Brasília – O programa de governo que há um ano conquistou o voto de 53 milhões de brasileiros acenava com a promessa de crescimento econômico de 7% ao ano. No mínimo, 4%. Hoje, a projeção não chega a 1% do Produto Interno Bruto (PIB). Este é apenas um exemplo do sonho do PT e o choque do partido com a realidade.
Coordenado pelo atual ministro da Fazenda, Antonio Palocci, o programa de Luiz Inácio Lula da Silva, de 88 páginas, propunha a redução da alíquota da CPMF a um valor simbólico, com caráter fiscalizador apenas. Nele, a reforma tributária vinha acompanhada de um pacto federativo em que o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional existia à maneira reivindicada por governadores.
No “Programa de governo 2002, Um Brasil para todos”, as Forças Armadas cumpririam “sua missão constitucional”, especialmente a defesa da fronteira e a proteção de regiões ameaçadas. A promessa não sobreviveu ao carnaval, quando, a pedido da governadora do Rio, Rosinha Matheus, o Exército foi recrutado para atuar na segurança no estado.
Hoje, com quase 11 meses de experiência, o comando petista confessa: houve o choque de realidade. “Não tínhamos noção do tamanho do buraco. Nem poderíamos ficar mostrando demais sua profundidade para que as pessoas não ficassem com medo de cair nele. Nosso esforço foi pela esperança e o otimismo”, conta o presidente do PT, José Genoino.
No texto, o crescimento econômico não é só a meta a ser perseguida, mas o instrumento para a criação de dez milhões de empregos e para a consolidação de um amplo mercado de massa. Com um crescimento econômico de 4%, calculavam os petistas, a arrecadação cresceria entre 5% e 7% ao ano.
“O Brasil já demonstrou, historicamente, uma vocação para crescer em torno de 7%. É essa vocação que nosso governo vai resgatar, trabalhando dia e noite para que o país transite da âncora fiscal para o motor do desenvolvimento. O Brasil precisa navegar no mar aberto do crescimento. Ou será que estamos proibidos de buscar o porto seguro da prosperidade econômica e social?”, diz o texto.
Em discurso e no caderno temático “Mais e melhores empregos”, Lula prometia um crescimento de 5% ao ano. Pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) enviada ao Congresso, em 2004 o país terá um crescimento de 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB), subindo para 4% do PIB em 2005 e 4,5% do PIB em 2006. Para 2003, no entanto, a área econômica não se surpreenderá se a variação ficar abaixo de 1%. “Foi feito um ajuste cavalar, sem precedentes na História do Brasil, que nem eu mesma acreditava que fosse acontecer. Mesmo assim, houve um desempenho espetacular da agricultura e do setor exportador”, diz a economista petista Maria da Conceição Tavares.
PT: o sonho e a realidade
CRESCIMENTO ECONÔMICO: No programa, variava de 5% a 7% ao ano. Este ano, chega, na melhor das hipóteses, a 1% do PIB.
CPMF: Pelo programa, seria reduzida a um valor simbólico. No texto de reforma tributária enviado ao Congresso, foi mantida até 2007 a alíquota de 0,38%.
EMPREGOS: A meta era criar dez milhões de empregos em quatro anos. Hoje, a taxa de desemprego em São Paulo é a maior desde 1985.
FOME ZERO: A meta fixada é de dez milhões de famílias. Este mês, o número de famílias é de 1,2 milhão, com a promessa de se chegar a 3,6 milhões até o fim do ano.
INVESTIMENTOS: No programa de governo, o caderno temático “Mais e melhores empregos” apontava a necessidade de investimentos anuais de R$ 39 bilhões em infra-estrutura. No Orçamento de 2004, a destinação prevista é de R$ 7 bilhões, ainda sob ameaça de corte para repor recursos da Saúde.
HABITAÇÃO: A promessa foi de destinação de R$ 4,5 bilhões do FGTS para habitação. Até agora foram liberados cerca de R$ 700 milhões.
REFORMA AGRÁRIA: No programa, é apontada como instrumento de geração de emprego. A meta de assentamentos para este ano foi fixada em 60 mil famílias. Hoje, soma 16 mil, podendo chegar a 27 mil.
EDUCAÇÃO: O PT acenava com o cumprimento das regras do Fundef, com a ampliação dos recursos repassados ao estado. O valor legal por aluno seria de R$ 786,16. O decretado é de R$ 446. Pela proposta orçamentária, serão R$ 537,71 no ano que vem.
FUNDEF: No programa, o PT prometia estender os recursos do Fundef ao ensino médio. Na semana passada, foi criado um grupo para analisar uma fórmula para isso.
RENDA MÍNIMA: Uma das promessas foi a adoção de bolsas de estudo para jovens entre 16 e 25 anos, além da capacitação de desempregados entre 22 e 50 anos com remuneração pelo seguro-desemprego. Havia ainda um programa de ocupação de desempregados. Ainda não foram implementados.
TETO: Pela proposta original, os programas de renda mínima atenderiam famílias com renda per capita inferior a meio salário-mínimo (R$ 120). Hoje, o teto varia de R$ 50 a R$ 100.
REFORMA TRIBUTÁRIA: O ICMS seria substituído pelo Imposto sobre Valor Agregado. Hoje, o ICMS, se aprovado, terá cinco alíquotas.