A redução de peso poderia evitar ao menos 15 mil casos de câncer por ano no Brasil. Esta foi a constatação de um estudo realizado pelo Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) com colaboração da Universidade de Harvard. A pesquisa mostrou ainda que, até 2025, casos da doença ligados à obesidade e ao sobrepeso devem chegar perto do dobro, totalizando 29 mil ocorrências.
“Nós nos baseamos em diversas bases de dados. Primeiramente, na pesquisa de renda familiar do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2002 e, depois, de 2012. Para dados sobre cânceres, nós usamos dados da Agência Internacional da Pesquisa em Câncer (IARC) e também as estimativas que o Inca (Instituto Nacional de Câncer) produz, porque ele tem dados por Estado”, explica o pesquisador Leandro Rezende, um dos autores do estudo, que foi publicado na revista científica Cancer Epidemiology. “Nós elencamos 14 tipos de câncer estudados, todos cânceres que são associados ou têm como fator de risco o excesso de peso e obesidade. Com os dados da PNS (Pesquisa Nacional de Saúde) 2013, a gente verificou o número de pessoas com sobrepeso. Com isso, chegamos à evolução do câncer nesse período de dez anos. De quantos casos de câncer que ocorreram seriam evitáveis se não fosse o excesso de peso, fizemos a estimativa para 2025 e chegamos à conclusão de que esse número pode dobrar de acordo com a estimativa de crescimento da taxa de sobrepeso e obesidade do País.
Rezende afirma que a pesquisa não leva em consideração mudanças neste período, como quedas nos níveis de obesidade.
O estudo, resultado de uma bolsa de pesquisa no exterior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), apontou que 3,8% dos 400 mil casos de câncer diagnosticados por ano no País estão ligados ao peso elevado. O levantamento também constatou que as ocorrências são mais comuns em mulheres.
“Três dos 14 tipos de câncer analisados são quase exclusivamente femininos, por exemplo, o câncer de mama, que pode acometer homens também, mas é mais raro, e ovário e colo do útero. O excesso de peso e obesidade são maiores em mulheres no Brasil. Isso contribui”, diz Rezende.
Hábitos
Segundo a avaliação dos pesquisadores, o crescimento no poder econômico dos brasileiros registrado nos últimos anos aumentou hábitos de consumo, mas não fez com que as pessoas buscassem uma alimentação mais saudável.
“A aquisição de alimentos ultraprocessados tem crescido e, nesse cenário, é importante haver políticas que regulamentam a venda, publicidade, rotulagem, taxação de certos alimentos, como bebidas açucaradas, que incluem sucos e refrigerantes. Essas medidas têm sido adotadas em alguns países da Europa, no Chile também, e já têm mostrado resultados”, afirma.
Para José Eluf Neto, professor titular da Faculdade de Medicina da USP e orientador do estudo, os dados revelam a necessidade de mudança de hábitos, com a inclusão de políticas que incentivem a alimentação saudável e a prática de atividades físicas.
“Com o envelhecimento da população já teremos mais casos de câncer, mas a obesidade contribui para aumentar esse número. As pessoas abandonaram o hábito de comer arroz, feijão e verduras. Tem de se estimular a compra direto do produtor rural. Outra questão é o exercício. Deveria ter uma política pública para que as pessoas pudessem fazer exercícios perto de casa em parques, ciclovias, porque a população não tem dinheiro para pagar um personal trainer, até porque a obesidade está mais frequente nas classes mais populares.”
Os pesquisadores ainda estão verificando a influência de fatores como sedentarismo, tabagismo e consumo de álcool para a incidência de câncer. O objetivo é apontar quantos casos da doença poderiam ser evitados no Brasil.