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Torres, Ana júlia e Flexa Ribeiro: omissão.

Brasília – O relatório da comissão externa do Senado que acompanhou as investigações sobre o assassinato da missionária Dorothy Stang aponta a omissão das polícias estaduais – Civil e Militar – do Pará em relação às denúncias sobre ameaças de morte contra a freira e sobre os conflitos agrários na região. ?É um relato de toda a situação no Pará, desde a omissão policial até o esquema de corrupção que existe nos cartórios, passando pela influência que a polícia sofreu, apesar de ter sido muito correta na elucidação desse inquérito?, explicou o relator, senador Demóstenes Torres (PFL-GO).

Segundo a senadora Ana Júlia Carepa (PT-PA), a omissão policial é confirmada por um documento produzido pelo próprio secretário de Defesa Social do Pará, Manoel Santino. Com base nas informações dele, o relatório da comissão externa destaca que, de uma lista de 12 ocorrências policiais relacionadas a conflitos agrários nos municípios paraenses de Anapu (onde a freira foi assassinada) e Altamira – entre 2003 e 2005 -, apenas quatro dizem respeito à violência contra trabalhadores rurais. São ?duas relativas ao assassinato da freira Dorothy e outras duas a pretensos proprietários de terra?.

Segundo o relatório, as demais se referem a invasões de propriedades, o que demonstra ?o desbalanço da ação policial?. ?A polícia local é, infelizmente, uma das grandes incentivadoras da violência porque ela não apura o envolvimento dessas pessoas que se dizem fazendeiros e são grileiros de terra. Pelo contrário, ela tem sido omissa e também tem sido conivente?, reforçou a senadora. Para ela, uma forma de intensificar o combate aos conflitos agrários na região é transformar o posto da Polícia Federal de Altamira em delegacia.

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O secretário de Defesa Social do Pará, Manoel Santino, acompanhou a reunião em que o relatório final foi aprovado e rebateu as críticas de omissão ou favorecimento de fazendeiros por parte de policiais. ?A polícia, em qualquer estado do Brasil, não está a serviço de A, B ou C. Existe uma lei que precisa ser cumprida e os fatos são fatos. Quem descumpre a lei tem que ser submetido a inquérito policial?, argumentou Santino. Segundo ele, a relação de ocorrências fornecida à comissão refere-se ao período de outubro de 2004 a fevereiro de 2005 e não ao que foi citado na versão final do relatório.

No entendimento do secretário, o relatório não menciona uma possível omissão da Polícia Civil do estado. ?O relatório não diz que houve conivência da Polícia Civil. Ele aponta deficiências das duas polícias, tanto da Polícia Federal como da Civil, e o governo do Pará nunca negou que temos muitos desafios a vencer. Mas muito já avançamos com relação à atividade das polícias?, afirmou Santino, ao destacar que ?o governo do estado tem consciência de que tomou todas as providências que estavam ao seu alcance para combater a violência?.

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O secretário disse ainda que os conflitos agrários no Pará são reflexo da ausência da reforma agrária no estado. ?Essa ausência não é desse governo, nem do passado. É uma ausência histórica do Estado brasileiro, seja no âmbito dos poderes federal, estadual ou municipal?, avaliou.

Para a comissão externa, os recentes episódios de violência no estado ?resultam claramente de reação de setores ligados à grilagem de terras e desmatamento ilegal contra políticas públicas que começaram a se implantar na região?.

?O relatório aponta o acirramento dos conflitos no momento em que o governo federal demonstrou vontade política de implementar os projetos de desenvolvimento sustentável e começou a agir nessa direção?, completa a senadora.

Renan recebe relatório final

Brasília – Após 40 dias acompanhando as investigações sobre o assassinato da religiosa norte-americana Dorothy Stang, a comissão externa presidida pela senadora Ana Júlia Carepa (PT-PA) entregou ontem ao presidente do Senado, Renan Calheiros, o relatório final elaborado pelo senador Demóstenes Torres (PFL-GO). Os parlamentares chegaram à conclusão de que é necessário continuar a investigação sobre os conflitos territoriais no Pará e desvendar a rede de suporte às atividades criminosas de grilagem de terras. Renan Calheiros informou que vai encaminhar todas as providências sugeridas ao presidente Lula e ao governador do Pará, Simão Jatene (PSDB). A senadora Ana Júlia Carepa disse que o relatório também será entregue ao Ministério Público Federal. Ela atribuiu a violência na região a setores que não querem a regularização das terras e que, por essa razão, estariam reagindo às ações do governo federal na área de assentamentos e reservas florestais. ?São esses setores que estão ajudando a financiar aquele gatilho que matou a irmã Dorothy e que é responsável pela violência na região?, disse Carepa.

Crime tem consórcio de mandantes

Brasília – O fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, preso no último domingo, pode não ser o único mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang, morta com seis tiros no dia 12 de fevereiro, em Anapu (PA). Essa é uma das principais conclusões da comissão externa do Senado criada para acompanhar as investigações sobre o caso, cujo relatório aponta a existência de possível consórcio no Pará para financiar a morte de pessoas contrárias à exploração ilegal de madeira e grilagem de terras na região. ?O esclarecimento do crime, com a prisão dos executores e de um mandante, não implica a descoberta de toda a cadeia de mandantes do crime e de uma rede de suporte às atividades criminosas contra a preservação da floresta e contra os assentamentos sustentáveis?, diz o relatório. O senador Demóstenes Torres (PFL-GO), relator da comissão, afirma que se trata de um ?consórcio para que esses crimes continuem a acontecer no Pará?. O relatório foi aprovado ontem, por unanimidade, após 42 dias desde o início dos trabalhos. Para a presidente da comissão, senadora Ana Júlia Carepa (PT-PA), pelo menos mais seis pessoas estariam envolvidas no crime. ?São ditos fazendeiros e madeireiros, porque quem está numa terra ilegalmente não é produtor rural, quem usa da violência é bandido travestido de produtor rural?, disse Ana Júlia, sem citar nomes. ?Essas pessoas têm sua história vinculada à violência contra os trabalhadores e precisam ser investigadas?, afirmou a senadora. Os quatro acusados de participação no assassinato já estão presos: os dois pistoleiros, Rayfran das Neves Sales e Clodoaldo Carlos Batista, o acusado de ser o intermediário, Amair Feijoli da Cunha, além de Vitalmiro Bastos de Moura, que se entregou à Polícia Federal depois de passar 40 dias foragido. Na avaliação de Ana Júlia Carepa, o esclarecimento de todos esses pontos é fundamental para que não haja impunidade e para que seja possível evitar outros crimes semelhantes. ?O relatório traz coisas importantes, como a necessidade de que se continue a investigação para que possamos desbaratar, de uma vez por todas, esse consórcio. Ele serviu para matar a irmã Dorothy, mas se não for desbaratado, vai servir para matar todos aqueles que forem contrários à exploração ilegal da Amazônia, dos nossos recursos naturais de forma predatória?.