Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) jogou no lixo todos os laudos produzidos por peritos da Polícia Federal (PF) na operação Predador, que investigou fraudes de R$ 100 milhões no Conselho Nacional de Enfermagem (Cofen). Como conseqüência, as sentenças de cinco pessoas condenadas a penas que chegam a 19 anos de prisão foram anuladas. E os laudos existentes não poderão ser usados como provas contra os 50 acusados. O mais grave, alertou o procurador federal Marcelo Freire, autor das denúncias contra os réus da Predador, é que isso abre um precedente contra todas as operações da PF fundamentadas em laudos periciais e contra os processos derivados dessas investigações, como os casos dos bancos Nacional e Marka.

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Ele classificou a medida como "inédita" e "absurda".

Freire explicou que todos os laudos têm de ser assinados por dois peritos oficiais. Até a decisão da 5.ª Turma do STJ, o perito era considerado oficial depois de prestar concurso e tomar posse do cargo. Mas a ministra Laurita Vaz teria criado uma inovação: no seu entender, só podem ser considerados peritos oficiais aqueles inscritos regularmente nos conselhos nacionais de suas áreas profissionais. Assim, os peritos contábeis, caso da Predador, teriam de contribuir para o Conselho Federal de Contabilidade. A interpretação de Laurita, relatora do pedido de habeas-corpus de Gilberto Linhares Teixeira, acusado de ser o líder dos fraudadores e condenado a 19 anos de cadeia, foi seguida pelos ministros Arnaldo Esteves Lima e Felix Fischer.

"Onde essa exigência é formulada no ordenamento brasileiro? Eu desconheço. Isso não existe como obrigação em nenhuma lei no Brasil", observou Freire. Na decisão, Laurita dedica um curto parágrafo ao tema, no qual nenhuma lei é citada para embasar seu entendimento. Freire explicou que, ao serem aprovados nos concursos, os peritos, em geral, deixam de contribuir financeiramente para os conselhos profissionais porque ficam legalmente proibidos de exercerem atividades privadas.

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"Ela (Laurita) inovou. Criou uma obrigação que não existe na lei e anulou os laudos e as sentenças. É muito preocupante", acrescentou o procurador. Freire já solicitou à superintendência da PF que produza novos laudos para a operação Predador, agora assinados por dois peritos com registro no conselho. "Para você ter uma idéia, dos 17 peritos contábeis que a PF tem no Rio, apenas dois têm o registro", ponderou.

Freire prevê uma "enxurrada de pedidos de habeas-corpus" em casos semelhantes e se preocupa com a possível consolidação dessa jurisprudência. "Se houver novas decisões como essa, vai ser o caos. Todas as operações balizadas em laudos periciais vão ser anuladas", alertou. "É razoável que o Poder Judiciário crie uma obrigação não prevista e ainda retroaja essa decisão para anular fatos passados?", questionou o procurador. Freire ressaltou que sua crítica é construtiva e se dirige à decisão, não contra os ministros.

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