A regra da verticalização das coligações, que proíbe alianças nos Estados entre partidos adversários na disputa presidencial, vale para as eleições deste ano. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que a emenda constitucional que derruba a medida, sancionada pelo Congresso no dia 8, não terá vigência imediata.
A liberdade aos partidos para fazerem coligações eleitorais independentemente da chapa formada para disputar a Presidência da República só valerá na disputa de 2010.
"O Congresso, em matéria constitucional, pode muito, mas não pode tudo. A Câmara e o Senado não podem transgredir o núcleo constitucional", resumiu o ministro Celso de Mello, ao fim da votação. Prevaleceu no STF o entendimento de que o artigo 16 da Constituição, que estabelece o princípio da anualidade para a lei que alterar o processo eleitoral, não pode ser violado, pois uma emenda à Constituição também deve observar o princípio da segurança jurídica.
O limite imposto às coalizões eleitorais produzirá alterações imediatas no cenário da disputa presidencial. Para a alegria do governo, o PMDB, que realizou consulta interna no último domingo e escolheu o ex-governador e ex-secretário de Governo e Coordenação do Estado do Rio Anthony Garotinho para disputar a Presidência, terá dificuldade para manter de pé a candidatura. A participação de Garotinho incomoda a administração federal porque ajuda a arrastar a disputa para um segundo turno.
Como o PMDB quer lançar pelo menos 18 candidatos a governador e a verticalização atrapalha as alianças que são articuladas na maioria dos Estados, peemedebistas de todas as alas apostam que a melhor solução é descartar o candidato. "Quem acredita em duende e Papai Noel também pode crer em candidatura do PMDB com verticalização", ironiza o deputado Geddel Vieira Lima (PMDB-BA).
"O quadro das candidaturas vai ficar bem reduzido", concorda o presidente nacional do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC). O PFL, que ameaça lançar o prefeito da capital fluminense, César Maia, na corrida presidencial para aumentar o cacife nas negociações com o PSDB em cada Estado, terá de refluir, rapidamente, se quiser manter a aliança com os tucanos no governo de São Paulo. Pequenos partidos, como o PPS, também terão dificuldades de sustentar a candidatura.
A quase totalidade do pleno acompanhou o voto da futura presidente do Supremo Tribunal e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Ellen Gracie. Foi Gracie quem relatou a ação direta de inconstitucionalidade (Adin) ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). No parecer, ela cobrou respeito ao "devido processo legal", o que, de acordo com ela, inclui o princípio da anterioridade.
Deste modo, qualquer mudança nas regras eleitorais só tem validade se aprovada pelo menos um ano antes da eleição. Foi exatamente o que decidira o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em resposta a uma consulta feita pelo PSL.
"Sem segurança, não pode existir vida social organizada. O princípio da anualidade visa, exatamente, a preservar a segurança política e jurídica, evitando alterações no processo eleitoral feitas ao sabor do momento, seja por lei ou por emenda", concordou o ministro Eduardo Henrique Lewwandowiski.
De nada valeram a defesa da emenda apresentada pelo advogado-geral do Congresso, Alberto Cascais, nem tampouco o parecer jurídico igualmente favorável à vigência imediata da emenda, feito pelo ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Álvaro Ribeiro Costa.
Ao questionar o porquê do prazo de um ano, o ministro Eros Grau foi atalhado pelo presidente do tribunal, ministro Nelson Jobim. "Um ano antes é o prazo da filiação partidária e fixação do domicílio eleitoral", lembrou o ministro e ex-deputado. "Aguarde. Talvez, o sr. se surpreenda", reagiu Grau que, ao fim, julgou procedente a adin interposta pela OAB.
"Eu sou daqueles que acham que as regras do jogo definem a conduta e não que as condutas definem as regras do jogo", insistiu Jobim, ao fim.
As vozes discordantes ficaram restritas aos ministros Sepúlveda Pertence e Marco Aurélio Mello. Este último considerou a verticalização "um engessamento, uma camisa-de-força e um desprezo à própria cidadania".
De acordo com Mello, a Lei Eleitoral de 1997 não estabelece a verticalização que foi imposta pelo TSE, que legislou por meio de uma decisão de Jobim em 2002. "A emenda constitucional nada modificou na ordem jurídica. Ela veio dar envergadura constitucional a uma norma que existe desde 1997", disse Mello.
