Brasília – Depois de cinco horas de discussão, a Câmara dos Deputados aprovou na madrugada de ontem medida provisória (MP) que eleva ao status de ministro o cargo de presidente do Banco Central, hoje ocupado por Henrique Meirelles.
Dos quatro destaques votados na sessão de ontem, apenas um foi aprovado – o que estende o foro privilegiado aos ex-presidentes do Banco Central, de autoria do deputado Miro Teixeira (PPS-RJ). A aprovação foi garantida por meio de acordo entre as lideranças. A medida provisória segue agora para votação pelo Senado Federal.
A MP foi editada em agosto deste ano pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e cria foro especial no caso de ações penais contra o presidente do Banco Central, que passou a ter o direito de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A MP foi aprovada pelos parlamentares em votação nominal por 253 votos favoráveis, 145 contrários e quatro abstenções, durante tumultuada sessão marcada por uma série de protestos dos partidos de oposição.
O líder do PFL na Câmara, deputado José Carlos Aleluia (BA), alegou inconstitucionalidade na matéria com o argumento de que o presidente do Banco Central é hierarquicamente subordinado ao ministro da Fazenda e, por isso, não pode ter status de ministro. "Desde o Império até os dias de hoje, quando se viu um ministro subordinado a outro ministro? Eu não me refiro à subordinação intelectual ou política. Eu me refiro à heresia prevista nessa medida", criticou Aleluia.
Sem consenso
Mesmo dentro da base aliada, a MP criou polêmica. O PT conseguiu na tarde de ontem, em apertada votação durante reunião da bancada, fechar questão para que todos os deputados do partido votassem a favor da medida. Vinte e oito parlamentares petistas, no entanto, votaram contra a matéria.
Para o líder do governo na Câmara, deputado professor Luizinho (PT-SP), a MP é fundamental para garantir a plena atuação do BC frente à política econômica do país. "Dar foro é garantir estabilidade ao presidente do Banco Central, não é impedir o seu julgamento. Ele não pode estar vulnerável a um juiz qualquer de primeira instância", ressaltou o líder.
O ministro de Coordenação Política, Aldo Rebelo, disse que a MP tem como objetivo proteger a instituição Banco Central, e não apenas o seu presidente. O ministro admitiu, no entanto, que o Congresso Nacional é "soberano" para encontrar o melhor caminho para conceder o foro especial ao presidente do banco. Na avaliação dos parlamentares da oposição, o melhor caminho para conceder o foro privilegiado ao presidente do Banco Central é por meio de emenda à Constituição, sem elevar o status do cargo.
Em meio às negociações, o deputado Robson Tuma (PFL-SP) apresentou proposta de emenda constitucional (PEC) que concede o foro especial ao presidente do Banco Central sem mudanças no status do cargo. "A PEC acaba com o impasse e também com a inconstitucionalidade da matéria. Como a intenção do governo é conceder foro especial, a PEC solucionaria o problema", disse Tuma.
Nova batalha no Senado
Aprovada na madrugada de ontem na Câmara dos Deputados, a medida provisória que dá status de ministro ao presidente do Banco Central poderá ser votada no Senado na próxima quarta-feira (dia 8). Para isso, ela terá que ser lida pela mesa diretora hoje.
O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), busca votos em todos os partidos para garantir a aprovação, uma vez que a maioria do governo na Casa não é tão grande quanto na Câmara.
Nesta busca de votos, o PMDB, que é a maior bancada no Senado, com 22 parlamentares – o senador Gilberto Mestrinho (AM) está de licença médica – será fundamental para a aprovação da medida provisória 207.
Sem problemas
O líder Renan Calheiros disse que ainda vai ouvir a bancada sobre o assunto, mas acredita que "não haverá problemas em votar a MP". Um levantamento informal de sua assessoria mostra que 20 dos 22 senadores tendem a votar a favor da medida provisória garantindo foro especial ao presidente do Banco Central.
