Pelo antigo Mosteiro de São Bento, a então estagiária Thayline Albuquerque, de 21 anos, acompanhava um visitante do Museu de Arte Sacra de Santos (Mass), no litoral paulista. Por duas horas, o conduziu pelos corredores de quase 400 anos, cuja arquitetura e acervo são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 1945.

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Após poucos dias, em julho de 2016, se deparou com o mesmo homem: ao ver o retrato falado de um dos assaltantes que levaram 20 peças e 422 livros do local, em um roubo com funcionários reféns. O crime segue sem solução e nenhuma item foi recuperado.

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Nesse cenário, igrejas e museus de arte sacra têm apostado em tecnologias para coibir novos crimes – muitas das instituições até evitam dar detalhes sobre o esquema de proteção.

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O Mass colocou parte do acervo em vitrines de vidro temperado e todos os cerca de 600 materiais foram fotografados em alta resolução para facilitar o rastreamento, em caso de eventual roubo. “Agora todo o cuidado é pouco”, diz a administradora do museu, Marcia Egas. O número de câmeras foi ampliado de sete para 16 e agora é exigido que os visitantes mostrem documentos e sejam fotografados antes de circular pelo local.

Já o Museu de Arte Sacra de São Paulo, embora afirme não ter tido casos recentes, investiu em mais câmeras, que chegam a cem, na criação de um espaço de monitoramento blindado e na instalação de alarmes nas vitrines de exibição. Para isso, cortou seguranças. “Substituímos gente por tecnologia”, afirma o diretor executivo José Carlos Marçal de Barros.

Já em igrejas da Arquidiocese do Recife, a instalação de câmeras e alarmes se intensificou há três anos, mas ainda não inclui todos os templos. “Existe um custo alto de instalação e manutenção que a gente não consegue estender a todas”, conta o padre Rinaldo Pereira dos Santos, da Comissão Arquidiocesana de Pastoral para a Cultura.

Em 2016, a arquidiocese procurou o Iphan para refazer o inventário de suas igrejas, processo que identificou dois itens desaparecidos. Outra medida para prevenir crimes é a publicar o catálogo do acervo do Museu de Arte Sacra de Pernambuco em setembro. “É um grande instrumento de combate ao roubo, torna a peça mais pública”, explica.

Desafios

O cenário de roubos de bens culturais é considerado “extremamente grave” pelo próprio governo federal. “Temos todos os dias acontecendo, em menor escala, furtos, roubos e desaparecimentos de obras de arte, de bens culturais, País afora”, disse ao jornal O Estado de S. Paulo o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão. A pasta prepara uma série de medidas para conter o tráfico desses itens no País – e a arte sacra é a mais vulnerável.

Dentre as medidas prometidas estão a elaboração de uma política nacional de combate ao tráfico e a criação de uma coordenação com o mesmo foco dentro da nova Secretaria dos Direito Autoral e da Propriedade Intelectual, que deve ser oficializada em breve. “Estamos de fato muito atrasados. É um mea culpa que precisamos todos fazer”, diz Leitão.

Outra medida cogitada é fazer um levantamento nacional de casos de roubos e furtos de bens culturais, o que não é feito hoje. A ideia é ter um site para reunir informações sobre pirataria e divulgar o banco de dados de itens desaparecidos.

Um dos poucos registros nacionais do tipo é o Banco de Dados de Bens Culturais Procurados, mantido pelo Iphan, que o próprio órgão admite não atualizar desde 2015, quando detinha 1.644 objetos. A inclusão ocorre só após notificação e abrange patrimônio nacional, estadual e municipal. “Não é um banco estável. Ele não reflete a realidade com precisão”, afirma o Iphan, por meio de nota.

Em 2017, por exemplo, a instituição noticiou o furto do retábulo (espécie de altar) da Capela de Sant’ana, em São Gonçalo, no Rio, mas não incluiu a peça no banco de dados. O caso é emblemático no meio, pois, o item, do século 18, foi completamente retirado do local, que já sofria casos de furtos e manutenção em sua estrutura

O maior roubo de bens culturais do Brasil, em 2006,no Museu Chácara do Céu, também no Rio, não teve nenhum dos quatro quadros (de autores como Pablo Picasso e Salvador Dalí) recuperados, embora custassem milhões. Como aponta o ministro, se uma instituição de grande porte, como a carioca, enfrenta casos do tipo, maior é a vulnerabilidade de pequenos museus e igrejas. “Nós temos um vastíssimo acervo de arte sacra, sobretudo dos século 17, 18 e 19, em milhares de igrejas, muitas delas sem nenhum tipo de proteção.”

Resgate

Em Minas, uma série de furtos de peças sacras levou o Ministério Público Estadual a criar uma Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, em 2005. “A metodologia é diferente, pois adota-se um trabalho bem especializado – que exige conhecimentos não apenas no campo do direito como também da história, arqueologia, arquitetura etc -, coordenado e razoavelmente uniformizado na defesa do patrimônio cultural”, explica a promotora Giselle Ribeiro de Oliveira, que comanda a coordenadoria.

A Coordenadoria também mantém um banco de dados de bens desaparecidos, que é alimentado com base em informações de polícias e de proprietários de bens, o que inclui arquidioceses, por exemplo. Cerca de 730 itens estão no sistema.

Além disso, o órgão participou da recuperação de cerca de 280 peças. A mais recente delas, uma imagem de Nossa Senhora do Rosário, do século 18, foi devolvida a uma capela de mesmo nome, no município de Prados, no último dia 15. Ela havia sido encontrada em um site de leilão de obras de arte. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.