Representantes de supermercados, da indústria de plásticos, do governo e de organizações ambientais vivenciaram um impasse ontem durante o fórum “Sacolas plásticas: Você está realmente informado a respeito?”, organizado pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras) em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo. O encontro foi uma forma de fabricantes e varejistas discutirem alternativas sustentáveis e rentáveis para as cerca de 18 bilhões de sacolas plásticas por ano que circulam no País – e os problemas ambientais decorrentes da degradação do plástico, que pode levar até 400 anos. O debate evidenciou a falta de regulamentações para o setor e as discordâncias da cadeia de produtores sobre o manejo correto do material.
A queda-de-braço começou após a exposição da fabricante multinacional RES Brasil, que defendeu a aplicação de um aditivo aos plásticos. O produto criado pela empresa seria capaz de oxibiodegradar o material, isto é, decompor o plástico em partículas orgânicas menores e menos impactantes ao ambiente. “A degradação resulta em água, biomassa e gás carbônico, o que evita problemas de enchentes ou absorção por animais”, disse o diretor da RES, Eduardo von Roost. “O tempo para a decomposição também cai para dois anos,” afirmou. Ele admitiu, porém, que o gás carbônico, principal causador do efeito estufa, continua sendo eliminado.
O problema da proposta é que esbarra na ausência de regulamentação para plásticos biodegradáveis no Brasil. Como as empresas baseiam seus laudos em normas internacionais, há margens para contestação no País. Foi essa a postura dos representantes do Instituto Socioambiental dos Plásticos (Plastivida) e Instituto Nacional do Plástico (INP), que trocaram acusações com a RES. “Não existe biodegradação com o aditivo,” afirmou o diretor do INP, Paulo Dacolina. “Ele só fragmenta o plástico em pedaços pequenos. Isso impede a coleta seletiva e continua contaminando o solo. No futuro, ainda podem responsabilizar a cadeia produtiva por essas contaminações,” disse.
Como o diretor da RES Brasil reafirmou a eficiência do aditivo, o fórum se transformou em uma pequena batalha de citação de laudos e normas técnicas internacionais. Quando abordados separadamente pela reportagem da Agência Estado, Roost e Dacolina disseram a mesma coisa: “Eles não têm laudos.”
Conscientização
A iniciativa do governo, segundo a secretária de Articulação Institucional e Cidadania do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Samyra Crespo, é criar um mosaico de soluções a longo prazo: redução no consumo de sacolas públicas por meio da conscientização dos consumidores; incentivo à coleta seletiva e reciclagem das sacolas plásticas; e reutilização das sacolas ou substituição por sacolas retornáveis.
Diante do impasse no fórum, Samyra sugeriu organizar uma reunião na câmara técnica do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), onde os produtos poderiam ser analisados por técnicos do governo e encaminhados para regulamentação. No entanto, nenhum dos representantes nem a própria secretária do ministério tomou a iniciativa de agendar um encontro com essa finalidade.
Quando questionado sobre o assunto, o presidente da Abras, Sussumo Honda, acenou que essa opção deve ser considerada. “Nós já havíamos iniciado essa discussão com o Conama na época da ex-ministra Marina Silva. Mas com a troca de equipes, a conversa se perdeu”, disse Honda. “Agora as negociações estão recomeçando.”
Sem uma regulamentação nacional, os varejistas reclamam do vai-e-vem de regras locais, como em Guarulhos (Grande SP), por exemplo. Neste ano, foi sancionada no município a lei 6.481, que determina em estabelecimentos comerciais o uso apenas de embalagens biodegradáveis ou reutilizáveis. Menos de seis meses depois, porém, uma liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu os efeitos da lei. “Gastamos 7% mais com as novas sacolas e treinamos pessoal do empacotamento para orientar os consumidores. Foi um desperdício de energia e dinheiro”, afirmou Júlio Schwarz, gerente-administrativo da rede de supermercados Dia.
Soluções
Em meio à polêmica do debate na sede da Abras, um caso foi unanimidade entre os participantes. Trata-se do bom exemplo de Xanxerê (SC), que conseguiu reduzir em 91% o uso das sacolas plásticas. Para tanto, os comerciantes retiraram as sacolas dos supermercados e passaram a cobrar R$ 0,10 por unidade, caso fossem solicitadas. Antes disso, a prefeitura realizou campanha pública sobre o consumo consciente e a possibilidade de usar bolsas não descartáveis.
A economia mensal na cidade catarinense equivale hoje a cerca de 900 quilos de sacolas, que deixaram de circular. Segundo a diretora municipal de Políticas Ambientais, Kátia Parizzoto, a iniciativa partiu dos próprios varejistas, que pediram apoio da prefeitura com campanhas sociais. “A solução não está em uma tecnologia específica. Mas sim mudar um hábito baseado no consumismo”, disse Kátia.