brasil

Slow fashion: como se adaptar ao movimento que preza pela moda sustentável

O ano é 2016. A grife de luxo britânica Burberry inova ao aderir ao movimento “see now, buy now”, cujo objetivo é levar as peças às lojas imediatamente após o desfile. Em tempos de compras online e lojas de departamento lançando coleções novas a cada semana, o tempo passa a ser decisivo entre as marcas que lideram o número de vendas. Passamos para 2019. O termo “slow fashion” começa a se popularizar, ainda que timidamente, e corrompe todos os conceitos promovidos até então. Moda, mais do que seguir tendências, agora é sustentabilidade.

De acordo com um estudo da revista Environmental Health, publicado em dezembro de 2018, aproximadamente 85% do vestuário que norte-americanos consomem são enviados para aterros sanitários como resíduos sólidos. Apesar de ser um mercado que fatura 1,2 trilhão de dólares anualmente, cerca de R$ 4,8 trilhões, seu impacto ambiental preocupa: a indústria da moda é a segunda que mais polui o meio ambiente, ficando atrás apenas do petróleo.

Em contrapartida à fast fashion, conceito que prioriza a venda de produtos baratos, de pouca qualidade e que chegam rápido às lojas, um novo termo passa a integrar o vocabulário: batizado de slow fashion, seu objetivo é desacelerar o consumo de produtos da moda. Por um lado, as mercadorias possuem maior qualidade e durabilidade. Por outro, o preço um pouco elevado pode desagradar o cliente.

Em 2015, a especialista em consumo consciente Chiara Gadaleta criou o Prêmio Ecoera em prol da sustentabilidade nos universos da moda, beleza e design. No ano passado, a premiação homenageou a marca Coletivo de Dois por aliar comércio justo, práticas sustentáveis e empoderamento de gênero. “Nós compramos materiais inusitados, com defeitos de impressão, sobras de rolo, peças que para o comércio tradicional não tem mais valor. Aproveitamos o material até o limite, só descartamos o que não tem mais como emendar”, revela Daniel Barranco, que fundou a marca com o parceiro Hugo Mor há cinco anos. Nesse período, costuraram mais de duas mil peças e conseguiram reaproveitar aproximadamente 150 quilos de retalhos, que certamente iriam para o lixo.

Garimpo de segunda mão

Segundo um levantamento feito pelo site ThredUP, a compra de produtos de segunda mão aumentou 25% em apenas um ano. Esse tipo de mercado pode se enquadrar como disseminador da moda sustentável, já que incentiva o comércio de segunda mão e prolonga a vida útil das peças em bom estado.

“A principal missão da Boutique é difundir o consumo consciente, minimizar (dentro da nossa realidade) danos, aumentar a vida útil de itens descartados e reutilizá-los”, conta Rebeca Oksana, que fundou a Boutique São Paulo há quatro anos. A princípio, a jovem de 24 anos vendia “desapegos” pelo Instagram, mas viu o negócio crescer quando passou a visitar brechós de São Paulo para garimpar novas peças. Com a demanda, criou o e-commerce para vender não somente produtos de segunda mão, mas também peças novas. “Meu foco era trazer peças autênticas, únicas e de qualidade, que não seriam encontradas em lojas de fast fashion. Era uma insatisfação minha e que eu acreditava que algumas pessoas compartilhavam”, explica.

Segundo estimativas do Sebrae, o mercado têxtil brasileiro produz cerca de 170 mil toneladas de resíduos por ano. Para Rebeca, é preciso diminuir o impacto ambiental causado pela moda, seja não adquirindo peças novas ou diminuindo o consumo desenfreado. “Acredito que o garimpo e o consumo de peças de segunda mão andam de mãos dadas com um estilo de vida mais consciente. O mundo da moda precisa de uma revolução e nós estamos tentando, aos pouquinhos, fazer isso acontecer”, vibra.

Lixo ressignificado

No mercado de calçados há cinco anos, a Insecta Shoes acumula números surpreendentes de reciclagem: 21 mil garrafas plásticas, 2 mil metros de tecido, quase uma tonelada de algodão, mais de 1.600 quilos de papelão e 6.800 quilos de borracha já foram reciclados pela marca paulistana.

Fundada por Bárbara Mattivy, a marca surgiu com a ideia de aproveitar peças com pequenos defeitos e que, por isso, não podiam ser revendidas. “Nós tentamos ao máximo tirar materiais que estão no lixo e ressignificá-los, transformando tudo em sapato”, conta. O solado, por exemplo, é feito de borracha reaproveitada, enquanto os tecidos vêm de garrafas PET recicladas.

O processo de produção da Insecta Shoes é artesanal e livre de crueldade animal, demonstrando uma preocupação além da sustentabilidade. Além disso, trabalham com a logística reversa: “quando o cliente não quer mais usar o sapato, nós recebemos ele de volta para fazer a reciclagem da forma correta”, comenta.

Como se adaptar ao movimento?

Pensando nos consumidores que querem adaptar o guarda-roupa ao movimento slow fashion, a engenheira ambiental Maria Constantino propõe cinco estratégias que facilitam o consumo consciente. “O começo foi um desafio, mas a criatividade que tenho em meus looks, a economia que venho gerando em meu bolso e a realização pessoal de dialogar tudo isso tem valido muito a pena”, revela a ativista, que tem mais de dez mil seguidores em seu perfil no Instagram sobre estilo de vida ecológico.

Primeiramente, ela valoriza a imaginação e criatividade na hora de compor os looks, como testar novas combinações e variar o uso das peças. O cuidado com as roupas também é fundamental: “Se você vai comprar menos, consecutivamente vai precisar usar e cuidar mais das roupas que tem. Preste atenção no manuseio de cada peça e qual a melhor maneira de lavar e passar cada material para que durem bastante.”

Se quiser comprar alguma mercadoria nova, a engenheira sugere planejamento para evitar compras por impulso, sem ao menos considerar se a roupa vai combinar com outras peças e estampas do próprio guarda-roupa. Pensando nisso, Maria ressalta a importância de se fazer perguntas como “tenho outras peças parecidas?” ou “quantas vezes vou usá-la?”.

Se tiver de fazer alguma aquisição, dê preferência aos brechós ou lojas de segunda mão: “Tanto as físicos quanto as do Instagram são excelentes opções para procurar roupas que vão colaborar para o seu guarda-roupa sustentável. Você vai se surpreender com os achados e ainda irá economizar uma grana”, afirma a engenheira.

Por fim, aproveite as oportunidades em que puder pegar roupas emprestadas. Em formaturas e casamentos, por exemplo, ocasiões mais formais em que evitamos repetir looks marcantes, peça para seu círculo de amigos e familiares se podem te emprestar algo para o evento. Hoje em dia, há até mesmo aplicativos destinados ao empréstimo de roupas, das mais cotidianas às de festa.

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo