O Senado aprovou ontem, em votação simbólica, o projeto de lei do deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) que altera a redação do Código de Processo Penal, dando foro privilegiado a ex-governantes. Atualmente, o foro especial beneficia autoridades somente durante o exercício da função ou mandato. A matéria, que já passou pela Câmara dos Deputados, vai agora à sanção do presidente da República para entrar em vigor. O Supremo Tribunal Federal, porém, havia derrubado essa prerrogativa de foro privilegiado em maio de 1999.
Com a aprovação, ex-ocupantes de cargos públicos – como ex-presidentes da República, ex-ministros, ex-governadores e ex-prefeitos – acusados de improbidade administrativa quando do exercício da função deixarão de ser julgados por juízes de primeira instância ou pela Justiça comum, devendo o julgamento ocorrer em tribunais superiores. Além de garantir o foro privilegiado em casos de improbidade, o projeto amplia ainda mais o direito de julgamento especial. Pelo texto aprovado, ex-autoridades públicas também terão foro privilegiado quando acusadas de crimes relacionados ao período em que estavam no cargo.
A votação ocorreu em regime de urgência. Os senadores também rejeitaram, por 27 votos a 15, a emenda da senadora Heloísa Helena (PT-AL) que assegurava o foro privilegiado apenas para presidentes da República e ministros. O senador José Eduardo Dutra (PT-SE) defendeu a emenda, observando que o presidente da República, quando deixa o cargo, está normalmente sujeito a ações que proliferam em todo o País nas diversas instâncias da Justiça, o que não é o caso, por exemplo, ressaltou, dos prefeitos.
Para o vice-líder do governo no Senado, Romero Jucá (PSDB-RR), o projeto não concede privilégios. “Não é um privilégio porque o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal e pelos tribunais superiores é um direito de qualquer cidadão brasileiro”, alegou. O argumento do tucano é que o foro especial “encurta o caminho do julgamento e garante uma justiça mais rápida”, evitando perseguições políticas a autoridades públicas, o que poderia ocorrer em instâncias jurídicas locais. “Ao levar o julgamento aos tribunais superiores, você está dando uma condição de isenção para que ele possa ser feito sem proteção e sem perseguição”, afirmou Jucá.
Acordo de bastidor
“Fala-se num acordo de bastidor. Eu não posso julgar isso, mas estranhei que o PT não fosse mais combativo contra um projeto que é realmente insustentável”, disse o senador Jefferson Peres (PDT-AM), que criticou duramente o projeto durante a votação em plenário. Para Peres, o foro privilegiado estabelece, na prática, “a impunidade de muitas ex-autoridades.” “Do ponto de vista ético, deixa a desejar, além de ser de constitucionalidade duvidosa”, completou.
O presidente da Associação Nacional de Membros do Ministério Público, Marfan Martins Vieira, afirmou no Senado, após acompanhar a votação, que a entidade vai questionar a nova lei, após sancionada, no Supremo Tribunal Federal. Ele disse que a ampliação do foro privilegiado é inconstitucional, pois só pode ser feita por emenda constitucional, e não por projeto de lei.