os parlamentares poderão ocupar as comissões. ?Isso é o que sempre ocorreu e vai continuar ocorrendo. Os deputados são obrigados a participar das comissões.?
A barreira prevista na Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/95) para entrar em vigor em fevereiro proibia que congressistas de agremiações que não tivessem alcançado 5% dos votos no País e pelo menos 2% em nove estados ocupassem cargo de líder e tivessem espaço nas comissões parlamentares de inquérito (CPIs) e outras comissões. Permitia que rateassem entre si apenas 1% do Fundo Partidário, o que daria cerca de R$ 80 mil por ano para cada um, além de só lhes conceder dois minutos de publicidade partidária gratuita por semestre no rádio e na TV.
Para o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), cujo partido só elegeu três deputados, a situação agora é bem mais confortável. ?Ficou muito melhor para todos nós porque poderemos exercer o mandato com toda plenitude, sem nos transformar em zumbis, e continuar sendo uma alternativa para a disputa das eleições em 2008. Havia muita gente preocupada, achando que o partido não poderia se estruturar, se manter. Só superar isso já nos dá um oxigênio fundamental.?
Chico Alencar lembrou que a legenda e o PRB (do vice-presidente reeleito José Alencar, que só elegeu um deputado federal) têm registro legal há apenas um ano e que ainda estão em fase de construção. ?Hoje, para pedir o registro de um partido, é preciso o apoio de 420 mil eleitores. Isso é muita coisa. É muito mais difícil construir hoje um partido do que há poucos anos porque as regras são rígidas. A cada eleição, vai havendo a depuração porque o eleitor sabe como a política funciona.?
O deputado do PSOL do Rio lembrou ainda que ministros do STF elogiaram os partidos que brigaram contra a cláusula de barreira, como o PCdoB, PV, PSOL e PRB. ?A sociedade brasileira precisa dos ambientalistas do PV, dos comunistas moderadíssimos do PCdoB, dos socialistas do PSOL e dos republicanos do PRB.?
Já o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) disse que está alegre com a possibilidade de a legenda partido continuar a atuar, legalmente. Mas tem críticas à legislação eleitoral. ?Admito que não lutei muito para que a cláusula de barreira caísse. Acho que, numa reforma política de verdade, o tema terá de ser reexaminado. O que me alegra é que vamos ter atuação parlamentar plena.?