O líder do governo, Aloizio Mercadante, defende que a prerrogativa do responder ações judiciais exclusivamente no Supremo Tribunal Federal (STF) é essencial para o exercício da função pública. "O homem público não pode ficar respondendo a qualquer ação, de qualquer Ministério Público de qualquer município do Brasil. É absolutamente inviável", destacou o líder governista.
Problemas à vista
Já a oposição promete criar todas as dificuldades possíveis ao governo para votar a MP 207, que vence no dia 13 de dezembro. O líder do PSDB, Arthur Virgílio Neto (AM), disse que vai recorrer a "todos os instrumentos regimentais, inclusive à obstrução" para não votar a medida provisória. "Sou contra o casuísmo. O PSDB vota contra. O partido é a favor do foro privilegiado, mas é contra colocar o presidente Henrique Meirelles neste grande guarda-chuva depois das fortes denúncias feitas contra ele", afirmou o tucano.
Já no PT o clima é de tranqüilidade na votação a matéria. A medida provisória foi discutida pela bancada, que fechou questão favoravelmente à sua aprovação. Agora, a líder do bloco (PT-PSB-PTB), Ideli Salvati (SC), parte para conversas com o PSB e PTB para garantir o maior número de votos possível em favor da medida provisória.
Maior dissidência foi no PT
Brasília (AG) – A maior dissidência da bancada do PT foi registrada durante a votação da medida provisória que dá ao presidente do Banco Central status de ministro. Dos 90 deputados petistas, 28 votaram contra o governo. A bancada mais fiel foi a do PL. Dos 46 deputados do partido do vice-presidente, José Alencar, 39 votaram a favor da aprovação da MP 207.
O presidente nacional do PT, José Genoino, considerou errada a decisão de 28 deputados do partido de votar contra a medida provisória (MP) que concedeu condição de ministro ao presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles. "Existia uma razão de governo para a edição da MP. Esse voto não é bom. Por isso, essa questão tem de ser tratada politicamente porque tivemos parte da bancada em dessintonia com o governo." Mas Genoino descartou a possibilidade de abertura de processo disciplinar contra eles. "É uma questão muito mais política do que de disciplina. Não cabe nenhuma punição", disse.
O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), disse que o fato de 28 petistas terem votado contra a medida provisória que dá status de ministro ao presidente do Banco Central deixa claro que é um assunto polêmico. "Estão faltando assuntos mais suaves. Evidentemente que essa MP é muito polêmica e tendo sido ultrapassada vai amenizar a situação e tranqüilizar um pouco o clima na Câmara", disse João Paulo.
Babá e Fiúza vão à corregedoria
O presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT/SP), vai mandar as fitas e as notas taquigráficas da sessão de ontem de madrugada da Casa para que o corregedor da Câmara, Luiz Piauhylino (sem partido-PE), analise o bate-boca entre os deputados Ricardo Fiúza (PP-PE) e João Batista Araújo, o Babá (sem partido-PA).
Durante os debates, Babá acusou Fiúza de estar tentando blindar o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, a quem chamou de "corrupto". Babá também acusou o relator de integrar a "tropa de choque do ex-presidente Collor de Mello que ajudou a impedir o seu impeachment". O relator reagiu, e disse que o deputado Babá era "moleque e vagabundo". "Não brinque comigo, nunca lhe ofendi nem lhe dei liberdades", disse Fiúza.
Cunha (PT-SP), interveio na discussão dos parlamentares e advertiu Babá sobre a necessidade de comprovar suas denúncias. "Vossa Excelência é responsável pelas palavras que fala", alertou João Paulo.
Líderes do governo e da oposição saíram em defesa do relator e o líder do PP na Câmara, deputado Pedro Henry (MT), pediu a instauração de procedimento disciplinar contra Babá. A deputada Luciana Genro (sem partido-RS) rebateu, e também solicitou a aplicação da medida contra Ricardo Fiúza.