Ameaçado de perder o certificado de eliminação do sarampo por causa do retorno da doença no ano passado, o Brasil se vê agora às voltas com outro risco: o de enfrentar o crescimento de casos de difteria sem que haja tratamentos disponíveis.

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Nos estoques do Ministério da Saúde, há apenas 12 tratamentos para serem usados em casos em casos graves. Esse quantitativo pode atender um número um pouco maior de pessoas – desde que o quadro esteja em um estágio menos avançado. Mas a própria pasta admite que o número é baixo e, em janeiro, solicitou à Organização Pan-Americana de Saúde 200 tratamentos para tratar a difteria. Sem o tratamento, o paciente pode morrer.

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A queda da cobertura vacinal contra difteria vem sendo registrada nos últimos quatro anos. Dados preliminares de 2018 mostram que apenas um Estado, o Ceará, apresentou uma cobertura vacinal aceitável, acima de 90%.

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A situação, por si só, já seria preocupante. Mas o cenário se agrava de forma expressiva quando se leva em consideração que países próximos enfrentam surtos da infecção. Com aumento de casos da doença desde 2016, a Venezuela registrou ano passado 1.102 casos suspeitos notificados .Este ano, já foram registrados 46. Também em 2018, foram confirmados 264 no Haiti e 6 na Colômbia.

Ao mesmo tempo em que aumenta o número de pessoas doentes nas Américas, a cobertura na Região Norte, porta de entrada para boa parte dos migrantes, é considerada muito baixa. Em Roraima, a taxa de imunização está em 66%. No Acre, é de 60% e Amazonas, 77%. O Amapá tem 55% e Rondônia, Estado com melhor desempenho da região é Rondônia, com 85% e o Pará com a pior, 49%.

A difteria é uma infecção causada por bactéria, transmitida pela tosse, pelo espirro ou pelo contato com objetos ou roupas contaminadas. Os sintomas da infecção surgem entre dois e cinco dias depois da exposição. Geralmente isso ocorre de forma gradual, com uma simples dor de garganta. “Com a progressão da doença, a bactéria passa a produzir uma toxina, que pode provocar bloqueio das vias aéreas, inflamação dos nervos e do miocárdio”, explica o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, Cláudio Maierovitch.

As vacinas disponíveis protegem justamente contra a ação da toxina. O soro usado no tratamento da toxina é preparado a partir de anticorpos coletados de cavalos. A redução dos estoques é fruto de problemas no potencial de proteção do soro, menor do que o padronizado, identificado há alguns anos.

“Quando as dificuldades foram identificadas, a solução foi centralizar o fornecimento do soro”, conta Maierovitch, que já ocupou o cargo de diretor do Departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde. Doze tratamentos pode parecer um número suficiente para estoques quando se analisa o histórico mais recente de casos da doença. Em 2015 foram 16. No ano seguinte, foram 4 e em 2017, 5. “Mas diante dos casos em outros países e da cobertura vacinal em queda, o risco aumenta”, afirma o pesquisador.

Maierovitch acha difícil que o Brasil tenha um surto de difteria nas mesmas proporções que a Venezuela ou o Haiti. “Há aqui um bom sistema de vigilância, capaz de identificar os casos e fazer bloqueio, por meio do uso de antibióticos”, diz. Mesmo assim, o pesquisador da Fiocruz enfatiza a necessidade de se tomar medidas de prevenção. Reforçar estratégias para aumentar a cobertura vacinal, buscando pessoas ainda não vacinadas, indo a campo, sobretudo em áreas consideradas mais suscetíveis.

O fato de Estados do Norte enfrentarem uma redução na assistência, reflexo das mudanças no Mais Médicos, pode ser um complicador, afirma Maierovitch. “O tratamento da difteria dá trabalho, a vigilância, o bloqueio. As áreas onde há falta de profissionais são mais vulneráveis, mas, pelo fato de estarem mais distantes, podem estar menos expostas à bactéria. Mas se der azar de chegar justamente por esses pontos, aí teremos um problemão.”

Semana passada, a Organização Pan-Americana de Saúde emitiu um comunicado alertando para a necessidade de viajantes que se dirigem a países onde há surto de difteria se vacinarem. A recomendação também é feita para profissionais de saúde. No alerta, a OPAS recomenda ainda suprimento de antitoxina diftérica e o fortalecimento dos sistemas de vigilância.

O Ministério da Saúde alerta para a necessidade de que pessoas atualizem a carteira vacinal. A imunização tem de ser renovada periodicamente.