A Barragem I da Mina Córrego do Feijão da Vale, em Brumadinho, apresentava risco de rompimento 20 vezes maior do que o limite aceitável, diz laudo de peritos criminais federais da Polícia Federal em Minas Gerais. A entidade representativa divulgou relatório de engenharia legal de junho de 2019 neste sábado, data em que o tsunami de lama completou um ano, no qual acusa laudos de estabilidade contratados pela empresa de conterem “informações inverídicas”. Documentos mostram que a Vale sabia da possibilidade da morte de 214 pessoas em caso de rompimento sem aviso prévio. O crime ambiental deixou 259 mortos e 11 desaparecidos.
O laudo é subscrito pelos peritos da PF Alan de Oliveira Lopes, Bruno Salgado Lima, Gustavo Costa Guimarães, Leonardo Mesquita de Souza, Sídney de Oliveira Barbosa e Thalles Evangelista Fernandes de Souza, designados pelo chefe do setor Wenderson do Carmo Maia, que atuam na Superintendência da PF em Minas.
No laudo técnico de engenharia legal, de 12 de junho de 2019 e divulgado no sábado, os peritos acusavam o laudo de estabilidade emitido pela empresa Potamos em relatório de Cálculo de Risco Monetizado de possuir informações inverídicas.
“Foram feitas estimativas de probabilidade sem alusão a qualquer fonte técnica de referência, comprometendo a confiabilidade nas conclusões do estudo probabilístico”, diz a nota assinada pelo presidente da associação, Marcos Camargo.
A probabilidade de rompimento prevista pelo relatório era 20 vezes maior que o aceitável e exigia melhoria nas condições estruturais da barragem, afirmam os peritos federais. Caso isso não fosse possível, uma alternativa viável seria “alertar e retirar os funcionários das instalações industriais e administrativas e das pessoas residentes na zona suscetível de ser atingida pela onda de rejeitos”.
“Esperamos que, após mais uma tragédia, lições possam ser apreendidas para que possamos ter desenvolvimento necessário para o país crescer com proteção e respeito à vida das pessoas e à preservação do meio ambiente”, conclui a nota.
Segundo os peritos, a “Barragem I da mina do Córrego do Feijão, estrutura de contenção de rejeitos, componente do complexo industrial minerário Paraopeba em Brumadinho/MG, de responsabilidade da mineradora VALE S.A., operou durante quatro décadas (1976-2016) sujeita a uma série de fontes de incertezas, em especial aquelas relativas aos parâmetros geotécnicos, ao longo de sua vida útil, antes do seu rompimento em 25/01/2019”.
“Essas fontes de incertezas são originárias tanto das variações naturais das propriedades minerais do material escavado na mina, quanto das modificações ocorridas nos processos e equipamentos relativos à extração e beneficiamento do minério, bem como da evolução da forma como o rejeito de minério foi disposto, resultando em um depósito heterogêneo e estratificado após sucessivos alteamentos pelo método de montante”, afirmam.
Os peritos detalham que “no caso da impossibilidade de reduzir, com segurança, a probabilidade anual de falha, por meio da implementação tempestiva de melhorias nas condições estruturais da Barragem I, uma solução alternativa seria a de implementar medidas urgentes e capazes para reduzir a elevada estimativa de perda de vidas humanas”.
“Isso implicaria, necessariamente, no alerta e na retirada dos funcionários das instalações industriais e administrativas e das pessoas residentes na zona suscetível de ser atingida pela onda de inundação dos rejeitos (dam break), localizada a jusante da Barragem I, previamente delimitada no Plano de Ação Emergencial de Barragem de Mineração (PAEBM)”, afirmam.
O Ministério Público de Minas Gerais denunciou 16 ex-funcionários da Vale e da Tüv Süd por homicídio duplamente qualificado e crimes ambientais decorrentes do rompimento da Barragem I, dentre eles o ex-presidente da empresa, Fabio Schvartsman. As duas empresas também foram denunciadas pelos crimes ambientais.
“A Vale promoveu ditadura corporativa na medida em que impôs à sociedade e ao poder público suas decisões, com as informações que detinham mas que ocultavam”, declarou o promotor de Justiça William Garcia Pinto Coelho, do Ministério Público de Minas, em coletiva de imprensa para anunciar o oferecimento da denúncia na terça, 21.
Ele afirmou que a empresa possuía uma lista sigilosa e interna de dez barragens em “situação inaceitável de segurança”.
Com a palavra, a Vale
“A Vale considera fundamental que haja uma conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas do rompimento da barragem B1 antes que sejam apontadas responsabilidades. Em dezembro de 2019, a companhia divulgou publicamente o relatório final do Painel de Especialistas, com as suas conclusões a respeito das causas técnicas do rompimento da barragem B1, da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019. Constituído em 8 de fevereiro, duas semanas após o rompimento, o Painel de quatro especialistas foi presidido pelo Dr. Peter K. Robertson, referência mundial em estudos de liquefação, trabalhou durante cerca de 10 meses na apuração, de acordo com as suas experiências e opiniões profissionais, das causas técnicas do ocorrido. O rompimento, de acordo com a investigação, ocorreu de forma abrupta e sem sinais prévios aparentes, que pudessem ser detectados pelos instrumentos de monitoramento geotécnico usualmente empregados pela indústria da Mineração mundial.
Além disso, como anunciado em 27 de janeiro de 2019, o Conselho de Administração da companhia constituiu, separadamente, um Comitê Extraordinário Independente de Assessoramento (CIAEA), dedicado à investigação das causas e eventuais responsabilidades pelo rompimento da barragem, que também receberá os estudos técnicos em questão.
A Vale coopera ativamente com as investigações conduzidas pela Força-Tarefa, pelos comitês internos independentes e pelas comissões parlamentares, apresentando todos os documentos e informações solicitados. A companhia reforça, ainda, que continua focada na reparação dos danos e no apoio aos atingidos pelo rompimento.”