Brasília – Uma “explosão” do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, em um encontro com empresários do setor rural, na quarta-feira, abriu uma nova crise entre ministros do governo Lula. Irritado com o boicote que diz estar sofrendo por parte de seu colega do Planejamento, Guido Mantega, Rodrigues perdeu a paciência, ao ouvir queixas dos empresários e, segundo várias testemunhas, chamou de “vagabundo” o ministro Mantega e mostrou-se disposto a abandonar o cargo. “Eu mandei o vagabundo do Mantega à PQP”, desabafou Rodrigues, acrescentando: “Minha cota com esse governo se esgotou”.
Trechos da conversa, relatados pelo jornalista Jorge Moreno no jornal O Globo de ontem, foram depois confirmados por ruralistas presentes. Informados, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva empenharam-se em acalmar os ânimos – um deles, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá conversar com Rodrigues amanhã ou terça-feira para pedir que permaneça na sua equipe.
Rodrigues, como Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), acusa o governo de uma paralisia que pode comprometer todo o bem-sucedido programa de exportação voltado para o agronegócio. Ao receber pedido de subsídios para o setor de álcool e açúcar, no encontro de quarta-feira, Rodrigues reclamou da situação de “penúria” de sua pasta e do tratamento dispensado a ela pela equipe econômica do governo. O ministro disse que não dá para tocar o programa de exportações com as restrições orçamentárias atuais, especialmente cortes de recursos de uma das áreas mais sensíveis da agricultura, a da defesa sanitária. No ano passado, o governo cortou R$ 65 milhões dessa área. Muitas delegacias do ministério tiveram o telefone bloqueado por falta de pagamento das contas. Procurados para comentar, nem Rodrigues nem Mantega retornaram os telefonemas.
A Associação dos Fiscais Federais da Agricultura, entidade que representa mais de dois mil agentes, deu anteontem ao governo uma trégua de dez dias na greve por aumento de salário e reestruturação da carreira. Os fiscais decidiram suspender a paralisação “em reconhecimento” ao esforço do ministro.
O deputado José Thomás Nonô (PFL-AL) estava na reunião. Saiu de lá estarrecido com o que ouviu. No dia seguinte, ao chegar ao plenário da Câmara, procurou seus colegas do setor agrícola para dizer que, infelizmente, tudo indicava que Roberto Rodrigues sairia do governo. “Se o ministro Rodrigues sair, o governo Lula estará perdendo o seu único ministro competente, porque os outros são de uma incompetência só”, disse o deputado Darciso Perondi (PMDB-RS), que na quarta-feira procurou o ministro da Agricultura. “Vim dar-lhe um abraço e prestar minha solidaridade contra os ataques que vem sofrendo do governador do Paraná (Roberto Requião, do PMDB)”, disse Perondi a Rodrigues.
Requião tem dito que o salário de Rodrigues é pago pela multinacional Monsanto. Mesmo depois da acusação, ninguém do governo defendeu o ministro da Agricultura.
Lentidão do governo irrita Rodrigues
Brasília
– Elogiado freqüentemente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e considerado um dos ministros mais atuantes nas negociações de comércio exterior, Roberto Rodrigues, da Agricultura, já vem enfrentando há tempos dificuldades no front interno para conduzir sua pasta. Mas, pressionado pelas queixas e reclamações dos empresários do setor o ministro negou, na semana passada, que tivesse pedido demissão do cargo.Antes de disparar uma saraivada de críticas contra o ministro Guido Mantega, do Planejamento, Rodrigues já havia tornado públicas suas queixas contra a lentidão do governo na tomada de decisões na área agrícola. Em janeiro, o ministro da Agricultura se reuniu com Mantega para discutir liberação de verbas para contratação de 500 agentes de defesa sanitária. O objetivo de Rodrigues era reforçar o sistema de defesa nacional, aproveitando o bom momento para o País na tentativa de exportar carnes para novos compradores.
As reclamações dos empresários têm origem na paralisação do embarque de soja transgênica pelo Porto de Paranaguá, cuja proibição foi determinada pelo governo do Paraná no ano passado. Com a medida, os exportadores gastam mais com frete para escoar a safra para outros portos e, por isso, pedem a intervenção federal em Paranaguá. Outro ponto que preocupa representantes do agronegócio e também o Ministério da Agricultura é a greve dos fiscais agropecuários federais, iniciada em 15 de março e temporariamente suspensa desde ontem, até o dia 29, para negociações.
Com a greve, deixaram de ser emitidos certificados de exportação e inspecionados os produtos agrícolas. Uma paralisação prolongada pode prejudicar as exportações do setor, principal item da pauta brasileira, e provocar uma sobreoferta de produtos no mercado interno. Rodrigues considera justa a reivindicação dos fiscais agropecuários e negocia, juntamente com o secretário do ministério, José Amauri Dimarzio, reajuste salarial para a categoria. E enfrenta as resistências do Ministério do Planejamento, comandado por Mantega.
O presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP), esquivou-se de comentar a pendenga entre os ministros Roberto Rodrigues e Guido Mantega. Argumentando nunca ter ouvido falar na reunião entre Roberto Rodrigues e parlamentares, na qual o ministro teria chamado Mantega de “vagabundo”, Cunha não quis comentar o episódio.
O deputado federal Jorge Bittar (PT-RJ) também alegou não ter informações sobre esse encontro, mas comentou: “Se isto ocorreu, pode ter sido um acesso verbal, um desabafo. Se for verdade, será esclarecido”, disse Bittar.
O também petista Luis Sérgio (PT-RJ) disse ter tido conhecimento da situação pela imprensa. “Se uma expressão dessa foi dita, foi inadequada. Mas o ministro é muito espontâneo e, se for verdade, acredito que ele vai consertar”, disse.
Planalto põe panos quentes na crise
Brasília
– Auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva disseram ontem que o governo considera contornado o problema que envolveu o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, e confia em que ele não pedirá demissão do cargo. Depois da conversa que Rodrigues teve com o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, na quarta-feira, outros ministros procuraram o colega da Agricultura para dizer que sua permanência na equipe do presidente Lula é importante ao governo.O presidente do PT, José Genoino, afirmou ontem desconhecer a crise que envolve o ministro da Agricultura, mas destacou que, se ela existir, deve ser solucionada. “O ministro Roberto Rodrigues não é do PT mas é essencial para o governo, que trata a agricultura como prioridade”, afirmou. “O apreço do PT pelo ministro é muito grande e ele tem sido muito competente”, disse.
Rodrigues ouviu do governo promessas de que serão determinadas providências para consertar as estradas que hoje servem para o escoamento da safra e que serão feitas reformas nos portos e aeroportos.
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