Preocupados com o provável avanço do zika vírus em São Paulo, cientistas paulistas organizaram uma força-tarefa sem precedentes, envolvendo pelo menos 25 laboratórios de várias partes do Estado, com o objetivo de investigar diferentes aspectos relacionados à doença. O esforço, que reúne um batalhão de cerca de 300 pesquisadores, contará com a participação de virologistas do Instituto Pasteur de Dacar, no Senegal. Eles vão treinar os cientistas brasileiros para aplicar, nos estudos sobre a nova doença, uma técnica inovadora usada na África contra o Ebola.

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De acordo com o coordenador da rede, Paolo Zanotto, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), pouco se sabe sobre o vírus. Sem conhecimento, é impossível controlar os surtos e desenvolver métodos diagnósticos, terapias, ou vacinas – que ainda não existem. Sabendo que o verão poderá multiplicar os casos no Estado, segundo Zanotto, os cientistas estão trabalhando intensamente. Eles trocam informações há 15 dias, e a rede já está em operação. “Estamos correndo contra o tempo e trocando horas de sono por horas de trabalho. Precisamos entender o vírus, que parece mesmo estar envolvido nos casos de microcefalia”, disse ao Estado. “Estamos na região mais populosa do País e, com a chegada do verão, o problema pode ficar fora de controle.”

De acordo com Zanotto, só foi possível montar a força-tarefa em tempo recorde graças a investimentos em infraestrutura científica feitos nos últimos anos pelo Estado de São Paulo. A Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesp) investiu R$ 12 milhões no setor entre 2000 e 2005. “Graças a isso, conseguimos organizar, com agilidade, um grupo enorme e extremamente qualificado de cientistas com uma boa estrutura para trabalhar.” Para economizar tempo no levantamento de recursos, a rede deverá contar com aditivos da Fapesp para projetos de pesquisa já existentes nos laboratórios participantes, evitando assim os trâmites para a aprovação de uma nova proposta.

O próximo passo inclui o convite a um grupo de cientistas liderado por Amadou Sall, diretor científico do Instituto Pasteur, de Dacar, no Senegal, que trará a São Paulo, em janeiro, a metodologia “lab in a suitcase” (laboratório em uma mala), usada no combate ao ebola. Segundo Zanotto, para estudar o vírus é preciso isolá-lo, o que é muito difícil de fazer a partir do organismo humano. “Com esse recurso, poderemos isolar o vírus diretamente no mosquito. Esse método foi muito útil para isolar o vírus do ebola dos pacientes em campo, na África. Com ele, vamos coletar o mosquito no ambiente, saber – em 15 minutos – se tem o vírus e levá-lo para o laboratório para isolá-lo e estudá-lo.”

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Frentes

O ataque à zika já é feito em várias frentes, por equipes de especialistas lideradas por 28 cientistas. O biólogo José Eduardo Levi, por exemplo, estudará a transmissão de zika por transfusão de sangue, no Laboratório de Biologia Molecular do Hemocentro de São Paulo “Há muitas coisas que desconhecemos, mas um dos aspectos mais urgentes é sermos capazes de testar o sangue que será usado para transfusão em mulheres grávidas”, disse ele.

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Segundo Levi, os casos de microcefalia tornam as gestantes o grupo mais vulnerável. “Alguns vírus, como o da dengue, são há anos transmitidos via transfusão, mas não causam a doença no receptor. Mas com outros vírus é diferente e não se sabe como funciona no caso do zika. Por isso é preciso ter um teste para os doadores”, explicou. No Laboratório de Virologia do Instituto de Medicina Tropical da USP, chefiado por Clarisse Machado, Levi ajudará a fazer uma retrospectiva de casos suspeitos de dengue, em crianças de Araraquara (SP), nas quais foi descartado o diagnóstico da doença.

Em Ribeirão Preto, no Centro de Pesquisa em Virologia da Faculdade de Medicina da USP, Tadeu Figueiredo vai liderar uma grande equipe que observará gestantes com suspeita de zika. “As mães serão encaminhadas para o nosso ambulatório, faremos todos os testes necessários nelas e nos bebês e continuaremos acompanhando ambos por ao menos três anos. Vamos estudar esses casos a fundo”, disse.

Circulação

Outros cientistas, como José Luis Módena, do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), trabalharão para compreender o padrão de circulação do vírus na região de Campinas. “A ideia é analisar pacientes que chegam ao Hospital das Clínicas com quadro febril e suspeita de dengue e fazermos testes moleculares para detectar o vírus. A partir desse material, faremos diferentes estudos”, explicou.

Analisando o sangue dos pacientes com zika, a equipe de Módena poderá, por exemplo, descobrir se características genéticas causam uma resposta mais grave. “Além de um banco de soro que poderá gerar muitos desses estudos, vamos fazer uma biblioteca de células de defesa do sangue, que nos ajudará a identificar anticorpos específicos contra zika.”

Anticorpos

O imunologista Eduardo Silveira, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP, estudará a resposta de células do sistema imunológico ao vírus. “A proposta é descobrir quantas delas aparecem na corrente sanguínea com a infecção e quantas delas atuam contra o zika. Isso nos permitirá, mais tarde, isolar essas células e usá-la na produção de anticorpos”, afirmou Silveira. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo