Que o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa melhorar sua infraestrutura e ofertar tratamentos inovadores para o câncer de forma mais rápida, não há dúvidas. Mas a qualidade da assistência oncológica teria um salto de qualidade se os gestores públicos colocassem em prática políticas já existentes e utilizassem melhor os recursos disponíveis. Essa foi a avaliação de especialistas que participaram do Fóruns Estadão Saúde, realizado na última quarta-feira, 10, em São Paulo, pelo Grupo Estado.

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Programas, políticas e portarias criadas há anos e ainda não implementados integralmente foram citados como exemplos pelos palestrantes para mostrar que muito pode ser aprimorado com uma gestão mais eficiente do sistema.

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Presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), Maira Caleffi ressaltou as falhas na aplicação da Portaria 874, de 2013, que instituiu a política nacional para prevenção e controle do câncer. “Essa portaria é um primor, inclui tudo o que a gente gostaria. Mas precisa ser executada. Como vamos ter acesso a um diagnóstico rápido, por exemplo, se as pessoas não têm como fazer endoscopia, colonoscopia, biópsia?”, questionou.

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Os problemas na implementação de políticas de prevenção, diagnóstico e tratamento de câncer foram admitidos pelo ministro da Saúde, Ricardo Barros, também presente no evento. Ele afirmou que, enquanto o sistema não for mais bem administrado, não será possível aumentar o orçamento da saúde. “Nosso compromisso tem de ser melhorar a gestão na saúde para gastar bem o que já temos. Existem centenas de serviços e equipamentos prontos, mas que não estão em funcionamento. Enquanto não estivermos gastando bem o que já temos, não tenho moral para pedir mais recursos”, declarou.

Um exemplo de projeto criado e não implementado citado pelo próprio ministro foi o plano de expansão dos serviços de radioterapia. “Em 2012, houve o anúncio do plano de compra de 80 novos aceleradores lineares para radioterapia, mas até hoje nenhum está em funcionamento”, declarou.

Segundo o ministro, o atraso ocorreu por vários problemas na aplicação do programa. “A dificuldade foi na disponibilidade dos terrenos, na execução do projeto e na compra do aparelho em si”, disse.

O presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, Gustavo Fernandes, afirmou que a comunidade médica e os pacientes precisam cobrar os governos para que esses programas sejam colocados em prática de forma mais rápida. “O plano de expansão de radioterapia é belíssimo, mas precisa ser executado. Não dá mais para falarmos desse plano com orgulho, temos de falar com um certo grau de vergonha”, afirmou.

Para Merula Steagall, boa gestão e planejamento poderiam também ajudar a acelerar os processos de análise de registro e incorporação de novas terapias oncológicas no SUS. “O processo de incorporação tem vários gargalos. O tempo de demora para registro da Anvisa é de cerca de 18 meses. E depois disso ainda precisa ir para análise da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) para que eles avaliem o que será incorporado nos planos de saúde e na rede pública. Existem medicamentos com registro há dez anos que ainda não foram incorporados no SUS.”

Integração

Oncologista clínico do Hospital Israelita Albert Einstein e diretor científico do Instituto Oncoguia, Rafael Kaliks defendeu maior integração entre as redes pública e privada de saúde para melhorar a assistência ao paciente com câncer e reduzir os gargalos. “A estrutura do SUS é insuficiente, então por que não usar o parque instalado da rede privada? Tem 40% de pessoas precisando fazer radioterapia sem conseguir. Os casos de câncer colorretal estão aumentando, mas podem ser prevenidos, só que falta o exame de colonoscopia na rede pública. Por que não utilizar a estrutura da rede particular nesses casos?”, questionou.

Ele ressaltou ainda que a expertise de serviços particulares de excelência poderia ser utilizada pela rede pública para o diagnóstico correto de diferentes tipos de câncer. “Os tumores têm de ser subclassificados por técnicas sofisticadas. Que se use a rede privada para fazer esse diagnóstico apropriado. Sem isso, o paciente terá tratamento inadequado e o governo, um gasto inútil com um medicamento que pode não ter eficiência para aquele paciente.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.