Secretária confirma esquema de corrupção

A secretária especial da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida da Prefeitura de São Paulo, Mara Gabrilli, contou ontem, em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos, como foi a conversa, ocorrida em 24 de março de 2004, na qual alertou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a existência de um suposto esquema de extorsão de empresários em Santo André, no Grande ABC (SP).

De acordo com Mara, Lula perguntou quanto o pai dela, o empresário Luiz Alberto Gabrilli, dono de uma empresa de ônibus, pagava de propina ao esquema.

O encontrou durou 40 minutos e deu-se no apartamento de Lula, em São Bernardo do Campo (SP), na presença da primeira-dama, Marisa Letícia Lula da Silva. No testemunho de hoje, Mara afirmou ter ido até lá para pedir que ele interviesse na prefeitura de Santo André com o objetivo de acabar com a retaliação imposta contra a empresa da família dela, o Expresso Guarará.

Mara, que é tetraplégica, disse ter sido recebida depois de estacionar a cadeira de rodas diante do prédio e afirmar que não sairia de lá enquanto não conversasse com o presidente. "Eu comecei a contar do pagamento da caixinha que meu pai era obrigado a fazer a cada dia 30", afirmou. "Falei da retaliação imposta à empresa desde que eu e minha irmã, Rosângela, denunciamos o fato ao Ministério Público (MP)."

A acusação foi feita cinco dias depois do assassinato do prefeito Celso Daniel, em janeiro de 2002. Segundo a secretária especial da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida da Prefeitura de São Paulo, Lula fez algumas perguntas, como se ouvisse uma novidade, embora a suspeita tivesse sido divulgada inúmeras vezes pela imprensa. "Muitas vezes, o presidente mudava de assunto, querendo falar da minha situação física e a toda hora pedia aos assessores que anotassem o que eu dizia", afirmou.

Mara disse que a "humilhação" de ser mensalmente achacado acabou com a saúde de Alberto Gabrilli. "Quando a situação piorou e ele teve de entregar 33% de empresa Nova Santo André, desenvolveu um aneurisma, chegou a perder um rim numa cirurgia e a ficar dois meses em coma", disse.

A secretária especial da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida da Prefeitura informou que, na conversa, apontou os três supostos responsáveis pelo esquema: o ex-secretário de Serviços Municipais da prefeitura e ex-vereador Klinger Luiz de Oliveira (PT), o empresário Ronan Maria Pinto e o ex-segurança de Daniel, Sérgio Gomes da Silva, o Sombra.

Nesse momento, Mara disse que Lula se virou para os três assessores que lá estavam e declarou: "Nossa, eu achei que o Sérgio Gomes já estava muito longe." A secretária especial da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida garantiu ainda ter mencionado uma única vez o assassinato do prefeito de Santo André, ao admitir que a extorsão cessou depois da morte dele.

Mara prosseguiu afirmando que nenhuma das promessas do presidente foi cumprida. A principal delas seria o fim da retaliação. "Ocorreu justamente o contrário; Klinger soube, reclamou e, dias depois, uma comissão de sindicância da prefeitura instalou-se na empresa."

Lula também teria prometido enviar a foto que tiraram juntos e não mandou. Teria pedido ainda que Marisa visitasse a organização não-governamental (ONG) criada por Mara, aonde dirigia o Projeto Próximo Passo, e isso tampouco ocorreu. Mara disse que, após o encontro, um dos assessores do presidente, "muito alto e de barba", pediu-lhe que ocultasse dos jornalistas o teor da conversa, mas que ela não atendeu à solicitação.

A tentativa do senador Tião Viana (PT-AC) de defender Lula não convenceu aos colegas. Tião Viana disse que o presidente procurou o prefeito João Avamileno (PT) – o mesmo a quem ela acusou de retaliar a família – e teria ouvido dele a informação de que a Polícia Federal (PF) investigava a denúncia. Mara retrucou que não sabia de nenhuma reação de Lula . "Quem mereceria uma atitude era minha família, e, quanto às retaliações, não houve mudanças, continuaram da mesma forma", reagiu.

Para o líder da minoria no Senado, José Jorge (PFL-PE), o procedimento do presidente reforça as suspeitas de que ele faz parte da "operação abafa" que desde o início tenta impedir a apuração da morte de Daniel e do esquema de abastecimento de dinheiro para o caixa 2 do PT. "Lula deveria ter chamado o ministro da Justiça (Márcio Thomaz Bastos), pedir para a Polícia Federal, fazer um relatório e encaminhá-lo ao Ministério Público", alegou.

O senador Jefferson Peres (PDT-AM) chamou a atenção para o fato de o presidente não ter se mostrado indignado, "não ter dado ao relato a importância, a dimensão que deveria ter".

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